Ninguém acredita, quando faltam apenas 41 dias para a ida às urnas, que PS ou Aliança Democrática (AD) possam eleger mais do que 115 deputados a 10 de março, mas é possível que haja uma maioria absoluta na Assembleia da República. Mais do que negativa, ou silenciosa, uma maioria ausente, pois num momento em que está quase tudo esclarecido quanto aos candidatos a deputados dos partidos e coligações, terminando hoje o prazo legal para a entrega das listas, é possível que mais de metade daqueles que terminaram a legislatura deixada a meio não venham a tomar posse na próxima..Garantida está a saída de 81 excluídos das listas de candidatos dos seus partidos. Ou de outro partido, no caso sui generis de Maló de Abreu, histórico social-democrata que se desfiliou do PSD e passou a deputado não inscrito, pois André Ventura recuou no convite para cabeça de lista do Chega pelo círculo de Fora da Europa ao saber-se que esse deputado recebeu ajudas de custo por alegar residir em Angola..Entre os 81 atuais deputados que não poderão ser reeleitos a 10 de março sobressai o contingente do grupo parlamentar social-democrata, com mais de dois terços de excluídos pela liderança do PSD. Naquilo que foi descrito ao DN por vários dos 48 visados como uma “limpeza política”, saíram alguns dos mais próximos de Rui Rio, como José Silvano e Isabel Meireles. Dos 13 eleitos por Lisboa, só o líder parlamentar, Miranda Sarmento, e o presidente da Juventude Social-Democrata, Alexandre Poço, manterão lugar, com o terceiro e último “sobrevivente”, Pedro Roque, dos Trabalhadores Sociais-Democratas, a mudar-se para o Porto. E também aí a “razia” é forte: saem Afonso Oliveira, Catarina Rocha Ferreira e Paulo Rios de Oliveira, enquanto Sofia Matos, cabeça de lista em 2022, desce para 37.º lugar..Igualmente fora do contingente do PSD na AD ficam os antigos cabeças de lista sociais-democratas André Coelho Lima (Braga), António Topa Gomes (Aveiro), Hugo Martins de Carvalho (Viseu), Mónica Quintela (Coimbra), Paulo Mota Pinto (Coimbra) e Adão Silva (Bragança). Com a diferença de que, no último caso, o antigo vice-presidente da Assembleia da República comunicou intenção de sair a Luís Montenegro e ao secretário-geral do PSD, Hugo Soares..Mais intempestivas foram outras reações, como a de Rui Cristina, que não aceitou ser quinto da lista da AD por Faro, encabeçada pelo vice-presidente do PSD e da Câmara de Cascais Miguel Pinto Luz. Passou a não inscrito já depois da última sessão plenária e será cabeça de lista do Chega por Évora, um dos muitos distritos em que André Ventura espera eleger pela primeira vez. Sem “transferências”, mas não menos ofendidos, Tiago Moreira de Sá e Fernanda Velez recusaram, respetivamente, o 25.º lugar em Lisboa e o 10.º no Porto..PS também sabe cortar .Quanto ao PS, apesar de Pedro Nuno Santos ter insistido numa mensagem de continuidade em relação à liderança de António Costa - com uma profusão de ministros à frente de listas, incluindo Mariana Vieira da Silva em Lisboa, Ana Catarina Mendes em Setúbal, Ana Abrunhosa em Coimbra e Ana Mendes Godinho na Guarda - e de unidade do partido após a disputa com José Luís Carneiro (que volta a ser cabeça de lista por Braga), 30 dos 120 deputados socialistas não aparecem nas listas de candidatos..Em alguns casos pode falar-se de renovação geracional, com o decano da Assembleia da República, Alexandre Quintanilha, a não fazer a quarta legislatura, tal como saem o veterano do PS Braga Joaquim Barreto e o ex-ministro da Agricultura Capoulas Santos. No entanto, boa parte das “baixas” ocorrem entre os apoiantes da candidatura do ministro da Administração Interna à sucessão de António Costa..Embora Carneiro tenha feito uma pressão de última hora para “fazer subir” próximos como Isabel Oneto e Palmira Maciel, a bancada socialista deixará de ter Susana Amador, Pedro Cegonho, Romualda Fernandes, Maria Antónia Almeida Santos, Berta Nunes e Lacerda Sales, com o antigo secretário de Estado da Saúde prejudicado pelo “caso das gémeas”, duas crianças luso-brasileiras com uma doença neurodegenerativa rara que obtiveram um dos medicamentos mais caros do mundo por alegada interferência do governo e/ou do Palácio de Belém. E outra das mais notórias ausências foi a do ex-ministro João Galamba, arguido na Operação Influencer, que provocou a demissão do primeiro-ministro, António Costa, e a convocação de eleições antecipadas..Sem tantos “riscados das listas” quanto o PSD (30 socialistas contra 48 sociais-democratas), o PS suplanta-o claramente no que toca aos atuais deputados que ficariam de fora se os partidos obtivessem o mesmo número de mandatos nos diversos círculos. E, embora tal cálculo dependa de quem formará governo - conduzindo ao hemiciclo substitutos de futuros ministros e secretários de Estado -, mesmo as sondagens mais favoráveis para Pedro Nuno Santos indiciam uma redução do grupo parlamentar do PS que torna possível que, feitas as contas, haja mais atuais deputados a deixar a Assembleia da República do que os que permanecem..Voluntários ou não.Apesar da forma gradual como foi revelando as listas do Chega, nomeadamente as entradas de candidatos oriundos do PSD e da Iniciativa Liberal, André Ventura acabou por manter todos os atuais 12 deputados. Mas com uma nuance, pois Bruno Nunes deixa de ser cabeça de lista em Setúbal, sendo substituído por Rita Matias, e passa para Lisboa. Mas em sétimo lugar, apesar o líder do partido repetir que o crescimento esperado leva a que o lugar seja perfeitamente elegível embora o Chega só tenha obtido quatro mandatos no maior círculo eleitoral do país em 2022..Mais estrondosa foi a saída de Carla Castro da Iniciativa Liberal. Segunda por Lisboa há dois anos, a deputada obteve 44% dos votos na convenção que decidiu a sucessão de João Cotrim Figueiredo, em janeiro de 2023, e o afastamento progressivo em relação à liderança de Rui Rocha e ao resto do grupo parlamentar traduziu-se no convite para ser a sétima candidata do partido na capital, com hipótese de subir a quinta ou sexta. Decidiu afastar-se, do Parlamento e do partido, somando a sua baixa à quase certa ausência do ex-líder. Cotrim Figueiredo será cabeça de lista da IL nas europeias e fará o tirocínio enquanto candidato liberal no círculo da emigração da Europa..Na CDU, reduzida a seis deputados em 2022, além da saída voluntária do independente Manuel Loff, que completou o mandato de Diana Ferreira no Porto, as mudanças passam por Lisboa. Alma Rivera foi “transferida” para Évora, onde os comunistas contam recuperar o deputado perdido há dois anos, enquanto Duarte Alves desceu para quinto da lista da capital..Por seu lado, o Bloco de Esquerda anunciou a principal saída no grupo parlamentar de apenas cinco elementos e em que a ex-coordenadora, Catarina Martins, já havia renunciado ao mandato. De fora fica o atual líder parlamentar, Pedro Filipe Soares..O bloquista é o único responsável por uma bancada que não voltará de certeza à Assembleia da República na próxima legislatura. Mas está longe de ser o único ausente com peso institucional. Muito notadas, nomeadamente entre quem fica, estão a ser as saídas dos sociais-democratas Duarte Pacheco e Fernando Negrão, tal como a posição incerta da socialista Maria Luz Rosinha, cujo 20.º lugar na lista de Lisboa não será de eleição garantida se o PS não formar governo..Três líderes partidários entre muitas novidades.Dois deles não aquecerão o lugar se houver governo da Aliança Democrática, mas entre as muitas novidades na Assembleia da República estão três líderes partidários sem assento parlamentar: Luís Montenegro (PSD), Nuno Melo (CDS-PP) e Paulo Raimundo (PCP). E com os dois primeiros voltam antigos deputados, como os sociais-democratas Cristóvão Norte, Emídio Guerreiro, Hugo Soares e José Cesário, ou os centristas Álvaro Castello Branco e Isabel Galriça Neto. E os ex-ministros Teresa Morais e José Pedro Aguiar-Branco, que é um potencial presidente da Assembleia da República, enquanto os muitos independentes das listas da coligação são possíveis destaques da legislatura se não tiverem funções governativas..Caso o PS fique no poder, além de Augusto Santos Silva, novamente cabeça de lista por Fora da Europa, tem uma forte alternativa para a presidência da Assembleia da República, com Francisco Assis a cabeça de lista pelo Porto, numa das poucas novidades, tal como Pedro Vaz, muito próximo do secretário-geral, em Lisboa. Mas tudo muda se for oposição, o que levaria ao Parlamento Ana Catarina Mendes, Ana Mendes Godinho, Fernando Medina, José Luís Carneiro, Mariana Vieira da Silva e Marina Gonçalves. E Pedro Nuno Santos..No que toca ao Chega, que conta traduzir as intenções de voto na multiplicação dos 12 deputados, André Ventura conta eleger pela primeira vez em muitos círculos, como aqueles em que tem “reforços” de outros partidos. Os antigos sociais-democratas António Pinto Pereira (Coimbra), Eduardo Teixeira (Viana do Castelo) e Rui Cristina (Évora), tal como o ex-conselheiro nacional da Iniciativa Liberal Nuno Simões de Melo (Guarda), são as apostas, tal como membros do seu núcleo duro: Marta Silva e Ricardo Regalla (Lisboa), Patrícia Carvalho (Setúbal) e João Tilly (Viseu)..Já na Iniciativa Liberal nenhuma novidade no grupo parlamentar está tão garantida quanto Mariana Leitão. A candidata por Lisboa ganhou protagonismo na Assembleia Municipal de Oeiras, a debater com Isaltino Morais. Também poderão entrar Angélique da Teresa (Lisboa) e Mário Amorim Lopes (Aveiro)..A eurodeputada Marisa Matias é a cabeça de lista do Bloco de Esquerda pelo Porto, estreando-se na Assembleia da República, com Fabian Figueiredo e Jorge Costa prontos a retomar os lugares de deputado por Lisboa. E o PCP conta, além de Paulo Raimundo, com o regresso de António Filipe (Lisboa) e Alfredo Maia (Porto), com o PEV a ter esperanças na eleição de Heloísa Apolónia (Setúbal). Já o PAN e o Livre pretendem, pelo menos, passar a ter grupos parlamentares, o que sucederia pela primeira vez ao partido de Rui Tavares.