O primeiro-ministro, António Costa, veio ontem reforçar a posição já assumida pelo ministro do Ambiente, João Matos Fernandes e de outros membros do governo, de que não haverá uma revisão da carga fiscal para fazer baixar os preços dos combustíveis. Em plena escalada de preços, o executivo recuperou um mecanismo de compensação da subida do IVA nos combustíveis, mas o primeiro-ministro não quer ir mais além, para não alterar a prioridade definida pelo governo "de não subsidiar fiscalmente os combustíveis".."Tendo havido um aumento do preço, isso reflete-se num aumento da receita do IVA. O que nós fazemos é a devolução aos portugueses desse aumento da receita do IVA através de uma redução do ISP [Imposto Sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos]. Nós só estamos a reduzir o ISP porque é a forma tecnicamente mais fácil de rapidamente devolver aos portugueses a receita extraordinária que estamos a ter", explicou ontem o chefe de governo, à margem da cerimónia de concessão de honras de Panteão Nacional ao antigo cônsul Aristides de Sousa Mendes..Ou seja, segundo Costa,"tudo aquilo que o Estado está a receber a mais em IVA pelo facto de haver um aumento dos preços, será devolvido em ISP aos portugueses, de forma a que o Estado não esteja a ter uma receita extraordinária pelo facto deste aumento extraordinário dos preços". Uma devolução que ocorrerá todas as semanas, até 31 de janeiro de 2022..A devolução, que nas contas do executivo ascende a 90 milhões de euros cobrados a mais no ISP, foi anunciada na última sexta-feira. Estimava-se um recuo dos preços em um e dois cêntimos no gasóleo e na gasolina, respetivamente, devido à redução do ISP. No entanto, os preços continuam elevados e, na prática, não se sentiu qualquer redução tendo em conta que, na segunda-feira, houve novo encarecimento, devido à cotação de 85 dólares do Brent (índice da matéria-prima de referência para Portugal)..Para Costa, o cenário energético (não só os combustíveis) "preocupa todo o mundo" e, por isso, exige "prudência". Aguardando ações do Conselho Europeu, o primeiro-ministro entende que a escalada de preços se deve à "escassez de combustível" e à "hiper dependência dos combustíveis fósseis importados", que "estão a condicionar grandemente os preços" e a "capacidade de recuperação económica" da Europa.. Quanto a Portugal, António Costa reiterou que o caminho passa por "controlar" as margens máximas da comercialização dos combustíveis, impondo limites sempre que o regular funcionamento do mercado esteja em causa, verificando-se aumentos nos preços que não se justifiquem. A medida já existe e tem a aprovação da Assembleia da República, mas ainda falta promulgá-la para entrar em vigor..Fonte oficial do Ministério do Ambiente explicou ao DN/Dinheiro Vivo que a medida assegura o "equilíbrio permanente entre a proteção dos consumidores e o livre funcionamento dos mercados de combustíveis", porque a "intervenção administrativa" é "justificada" com proposta de regulação da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), ouvindo-se a Autoridade da Concorrência. Além disso, é "proporcional", porque permitirá "recuperar os custos e dar uma margem alinhada com a prática histórica da indústria". A medida também não distorce o normal funcionamento do mercado, porque a intervenção administrativa "apenas vigorará durante um período limitado no tempo, suficiente para corrigir a falha de mercado identificada", defende o ministério de João Matos Fernandes..A medida pode ser aplicada em cenários idênticos ao atual. Quanto poderão os consumidores poupar com esta medida? Contactada, a ERSE não conseguiu responder a tempo do fecho desta edição..Quando foi apresentada, em julho, o ministro do Ambiente, Matos Fernandes, disse que permitiria baixar em um e nove cêntimos o preço do gasóleo e gasolina, respetivamente..Para o PCP, a a intervenção do governo "deve ser no sentido de travar esta escalada de preços". Por isso, ontem, os comunistas anunciaram que vão propor o fim do "adicional" ao ISP e da dupla tributação dos combustíveis. Sublinhando que foi a "liberalização do mercado de combustíveis que levou à cartelização e oligopólio" no setor, o deputado do PCP Duarte Alves garantiu, em conferência de imprensa, que o partido "intervirá até ao final do ano e no âmbito da discussão orçamental para a eliminação do chamado adicional ao ISP, criado em 2016 por portaria do governo, com o objetivo alegado de manter a receita fiscal num período de baixa das cotações do petróleo, critério que objetivamente já não se aplica"..A proposta vem da bancada comunista, embora o fim do adicional do ISP também tem sido defendido pelos partidos PSD, CDS-PP, IL e Chega..O PCP também vai "reapresentar uma proposta para a criação de um regime de preços máximos" dos combustíveis, que foi recentemente rejeitada pelo PS, PSD, CDS-PP, PAN, IL e Chega..Sobre a medida do governo de limitar as margens máximas de petrolíferas e gasolineiras, Duarte Alves referiu que "tem um alcance muito menos significativo do que a do PCP". Questionado sobre se a proposta do PCP para o fim do adicional do ISP é fundamental para o partido viabilizar o OE2022, Duarte Alves explicou: "o PCP não tem nenhuma medida que, isoladamente, seja critério para aprovação ou para rejeição. É necessário uma resposta global aos problemas do país. A questão dos combustíveis, pelo peso que está a assumir, também se insere nessa resposta global"..José Varela Rodrigues é jornalista do Dinheiro Vivo