Política
06 fevereiro 2023 às 22h45

Marcelo alerta: Portugal pode estar a um "pequeno passo" da xenofobia

Presidente visitou nepaleses em Olhão e pede-lhes desculpa pelas agressões de que foram vítimas. "Como é que nós não compreendemos o que os outros sentem cá?"

João Pedro Henriques

O aviso do Presidente da República (PR) foi feito esta segunda-feira, em declarações aos jornalistas, em Olhão, à margem de uma visita a uma escola, a propósito das agressões naquela cidade de que foram alvo imigrantes nepaleses (imigrantes com quem, de resto, Marcelo se encontrou também, pedindo-lhes desculpa)

Embora rejeitando que Portugal seja, no seu entender, um país xenófobo, Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou: "O envelhecimento das sociedades europeias criou aquilo a que eu chamo o medo, uma atitude reativa, defensiva e, portanto, de rejeição da diferença, e daí até à xenofobia é um pequeno passo e tem de se estar atento a esse pequeno passo porque significa menos democracia e, até, menos respeito daquilo que é a nossa experiência como país de emigrantes."

Portanto, sendo Portugal um país que tem espalhados pelo mundo pelo menos dois milhões de emigrantes (vinte por cento da população residente no território nacional), "temos a obrigação de perceber melhor" os imigrantes estrangeiros que escolheram Portugal para viver. "Como é que nós não compreendemos o que outros sentem cá?", perguntou o PR.

Marcelo explicou também porque decidiu tão rapidamente visitar os nepaleses agredidos em Olhão (a notícia foi conhecida sexta-feira pois uma das agressões foi filmada e depois transmitida nas redes sociais): "É precisamente quando ocorre, e por isso é que fui tão rápido, que se deve tratar destas questões. Porque se for daqui a três meses, quatro meses, cinco meses, seis meses, a realidade banaliza-se. E ao banalizar-se, passa a considerar-se normal o que não pode ser considerado normal."

O Presidente lamentou igualmente o incêndio, sábado, num prédio da Mouraria, em Lisboa, que provocou dois mortos (um deles com 14 anos) e 14 feridos (sendo cinco crianças), todos imigrantes indianos. Segundo informação disponibilizada pelas autoridades, o prédio está habitado essencialmente por cidadãos indianos e o incêndio afetou 25 pessoas (24 residentes e um não residente), deixando 22 desalojados.

A associação Renovar a Mouraria alertou para a situação "de extrema fragilidade" em que vive um grupo de pessoas, imigrantes, que são "completamente invisíveis", mas que fazem funcionar a cidade num modelo de desenvolvimento baseado no turismo. "É preciso alertar quer [cidadãos] nacionais, quer os nossos governantes, para a situação de extrema fragilidade em que vive um grupo de pessoas que é completamente invisível, mas que, ao mesmo tempo, é um grupo de pessoas que faz funcionar a cidade dentro do modelo de desenvolvimento baseado no turismo", disse à Lusa Filipa Bolotinha.

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa assegurou alojamento a todos os desalojados e a Proteção Civil assegurou que o prédio não foi estruturalmente afetado. Carlos Lopes Loureiro, do Serviço Municipal de Proteção Civil de Lisboa, avisou os proprietários de que têm de "rapidamente" promover obras que restituam habitabilidade ao prédio.

O presidente da junta de freguesia de Santa Maria Maior, o socialista Miguel Coelho, salientou que a sua autarquia não tem competências de fiscalização em questões de alojamento. Assim, disse, o que se impõe é uma fiscalização "enorme" pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica e pela Polícia Municipal.

joao.p.henriques@dn.pt