Montenegro ameaça bloquear revisão constitucional

Líder do PSD garante que se não forem retiradas as "amarras ideológicas" da Constituição e se não se mudar o que é "importante" o PSD vai inviabilizar o processo de revisão constitucional. Montenegro acusa Costa de estar a levar o país para um "pântano". E o PSD? "Vamos estar no sítio certo, no momento certo para mudar Portugal, para ganhar as eleições e governar Portugal".
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As palavras, mais duras, e muitas vezes já usadas por dirigentes socialistas noutras alturas, repetem-se a cada discurso. E desta vez naquele que é o "último reduto do PSD" depois da "grande adversidade nas últimas legislativas", Luís Montenegro, num discurso de meia hora, no encerramento das jornadas parlamentares social-democratas na Madeira, subiu o tom e a combatividade e ameaçou bloquear a revisão constitucional.

"Se o PS quiser manter tudo na mesma e mudar só aquelas duas coisas que considera mais importantes [referência ao uso dos metadados pelas secretas e o poder-se decretar, sem recurso ao estado de emergência, medidas de isolamento] não vai haver revisão constitucional. Isto fica muito claro. Ou é mudar aquilo que é importante mudar ou então não vai haver a adesão do PSD a nenhuma revisão constitucional", garantiu.

O líder social-democrata garante que para haver revisão constitucional, e um entendimento com os socialistas, é necessário "retirar as amarras ideológicas que o PS teimosamente quer continuar a ter na constituição".

Se a ameaça ao PS foi "muito clara", já o aviso ao PSD Madeira devido à "tensão que existe" por causa, nomeadamente, do cargo do representante da República, foi rodeado pela explicação da "dificuldade crónica tradicional". "Há sempre zonas de tensão", nem sempre "é fácil a convergência total de posições" entre "estruturas nacionais e regionais" e no caso da proposta de extinção do representante da república não existe "coincidência com a visão" dos social-democratas madeirenses. O que existe, disse Montenegro, "é mais um passo" que faz parte da "lei da vida", mas que não agrada ao líder parlamentar do PSD Madeira que, por exemplo, considera que a proposta "não foi feliz" nem é o que a "Madeira e Açores querem".

É um "desnorte" de "um PSD", afirma Rui Caetano, líder parlamentar dos socialistas madeirenses, que a "reboque de motivações puramente eleitoralistas" [as regionais são este ano no final de setembro] fez "um número de circo em torno da revisão da Lei fundamental".

Em 2001, depois da derrota nas autárquicas, Guterres saiu do governo argumentando com o "pântano político". Anos mais tarde, assumiu que se tivesse continuado "ter-se-ia dado uma situação de paralisia, uma situação pantanosa". Ora, é precisamente o "pântano" e a "situação pantanosa" que Luís Montenegro usa, cada vez mais, para definir o estado do país.

"O Portugal do engano, do logro (...) a perda de credibilidade e autoridade política (...) uma administração pública completamente tomada, colonizada mesmo. É verdade (...) Temos hoje uma situação política muito pantanosa em Portugal", afirma.

Para o líder social-democrata, "pior do que ter um governo mau é ter um governo mau que acha que é bom, que acha que está tudo bem". E se assim é, só há uma solução. "É rapidamente, mas muito rapidamente" o governo fazer o que "deve fazer" porque "se continuar, se persistir neste caminho vamos mesmo ter de dizer que não há condições para prosseguir".

E, perante a argumentação até já usada por Marcelo Rebelo de Sousa, de que não há alternativa política, Luís Montenegro ensaiou o discurso, apontado a António Costa, de que "o mundo não vai acabar quando acabar o governo do PS. O país não vai acabar quando mudar de governo. Não é preciso estarem tão agarrados, estão ali como lapas, ali agarradinhos. Já tiveram o vosso tempo. Já tiveram a vossa oportunidade. Já a desperdiçaram".

E depois elaborou nas "certezas" anunciadas de que "está a chegar a nossa vez e nós vamos estar no sítio certo, no momento certo para mudar Portugal, para ganhar as eleições e governar Portugal (...) Nós construímos futuro na preparação do nosso governo, na alternativa política que cada vez é mais robusta e mais reconhecida pelos portugueses".

Todos os jornalistas foram avisados: hoje [esta terça-feira] o líder do PSD não responderia a perguntas, só faria um discurso. E voltando a citar Guterres - "as pessoas não são números, os portugueses não são números - Luís Montenegro saiu, mais uma vez, perante uma plateia de deputados de "Lisboa" e da "Madeira" em defesa de Cavaco Silva argumentado que se o PS "reage de forma tão fanática, reage de forma tão corrosiva ao funcionamento da democracia, diminuindo os seus adversários com ataques pessoais, ataques muito baixos, isto só demonstra uma coisa: já não tem ideias, mas sobretudo está com receio, com medo, está nervoso".

E dirigindo-se diretamente a António Costa [várias vezes o fez no discurso] fez a pergunta, usando palavras do primeiro-ministro, que de imediato respondeu: "Crises artificiais? Mas onde é que o senhor anda? Que terreno é que o senhor pisa? Que pessoas é que o senhor ouve? Com quem fala? Fala com os mais de 1 milhão e 700 mil portugueses que não têm médicos de família? Fala com as pessoas que ficam à porta das urgências ou meses e anos à espera de uma consulta? O senhor fala com a família que viu um bebé de 18 meses morrer por falta de condições de operacionalidade dos meios do SNS? Fala com os pais e avós dos alunos que não têm professor? Fala com as vítimas da criminalidade grave e violenta que está a subir?". Uma sucessão de perguntas para uma resposta breve ao líder socialista de "ar cândido": "Tome um banho de realidade."

O anúncio de Joaquim Miranda Sarmento, líder parlamentar, de que o PSD vai votar a favor das propostas do Chega e da IL para a constituição de uma comissão de inquérito apanhou de surpresa deputados e até parte da direção do partido. A certeza anunciada obrigou Luís Montenegro a apenas dizer que admitia um inquérito parlamentar se não houvesse respostas aceitáveis de António Costa. A diferença nas palavras entre Sarmento e Montenegro foi notada. Um assumiu um voto favorável, o outro diz que faltam explicações. Uma "precipitação desnecessária", disse ao DN fonte do partido. E desnecessária porque "matérias destas não podem ser tratadas assim na praça pública".

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