Milhares foram às urnas num dia de apelo ao voto e à convergência (no meio das críticas)
Milhares de eleitores votaram ontem antecipadamente, no dia em que a campanha eleitoral entrou na segunda semana com um intensificar do apelo ao voto e desafios para uma convergência à esquerda - lançados no meio de muitas críticas entre os antigos parceiros da geringonça.
Cerca de 315 mil pessoas estavam inscritas para votar este domingo, não se sabendo ainda quantas votaram efetivamente, um número que só deverá ser divulgado nos próximos dias. Entre os líderes partidários, foram às urnas António Costa, João Oliveira (que tem liderado a campanha da CDU em substituição de Jerónimo de Sousa) e Rui Tavares. Todos - e também vários líderes que não votaram - aproveitaram para sublinhar que a deslocação às urnas, ontem ou no próximo domingo, é um ato seguro. Pelo caminho, sucederam-se os apelos a "indecisos", "esquecidos" e descontentes.
Ao oitavo dia de campanha, na viragem para a reta final, António Costa afirmou-se "animado e confiante", procurando desvalorizar as sondagens que têm dado o PSD a aproximar-se: "O nosso campeonato não é o das sondagens. Por experiência própria, sabemos bem que as eleições só se ganham no dia das eleições". Do Porto, onde votou, o líder socialista rumou a Vila do Conde e, depois, a Guimarães, onde respondeu a Catarina Martins, que horas antes tinha acusado o PS de "queimar pontes" à esquerda.
Para Costa a "única coisa que o BE tem a fazer é pedir desculpa por ter rompido com a unidade de esquerda em 2020". "Não recebo lições da Catarina Martins", devolveu. Mais tarde, o secretário-geral socialista diria que "este não é o momento para escolher quem multiplica conflitos e que vive da confrontação até com a própria sombra". Já ao final da tarde, em Braga, António Costa apontou diretamente a Rui Rio, dizendo que "a atual direção do PSD quer fingir que é diferente da anterior, mas convém salientar que não mudaram e pensam exatamente o mesmo daquilo que praticaram no passado", leia-se a austeridade nos tempos da troika.
Na campanha do PSD, depois de Luís Montenegro (adversário de Rio nas eleições internas de 2020), ontem foi a vez de Paulo Rangel (adversário de Rio nas eleições internas de 2021) se juntar ao líder social-democrata. Uma presença para "dar um sinal de que é preciso votar no PSD", numa altura em que António Costa está "esgotado e em fim de ciclo".
Já Rui Rio não deixou Costa sem resposta. "O PSD, se alguma vez teve de praticar política de austeridade, foi por responsabilidade do PS. Foi o P S que pôs este país na bancarrota. E, portanto, quando o PSD foi para o Governo, não foi com o seu programa, foi com o programa da troika que o PS assinou com a troika e obrigou Portugal a cumprir", afirmou o líder social-democrata, em Viana do Castelo. "O Dr. António Costa, na gíria popular, permitam-me que diga, tem muita lata ao dizer uma coisa dessas quando sabe perfeitamente que a responsabilidade é do PS e está a ir buscar um passado que ele não devia ir buscar", atirou Rio, sublinhando que também pode trazer José Sócrates para a campanha. Acusando António Costa de "deturpar" as propostas dos sociais-democratas, Rui Rio ainda diria: "O que ele tem vindo a fazer faz-me lembrar a seguir ao 25 de Abril quando diziam que os comunistas comiam criancinhas ao pequeno almoço. Acho que o Dr. António Costa está connosco a fazer a mesma coisa".
No pingue-pongue entre socialistas e bloquistas, Catarina Martins voltou a terreno num comício em Lisboa para deixar um desafio a António Costa: "O Bloco está disponível e convida-o para que nos reunamos no dia 31 de janeiro para trabalharmos numa agenda de medidas e metas para quatro anos". "Levarei para a mesa as prioridades na saúde, no trabalho e no clima", adiantou, antes de lançar um apelo ao voto dos "esquecidos do PS" - cuidadores informais, desempregados de longa duração, jovens com vidas precárias, função pública, professores, utentes e profissionais dos centros de saúde.
Catarina Martins voltou ainda a criticar a "obsessão da maioria absoluta" do PS e a "triste hipótese" colocada por António Costa de "um governo à Guterres, ou seja, procurando algum deputado de queijo limiano para compor uma maioria que lhe vai faltar". "A esse pântano parece que António Costa chama estabilidade", disse.
Já a CDU apontou baterias à direita, em particular aos liberais. Num comício no Largo da Graça, em Lisboa, João Oliveira afirmou que "em tempo de epidemia, enquanto o povo português sofria, os acionistas dos grupos económicos e das multinacionais concentraram sete mil milhões de euros, que em grande parte foram postos fora do país e em offshores". "Isto é uma autêntica pilhagem liberal. A política do salve-se quem puder, que junta PSD, CDS, IL e Chega e a que o PS dá a mão quando admite governar lei a lei com o PSD", defendeu o dirigente comunista, apontando como exemplo o setor da habitação. Já sobre a convergência à esquerda, João Oliveira sublinhou que "esse desafio que foi colocado já há algum tempo ao PS" continua em cima da mesa, mas continua também sem resposta.
O PAN, que andou ontem pelo interior do país, também falou de convergências para defender que "os partidos têm que ter uma atitude responsável". "O PAN tem feito esse caminho do diálogo e de fazer avançar as nossas causas e, depois do dia 30, cá estaremos e não faltaremos ao país", garantiu Inês Sousa Real.
À direita, Francisco Rodrigues dos Santos visitou a Feira do Fumeiro, em Montalegre, e aproveitou para voltar a atirar a um dos principais alvos dos centristas nesta campanha - o PAN. Um partido com um "discurso perigoso, uma agenda ditatorial que quer destruir o mundo rural". "Estou aqui em defesa desse modo de vida, dos agricultores, dos caçadores, dos produtores de animais, porque de facto eles são os verdadeiros ambientalistas, são os que preservam o ambiente defendem a coesão do nosso território", sublinhou, defendendo "uma estratégia para potenciar o valor económico do setor da caça em Portugal".
João Cotrim Figueiredo esteve no Mercado do Livramento, em Setúbal, para apelar ao "voto útil" na Iniciativa liberal. O líder do partido, que já garantiu que não integrará um governo com o Chega, recusou também qualquer solução de bloco central, destacando que o PSD não o excluiu "taxativamente": "Esse cenário não foi afastado e, portanto, aquilo que nós queremos dizer claramente a quem votar em nós é que esse voto não irá parar a um bloco central".
André Ventura, por seu lado, recebeu ontem um camuflado - que vestiu - num convívio com antigos combatentes na confeitaria Império, no Porto, em que apontou como prioridade do Chega "impedir que estes homens e mulheres que hoje querem reescrever a história o possam fazer".
Já Rui Tavares foi ontem até à Serra de Carnaxide para criticar os projetos imobiliários previstos para o local.
Com Lusa
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