O Governo está a preparar um diploma sobre o agravamento do quadro sancionatório penal dos crimes praticados contra agentes das Forças de Segurança. Uma versão do texto do diploma foi apresentado na última reunião de secretários de Estado e deverá subir hoje a Conselho de Ministros. Além dos polícias, estão também incluídos os guardas prisionais, os bombeiros e demais agentes da proteção civil..O objetivo desta alteração é tornar estes crimes automaticamente tipificáveis como de “especial perversidade e censurabilidade”, o que, na legislação em vigor, exige um conjunto de circunstâncias agravantes. Na prática, os agentes destes crimes acabam por ficar sujeitos a penas mais leves, sem qualquer efeito de dissuasão, precisamente, porque em boa parte dos casos não se consegue demonstrar essa acrescida perversidade e censurabilidade..Em causa estão, principalmente, os crimes de ofensa à integridade física simples e qualificada e de resistência e coação da funcionário, quando estejam em serviço ou por causa dele. Pretende o Governo que se prescinda dos indicadores de culpa agravada de quem praticou esses crimes, substituindo-os pela sua especial censurabilidade e perversidade, já referidas..O DN sabe que o Executivo de Luís Montenegro considera que as molduras penais em vigor são insuficientes do ponto de vista preventivo e que é preciso contribuir para uma maior motivação das forças de segurança, através de um quadro sancionatório mais duro para quem atente contra estas. Se for aprovado em Conselho de Ministros nesta quinta-feira, a proposta de lei seguirá para a Assembleia da República..Formação reforçada.Ao mesmo tempo que reforça este quadro sancionatório para que os agentes de autoridade tenham maior proteção da Justiça, o Governo vai também criar condições para uma formação mais exigente que valorize os profissionais da GNR e da PSP. Está criado um Grupo de Trabalho, coordenado por Margarida Blasco, “com a missão de preparar e elaborar uma estratégia pedagógica a adotar pelos estabelecimentos de ensino das forças de segurança”. .O despacho da ministra da Administração Interna, publicado nesta quarta-feira em Diário da República, diz que “o exigente ambiente em que as forças de segurança atuam e no qual os nossos cidadãos reivindicam segurança, legitima um investimento por parte do Estado, em meios técnicos, capacidade operacional, ferramentas jurídicas, formação inicial e contínua e, sobretudo, uma forte aposta na dignificação das carreiras”. .O Grupo de Trabalho, que integra representantes da GNR, da PSP, respetivas escolas de formação e da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), deverá concluir os trabalhos até 16 de dezembro..A mencionada “estratégia pedagógica” servirá para “facilitar a aquisição de competências na formação inicial e a sua necessária atualização perante as necessidades operacionais específicas”, prevendo “a formação contínua e ao longo da carreira, bem como a definição de perfis dos elementos policiais a formar, que atenda, entre outras, às diferentes e variadas missões de que estão encarregues e aos locais onde exercem as suas competências, às características da população que servem, à diversidade do tecido social, ao tipo de criminalidade mais frequente que difere ou pode diferir em função dos locais de atuação policial”..Entende Margarida Blasco que a “estratégia formativa” deve enquadrar “uma forte cultura de Direitos Humanos” reforçando a “confiança do cidadão nas forças de segurança”. “Não são toleráveis a tortura, não se suportam, nem se aceitam tratamentos cruéis, desumanos, degradantes, nem se pode conviver com comportamentos discriminatórios no âmbito da atuação das forças de segurança”, é sublinhado..Este plano de Blasco começou a nascer ainda quando foi inspetora-geral da IGAI, no âmbito da primeira “Cartografia do Risco” feita por sua ordem, que fez, durante quatro anos, uma “radiografia” à atuação das polícias, à sua formação, organização e condições de trabalho..Na altura, em 2019, foram identificadas falhas na formação em Direitos Humanos, falta de preparação dos polícias para os diferentes contextos sociais em que atuavam, uma distribuição desadequada do dispositivo e défice de efetivo..A IGAI propôs uma verdadeira reforma no sistema - desde um reforço da formação dos agentes e guardas, passando por uma reorganização de postos e esquadras pelo país, e especialização dos polícias de acordo com as áreas de intervenção..Desde logo ficou prevista a formação de um Grupo de Trabalho, com as características do agora criado, bem como a escolha de dois ou três concelhos de Lisboa, Porto e Setúbal, para serem alvo de um projeto-piloto..O plano foi entregue ao então ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, que optou por ignorar este trabalho, afirmando desconhecer a “cartografia”, apesar de esta ter sido enviada aos comandos da GNR e da PSP, e divulgada pelo Diário de Notícias.