"Mesmo que tivesse sido apenas um era grave, todos os portugueses devem exercer o direito de voto"

Pelo menos meia centena de portugueses em Madrid não conseguiu votar nestas legislativas pois estavam inscritos no voto por correspondência mas a carta nunca chegou. Tentaram o voto presencial, mas a lei não permite que o façam.

Pelo menos 50 portugueses residentes em Madrid foram impedidos de votar este fim de semana nas eleições legislativas por não terem recebido a carta para realizaram o seu voto por correspondência. Esta meia centena de pessoas - 40 no sábado e 10 hoje ate ao início da tarde - dirigiram-se entretanto ao consulado para tentar exercer o seu direito de voto pessoalmente, mas foram impedidos de o fazer, pois a lei não o permite, já que estavam inscritos nos cadernos eleitorais como votando por correspondência. Na região de Madrid, existem cerca de 13 mil eleitores inscritos, mas desses apenas 14 se inscreveram para o voto presencial nestas eleições.

"Apesar de ser uma percentagem baixa, mesmo que tivesse sido apenas um já era grave, porque todos os cidadãos portugueses devem exercer o direito de voto", afirmou ao DN João Mira-Gomes, embaixador de Portugal em Espanha. "Aliás, foi por isso que se mudou o sistema de votação e passou a haver o recenseamento automático e o voto por correspondência, para permitir às pessoas puderem votar de uma forma mais confortável, sem terem que se deslocar ao consulado e, em alguns casos, terem de fazer centenas de quilómetros", acrescentou.

De acordo com João Mira-Gomes, neste caso pode ter existido uma três situações. O voto pode ter-se extraviado nos correios; as pessoas podem ter mudado de morada, não comunicaram essa mudança de morada e, por isso, não receberam o voto em casa; terceiro, podem não ter ido levantar aos correios esse voto. "Depois, há uma outra questão adicional a essa, que foi uma informação que possivelmente foi mal dada quando contactaram o centro de atendimento consular a perguntar 'eu não recebi a carta, como é que posso votar?' e foi-lhes dito erradamente que poderiam votar presencialmente este fim de semana, o que a lei não permite", adiantou o diplomata. "Não é uma questão de má-vontade dos serviços consulares, a lei só permite dois tipos de votação: ou presencial, inscrevendo-se até 5 de dezembro, ou por correspondência. Não prevê uma alternativa para as pessoas que não recebem o boletim de voto em casa. E não prevê essa alternativa por razões óbvias, a segurança jurídica. Você não pode exercer duas vezes o direito de voto".

Queixa formal só após as eleições

Guilherme Vale Moreira foi um dos portugueses que não recebeu o seu boletim de voto em casa e viu-se assim impedido de votar nestas legislativas. Residente em Madrid há alguns anos, esta seria a terceira vez que iria votar na capital espanhola. Anteriormente, votou uma vez por via postal e outra presencialmente e nunca tinha tido problemas. "Esperei, esperei, esperei que a carta chegasse e a carta não chegou e, às tantas, vi que já se estava a aproximar muito da data das eleições e então comecei a preocupar-me um bocadinho com a situação e comecei a tentar perceber o que podia fazer para saber onde andava a minha carta", lembrou ao DN.

"Da primeira vez que fui ao consulado aqui em Madrid, a senhora que estava lá disse que não me podiam ajudar, que não podiam fazer nada. Depois voltei a ir ao consulado para falar com o cônsul, fizemos o seguimento da carta no portal do eleitor e lá dizia que, ainda que a minha morada estivesse certa e estivesse tudo bem, o local estava como não definido para a entrega do postal. E assim não recebi o postal e não pude votar", explicou.

"Depois fui ainda aos correios aqui em Espanha, a ver se me conseguiam ajudar, se a carta tinha ficado presa aqui, e eles disseram-me que não era com eles, que era com os CTT porque eram a entidade emissora. Isto já foi anteontem e eu então desisti porque já sabia que o meu voto não ia chegar", lamentou Guilherme Vale Moreira.

Este emigrante ainda contactou a Comissão Nacional de Eleições, mas disseram-lhe que só depois do ato eleitoral é que poderia apresentar uma queixa formal. "Não sei se o erro será dos correios espanhóis ou dos correios portugueses. Hoje lia um comentário engraçado que dizia que quando são cartas das Finanças nunca falham, essas chegam sempre, agora quando são este tipo de coisas é um bocadinho estranho não chegarem, não é? Esta também é uma coisa importantíssima, não é que seja um assunto secundário, 'pronto, este não vota, não faz mal'", lamentou Guilherme.

"Eu até percebo que uma carta se possa extraviar ou se possa perder, mas eu não receber uma carta e, por isso, ser inibido do meu direito ao voto, eu acho que isso é gravíssimo. Eu não me importava de ir ao consulado e esperar para votar, sei lá num caderno eleitoral especial de pessoas que não receberam as cartas, que não exista esse mecanismo é que eu acho que é gravíssimo", referiu ao DN.

Situações diferentes na mesma casa

Vânia Colaço é administradora da página do Facebook "Portugueses em Madrid" e confirmou ao DN que recebeu relatos de muitos votos que ficaram retidos nos correios sem sequer haver avisos de receção nas caixas do correio das pessoas. "As pessoas desconheciam onde andava a carta, há um link de seguimento que eu andei divulgar, mas não consigo chegar a toda a gente. Sei o caso de uma pessoa cuja carta nunca chegou, andaram a ver no link se a carta aparecia e nunca aparecia nada e ontem, de repente, apareceu a informação a dizer que a carta ia ser devolvida a Portugal. E a pessoa diz 'mas eu estava em casa neste dia e a esta hora, não me deixaram aviso de receção'. Há casos em que a carta nem ficou retida nos correios, não sei porque é que começaram a mandar as cartas para Portugal. Isto não tem nada a ver com o consulado, nem com o governo português, isto é um problema dos correios de Espanha", garantiu.

"Eu tenho recebido relatos de pessoas que começaram a votar há 15 dias, que conseguiram votar logo sem problemas. Mas também há casos em que uma pessoa recebeu, mas o marido ou a mulher não receberam. Chegou a acontecer isto, na mesma casa, na mesma morada, chegar uma, mas não chegar a outra", adiantou ainda Vânia Colaço.

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