Tiago Oliveira chega à liderança da CGTP aos 43 anos, para suceder a Isabel Camarinha.
Tiago Oliveira chega à liderança da CGTP aos 43 anos, para suceder a Isabel Camarinha.James Alpha / Global Imagens

"Isto é muito fácil, camaradas", diz Tiago Oliveira, o novo líder da CGTP

CONGRESSO O novo secretário-geral da Intersindical aponta ao PS. “Não existe meio termo. Existem opções políticas. Ou estamos do lado de quem trabalha ou do lado de quem explora”, disse no Congresso em que pela primeira vez não houve socialistas na Comissão Executiva.
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"Isto é muito fácil, camaradas!” Talvez não seja essa a frase mais óbvia quando se pensa no trabalho que Tiago Oliveira, o novo secretário-geral da CGTP, tem pela frente. Mas é com essa disposição que o sucessor de Isabel Camarinha chega à liderança da Intersindical, explicando que não será difícil aos sindicalistas saber de que lado estarão. “Não existe meio termo. Existem opções políticas. Ou estamos ao lado de quem trabalha, ou ao lado de quem explora”.

Pondo no mesmo saco PS e PSD, Tiago Oliveira fez um discurso sobre os “partidos que ao longo de mais de 40 anos tem decidido perpetuar e intensificar políticas de direita que respondem aos interesses duns poucos e que deitam por terra as justas aspirações da maioria, dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas, dos jovens”.

No Congresso em que, pela primeira vez, os socialistas decidiram não estar na Comissão Executiva da CGTP, o novo secretário-geral defendeu que o voto nas legislativas de 10 de março se deve fazer tendo em conta “esta leitura do passado e do presente”.

As reivindicações

“Nós somos trabalhadores, não somos capitalistas. Nós somos aqueles que têm mês a mais para o ordenado que temos. Nós somos aqueles que sentem na pele as desigualdades, a exploração, a retirada de direitos”, declarou Tiago Oliveira, que põe no topo das prioridades da central sindical a luta pelo aumento dos salários em 15%, o reforço da contratação coletiva, o reforço dos direitos dos trabalhadores por turnos, “mas também a resposta aos problemas criados com o teletrabalho, as plataformas digitais, a digitalização, a robotização e a inteligência artificial”.

Depois de Isabel Camarinha ter revelado que houve mais 110 mil sindicalizações na CGTP nos últimos quatro anos, o seu sucessor assume a “iniciativa para ir mais longe”, apontando o objetivo de desenvolver a sindicalização e organização em mais duas mil empresas, locais de trabalho e serviços em que hoje os sindicatos não estão presentes. “Pois é camaradas. Temos um caderno de encargos grande pela frente, mas já estamos habituados”.

Parte desse trabalho vai continuar a ser feito por pessoas como Isabel Barbosa, do Sindicato dos Enfermeiros, que aos 42 anos soma 20 de sindicalismo e que, em 2023, esteve na organização de “uma greve histórica”, a primeira nos hospitais privados.

“É um setor particularmente jovem”, explica ao DN a sindicalista, garantindo que entre esses enfermeiros a trabalhar no setor privado há cada vez mais que se aproximam do sindicato, apesar das dificuldades impostas pelas entidades patronais. “Era uma realidade que não conhecíamos tão profundamente porque impera o medo”, diz, contando que antes da greve, que teve “muito boa adesão”, houve “chantagem” e “ameaças de despedimento”. Apesar disso, Isabel Barbosa aponta o crescimento da sindicalização no setor privado e nos hospitais onde vigoravam PPP (e onde os profissionais ainda lutam por ver reconhecidos os anos de serviço) como objetivos para os próximos quatro anos.

Inês Branco, do Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços, 31 anos e sindicalizada há oito, encontra mais dificuldades agora do que quando começou a trabalhar. “Temos um aumento da exploração”, lamenta, garantindo que, ao contrário do que se possa pensar, é entre os mais jovens que cresce a consciência sindical.

O individualismo de que tanto se fala, assegura, “é uma ideia que nos querem fazer comprar”, mais do que uma realidade entre os mais mais novos. “É uma ideia promovida por esta sociedade capitalista, para nos virar uns contra os outros”, comenta.

Segundo os dados do Relatório de Atividades da CGTP, aprovado no XV Congresso, 14,9% dos novos filiados nos últimos quatro anos tinham menos de 30 anos.

“Nos locais de trabalho nestes setores os mais prontos para dar o passo para a luta são os jovens, alguns até em situações muito precárias”, nota, explicando as dificuldades que tem muitas vezes em conseguir que as entidades patronais dêem acesso aos locais de trbalho no comércio, sobretudo nos centros comerciais. “Vamos tendo cada vez mais dificuldades, mas somos firmes”, afiança.

Inês Branco recorda o trabalho feito pelos sindicatos da CGTP durante a pandemia, com muitos trabalhadores em teletrabalho, ou o que tem sido desenvolvido junto dos que trabalham em plataformas digitais como sinais da forma como a Intersindical se tem adaptado aos novos tempos. “Fomos criativos. Estes sindicatos arranjaram soluções, por exemplo em relação ao teletrabalho, e saíram reforçados” Por isso, Inês Branco olha para o futuro com confiança. “Não tenho dúvidas de que essa organização existe e está pronta”.

Diogo Correia, do Sindicato das Indústrias Elétricas, acha que “o sistema promove o individualismo, mas mais cedo ou mais tarde as pessoas percebem que essa não é a solução”. Com 32 anos e dirigente sindical desde 2016, Diogo dá exemplos concretos da diferença que poderia fazer acabar com a caducidade dos contratos coletivos de trabalho que foi criada no tempo da troika. “Na EDP há um contrato coletivo anterior a 2014 que caducou que dava mais direitos. Quem entrou depois tem uma tabela salarial e uma progressão na carreira muito diferentes”, explica, notando como isso cria “um corte geracional” na empresa. É para acabar com situações como essa, explica, que a CGTP se vai continuar a bater pelo fim da caducidade das convenções coletivas e pela reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador.

“Quem entra agora, precisa de trabalhar 60 anos para chegar ao topo da carreira, antes eram precisos apenas 20”. A consciência disso, acredita, contribuiu para que o ano de 2023 fosse “o ano com mais sindicalização na EDP, desde que temos registo”.

Diogo Correia assegura que o aumento da sindicalização “é o reflexo do que se sente nos locais de trabalho”, com dificuldades acrescidas, mas também com algumas vitórias. “Tivemos agora um exemplo disso, com uma empresa no setor dos elevadores, em que a luta conseguiu fazer com que as horas noturnas passassem a contar como tal entre as 20h e as 8h”, conta. “Vamos muito ao concreto dos problemas e das soluções. Com trabalho e persistência”.

Socialistas fora da Comissão Executiva

A corrente socialista não está, pela primeira vez, na Comissão Executiva da CGTP. A saída deste órgão - no qual os socialistas tinham cinco dos 29 membros - foi uma forma de expressar o descontentamento desta corrente com o facto de a corrente comunista não ter aceitado que aumentasse a representação dos não comunistas.

“A nossa estratégia tem sido a de alargar a base de apoio e a unidade na CGTP. Queremos aumentar a democracia interna e defendemos a presença de outras correntes na Comissão Executiva”, diz ao DN o porta-voz da corrente socialista, Fernando Gomes.

A Comissão Executiva é eleita pelo Conselho Nacional, um órgão composto por 147 elementos, dois terços dos quais são comunistas. A ideia dos socialistas era passar de cinco para seis os elementos ligados ao PS e passar a ter também representantes do BE, uma corrente que nunca esteve na Comissão Executiva, apesar de estar no Conselho Nacional.

“Os 550 mil trabalhadores que, no último Congresso, estavam na CGTP não são maioritariamente do PCP”, alega Fernando Gomes, que diz não ter dados próprios sobre esse representatividade, mas cita “estudos de opinião” que indicarão que há entre os afetos à Intersindical uma maioria de socialistas.
A decisão de não fazer eleger representantes para este órgão não representa, porém, segundo o histórico sindicalista do PS Carlos Trindade, uma cisão.

“Não é uma rutura”, diz ao DN. “Continuamos ativamente no Conselho Nacional e estaremos no Secretariado. Esta é uma reação de defesa de uma CGTP cada vez mais aberta e participada”, sustenta. De resto, Fernando Gomes diz que os socialistas estão disponíveis a regressar à Comissão Executiva a qualquer momento, desde que se altere o regulamento para reforçar as correntes minoritárias.

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