Vitalino Canas mantém candidatura ao Tribunal Constitucional
"Pela minha parte não vejo nenhuma razão para retirar a candidatura."
Em declarações ao DN, depois de nesta manhã ter sido ouvido na comissão de Assuntos Constitucionais, Vitalino Canas afirma que, pela sua parte, continuará a ser um dos dois nomes que o PS apresentará como candidatos a juízes do Tribunal Constitucional para substituir os dois em falta (Clara Sottomayor e Claúdio Monteiro).
"Não encontrei grande resistência, exceto alguma do Bloco de Esquerda. A audição correu muito bem e registo grande capacidade de todos para expressarmos as nossas opiniões", prosseguiu Vitalino Canas.
Advogado de profissão, Vitalino Canas tem um longo percurso político como deputado do PS e membro de governos do PS. A votação para os dois juizes - votação que exige dois terços de votos a favor - está marcada para sexta-feira.
O Bloco de Esquerda contesta as escolhas do PS - porque desta vez não foi ouvido, ao contrário do que aconteceu na última eleição, onde Clara Sottomayor foi uma indicação bloquista.
Já o PSD exprimiu dúvidas face à escolha de Vitalino tendo em conta o seu perfil partidário. O outro escolhido pelos socialistas foi António Clemente Lima, juiz conselheiro no STJ (Supremo Tribunal de Justiça) - que também foi ouvido esta manhã na comissão de Assuntos Constitucionais.
Uma fonte oficial da direção do PSD citada pela Lusa na segunda-feira afirmava que "existe uma perceção de que a maioria dos deputados do PSD não estão confortáveis" com a escolha de Vitalino Canas pelo PS.
A mesma fonte recordava que a votação será, como sempre, por voto secreto. Ou seja, "cada um dos deputados vota de forma individual, independentemente de qualquer orientação da respetiva direção da bancada" e "por esta razão, vários nomes propostos para outros organismos têm sido "chumbados" ao longo dos tempos, contrariando, por vezes, a presumível vontade das direções dos partidos".
Vitalino Canas, advogado e professor universitário, foi secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros nos dois governos de António Guterres (de 1995 a 2002). Foi deputado do PS em várias legislaturas e porta-voz do PS durante parte da liderança de José Sócrates (de 1995 a 2002).
É amigo pessoal do ex-primeiro-ministro e ficou célebre uma foto de um jantar de Sócrates com amigos tirada depois de ter sido libertado de Évora onde foi um dos participantes.
Esta manhã, no Parlamento, Vitalino Canas disse que esteve nos últimos "40 anos" a preparar-se para "ser juiz do Tribunal Constitucional", e salientou que se for eleito não será porta-voz "de nenhum partido".
Vitalino Canas, que foi também porta-voz do PS, e o juiz António Clemente Lima foram os nomes indicados pelo PS para preencher as duas vagas em aberto com a saída de Cláudio Monteiro e Clara Sottomayor do Tribunal Constitucional (TC).
"Não queria deixar aqui afirmações demasiado tumultuantes, demasiado bombásticas, mas eu andei 40 anos a preparar-me para ser juiz do Tribunal Constitucional. Ser juiz do Tribunal Constitucional é um bocadinho diferente do que exercer funções politicas", afirmou em resposta aos deputados, depois de na primeira intervenção ter elencado o currículo que possui na área constitucional.
Apontando que no exercício de funções políticas um dirigente defende um posicionamento específico, e que tal "faz parte da postura" da pessoa em questão, Vitalino Canas assinalou que "ser juiz do Tribunal Constitucional é defender a Constituição na objetividade que ela tem".
"E nem me passaria nunca pela cabeça, enquanto juiz do Tribunal Constitucional, que os critérios que viessem a presidir a qualquer tipo de posicionamento que venha a tomar sejam critérios que não os critérios objetivos que resultam da Constituição", adiantou, ressalvando que, se assim não fosse, "não iria para lá, continuaria a exercer funções políticas" porque "seria mais fácil".
Na primeira intervenção perante a comissão, o antigo governante defendeu que "os juízes do Tribunal Constitucional não têm programa de ação, ou linhas de ação próprias" e adiantou que o seu programa "será sempre a própria Constituição".
"Fui porta-voz do Partido Socialista há 15 anos, mas já não sou porta-voz do Partido Socialista há muitos anos, senhor deputado, e não serei certamente porta-voz de ninguém, de nenhum partido político, se for eleito para o Tribunal Constitucional", sublinhou.
O ex-deputado disse possuir "um conjunto vasto de pensamento sobre questões constitucionais que é suficiente para exercer as funções de juiz sem ter de recorrer a nenhum outro contributo exterior".
Questionado se estará à vontade para apreciar algum recurso da operação Marquês, que envolve José Sócrates, Vitalino Canas disse estar "completamente tranquilo" em relação a isso, e "nem sequer existem razões" para se "declarar impedido", e apontou que o processo será "visto com toda a isenção".
Já em resposta ao BE, que contestou a escolha de Vitalino Canas por já ter exercido funções de provedor da Ética Empresarial e do Trabalhador Temporário, esclareceu que as suas funções foram de "prestar informação aos trabalhadores que a pediam", bem como "procurar mediar pequenos litígios entre algumas empresas de trabalho temporário e os trabalhadores", advogando que prestava um "serviço público".
Por seu turno, o juiz conselheiro no Supremo Tribunal de Justiça António Clemente Lima rejeitou qualquer ligação a clubes de futebol.
"Nunca recebi nada do Benfica, nunca fui convidado, nunca aceitei nada", esclareceu António Clemente Lima.
O juiz foi em 2005 nomeado chefe da IGAI (Inspeção Geral da Administração Interna) pelo então ministro com a tutela da pasta, António Costa. Ficou célebre uma frase crítica para algumas mentalidades dominantes na PSP: "Há por aí muita cowboyada de filmes americanos na mentalidade de alguns polícias. Temos tido a esse nível casos recorrentes. Mas a repetição de casos isolados preocupa-me."
Além das questões da imparcialidade, levantadas pela maioria dos partidos, os candidatos foram também questionados sobre os temas que poderão vir a ser analisados pelo Tribunal Constitucional, como a morte medicamente assistida.
Os deputados quiseram saber ainda qual a posição dos dois juristas sobre a declaração de pertença a organizações como a maçonaria, tendo os dois convergido que essas questões devem ser conhecidas e registadas.
PSD, PAN e a deputada não-inscrita Joacine Katar Moreira criticaram ainda o facto de não terem sido propostas mulheres para estas vagas.