Venezuela: PSD e CDS reconhecem Guaidó, PCP condena "golpe"
Comunistas são exceção ao pedido de sociais-democratas, socialistas, bloquistas e centristas de "eleições livres". E criticam "seguidismo" do Governo de Lisboa. À direita pede-se reconhecimento imediato do "presidente interino".
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu esta quinta-feira que "são os venezuelanos que devem decidir o seu futuro". Para os partidos à direita, para além da exigência de eleições livres no país, Juan Guaidó, o presidente da Assembleia venezuelana que se autoproclamou "presidente interino", deve ser reconhecido de imediato como o representante legítimo da Venezuela.
À esquerda, PS e BE falam na necessidade de eleições livres e o ministro Augusto Santos Silva já sentenciou que o tempo de Nicolás Maduro "acabou". A única voz dissonante é o PCP, que condenou "com veemência" aquilo que chama de "nova operação golpista orquestrada e comandada pelos EUA contra a Venezuela e o povo venezuelano", qualificando Guaidó de "presidente fantoche".
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Já esta quinta-feira, na conferência de imprensa do final da reunião do Conselho de Ministros, o ministro dos Negócios Estrangeiros reiterou que o Governo mantém a exigência de "eleições livres, justas, credíveis e transparentes", no "mais curto espaço de tempo possível". Augusto Santos Silva recordou que o único órgão eleito num ato considerado livre foi a Assembleia Nacional, que "infelizmente tem sido esvaziado dos seus poderes".
O ministro Santos Silva recordou ainda que a manifestação de quarta-feira contra Maduro é "eloquente do protesto que se sente", deixando apelos à superação do impasse político com eleições.
O PSD vai levar ao plenário desta sexta-feira um voto de pesar pelos mortos dos confrontos na Venezuela no qual apela para que seja respeitado o "mandato democrático" da Assembleia Nacional venezuelana "e do seu presidente, Guaidó". A deputada Rubina Berardo explicou esta quinta-feira de manhã aos jornalistas no Parlamento que este reconhecimento do "mandato democrático" da Assembleia Nacional venezuelana "equivale ao reconhecimento do Presidente interino Guaidó". Este reconhecimento, segundo reforçou, está também relacionado com o facto de "não terem sido reconhecidas internacionalmente" as eleições que mantiveram Nicolás Maduro no poder.
Seguindo a posição já expressa também pelo Governo, o PSD quer "eleições livres e credíveis" na Venezuela, acompanhando a situação presente com "profunda preocupação". De acordo com Rubina Berardo - eleita pela Madeira, a região de origem da maior parte dos 400 mil portugueses e lusodescendentes emigrados na Venezuela - a comunidade portuguesa ainda não terá sido atingida nos confrontos
Os socialistas defendem que "este é o momento para responder à manifestação da vontade clara dos venezuelanos e criar condições para eleições democráticas e livres repondo o funcionamento do estado de direito na Venezuela".
Na linha do que defendeu o Governo, o PS condenou - em comunicado - "qualquer uso da violência e da força contra aqueles que pedem um processo democrático transparente e justo e que seja reconhecido o papel da Assembleia Nacional da Venezuela", para além de apelar que "seja respeitado" o direito de manifestação livre. Para os socialistas, "a comunidade internacional e a União Europeia devem apoiar o início de um processo político pacífico e livre para permitir o respeito pela Constituição da Venezuela e o normal funcionamento das suas instituições democráticas".
O Bloco de Esquerda também acha que o problema na Venezuela só se resolve com "eleições livres e democráticas". A posição foi expressa esta quinta-feira de manhã no Parlamento pelo líder da bancada do BE. Para Pedro Filipe Soares, o Governo português teve uma "posição sensata" ao defender eleições e ao não escolher um campo no debate sobre quem é o Presidente legítimo da Venezuela, Nicolas Maduro ou Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional.
A posição governamental portuguesa foi "sensata" porque, por um lado, leva em conta que residem na Venezuela "quase 500 mil" emigrantes portugueses e lusodescendentes. Mas também porque "na verdade nenhum deles [Guaidó ou Maduro] tem legitimidade democrática". O que importa então é "não fechar nenhuma ponte" e "colocar acima de tudo os interesses da comunidade portuguesa".
Segundo o BE, a situação na Venezuela está a ser marcada por muita "ingerência internacional", nomeadamente dos EUA, através dos seus embargos, sendo o pano de fundo disto tudo a riqueza petrolífera do país. Um período de transição para futuras eleições teria assim, no entender dos bloquistas, de ser monitorizado por "agências internacionais neutras" e não pelos norte-americanos. De acordo com Pedro Filipe Soares, poderá estar a chegar a hora de o Governo português ativar, em coordenação com a UE, um plano "mais musculado" de evacuação da comunidade portuguesa.
O CDS também alinha na exigência de eleições livres, mas não quer esperar mais a reconhecer o presidente da Assembleia venezuelana, que se autoproclamou "presidente interino". Numa publicação nas redes sociais, a presidente centrista, Assunção Cristas, pediu ao Governo na quarta-feira à noite "que reconheça Juan Guaido como presidente interino da Venezuela, num processo de transição democrática que deve passar por eleições livres, devolvendo a voz aos venezuelanos".
A líder centrista recorda que perante o que se passa no país "e tendo em atenção a situação dos portugueses na Venezuela e de acordo com o que o CDS apresentou no Parlamento relativamente ao plano de contingência e na salvaguarda dos direitos dos nossos compatriotas", Cristas pede "ao Governo que desencadeie os mecanismos necessários com vista ao reconhecimento deste Governo, que estamos em crer respeita o Estado de Direito democrático, abrindo caminho para eleições livres".
A única voz que contraria o pedido de eleições livres é o PCP, que ataca a posição do Governo português. Para os comunistas, é "da maior gravidade a posição do Governo português que, ao arrepio dos interesses próprios do nosso País e da comunidade portuguesa, optou por uma atitude de seguidismo da União Europeia e dos círculos mais reacionários alinhados com a inaceitável operação de desestabilização e subversão contra a Venezuela".
Em comunicado, o partido de Jerónimo de Sousa condenou "com veemência a nova operação golpista orquestrada e comandada pelos EUA contra a Venezuela e o povo venezuelano". Segundo o texto, "através da insólita «autoproclamação» de um presidente fantoche, dito «presidente interino» - promovido por Trump e logo apoiado por Bolsonaro e outros - afrontando a ordem constitucional deste país, procura colocar em causa o legítimo Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Nicolás Maduro, eleito pelo voto popular".
Para o PCP, o que se passou na quarta-feira foi uma "operação golpista que se insere na sistemática ação de desestabilização, tentativas de golpes de Estado, boicotes, terrorismo, especulação e açambarcamento, sanções, bloqueio económico, financeiro, político e diplomático, e mesmo a ameaça de intervenção militar por parte dos EUA - que estão na base dos problemas da economia da Venezuela e das dificuldades que o seu povo enfrenta".
Segundo os comunistas, "a defesa dos interesses nacionais e da comunidade portuguesa que vive na Venezuela exige da parte do Governo português a assunção de uma postura soberana que, no estrito respeito da Constituição da República Portuguesa e do Direito Internacional, se paute pelo respeito da soberania e independência da República Bolivariana da Venezuela e pela rejeição e não alinhamento com a escalada de ingerência e agressão contra este País dirigida pelos EUA e apoiada pela UE".
[notícia atualizada às 13.20 com as declarações do ministro Santos Silva]