OE2020. Governo de olhos postos na esquerda deixa aviso ao BE

Parlamento aprovou esta sexta-feira, na generalidade, o Orçamento do Estado para 2020, com o voto favorável do PS, a abstenção de toda a esquerda, do PAN e de três deputados do PSD. Socialistas afirmam disponibilidade para negociar na especialidade, mas deixam desde já um recado aos bloquistas.

Está aprovado na generalidade o Orçamento do Estado para 2020, viabilizado pela abstenção do Bloco de Esquerda, PCP, PAN, PEV, Livre e por três deputados do PSD Madeira (que arriscam agora um processo disciplinar), que permitiu aos socialistas impor o voto favorável dos seus 108 deputados. À direita todos os partidos votaram contra - PSD, CDS, Iniciativa Liberal e Chega.

Dos dois dias de debate na generalidade fica expressa a disponibilidade do governo para acolher propostas de alteração à esquerda - esta foi, aliás, a última mensagem do debate, deixada pelo número dois do Executivo. "O Governo reafirma a sua disponibilidade para concretizar alterações e densificações à sua proposta", disse Pedro Siza Vieira, acrescentando que muitas dessas propostas já foram objeto de discussão nos encontros com os partidos da esquerda.

Mas se ficou afirmada a abertura para negociar, também ficou claro o muro que separa os socialistas dos partidos mais à esquerda do hemiciclo - o excedente orçamental, a "estrela do debate", como lhe chamou o ministro da Economia. Onde o Governo vê um passo no objetivo de chegar ao final da legislatura com a dívida pública nos 100% do PIB, e uma 'almofada' em face de contexto externo mais difícil, a esquerda vê uma submissão às imposições da União Europeia, que retira dinheiro aos portugueses. Coube ao deputado Bruno Dias uma das frases emblemáticas do debate, ainda na quinta-feira: "Quando faltam os autocarros e os comboios as pessoas não apanham o excedente orçamental para ir trabalhar."

Mas o PS não se vai desviar deste caminho, garantiu a líder da bancada socialista, Ana Catarina Mendes, no encerramento do debate, sublinhando que "ter as contas equilibradas permite ter mais segurança para enfrentar contextos económicos adversos". Embora as críticas ao excedente venham quer dos bloquistas, quer dos comunistas, o recado do PS veio com um destinatário em particular: "Não queiram os senhores deputados do BE gripar o motor do crescimento e da justiça social".

Foi um dos exemplos mais visíveis do tom confrontacional que marcou o debate entre PS e BE e que também foi visível, do lado dos bloquistas, ao longo dos dois dias. Na quinta-feira, Catarina Martins foi bastante insistente na qualificação como "um erro" da opção do Governo de não negociar previamente o Orçamento do Estado, uma visão que António Costa contrariou, dizendo que se não houve acordo isso foi da responsabilidade dos dois partidos. Hoje, coube a Mariana Mortágua e a Pedro Filipe Soares apontar baterias ao Governo com a primeira a questionar se Centeno tem alguma surpresa na manga quanto ao défice.

Já o PCP sublinhou, pela voz de Jerónimo de Sousa, que "este não é um orçamento de continuidade nem o melhor dos orçamentos" - duas condições alegadas pelo governo -, que a bancada comunista leva para a especialidade o seu caderno de encargos e que da resposta que tiver dependerá o voto final do partido. O mesmo disse o PEV, que fala num "abrandamento" do caminho seguido na última legislatura.

Bastante crítico foi igualmente o tom do PAN, que hoje encerrou o debate a dizer que o OE2020 "demonstra uma profunda falta de coragem" pela forma como "insiste em colocar a cabeça debaixo da areia para não ter de resolver de forma estrutural os problemas do país".

Já Joacine Katar Moreira, do Livre, pediu um "orçamento para o século XXI", afirmando que o documento que foi apresentado na Assembleia da República é um "orçamento de continuidade dos salários e rendimentos baixos, de subvalorização da saúde mental, de uma politica ambiental insuficiente e deficiente, continuidade da precariedade laboral, continuidade da burocracia que há anos penaliza os imigrantes".

À direita, a mensagem do segundo dia do debate não variou muito face ao primeiro, com as críticas a apontarem um forte aumento da carga fiscal e um fraco crescimento económico. Em véspera de eleições internas no PSD, Rui Rio encerrou a discussão parlamentar acusando o Governo de "não ter rumo nem estratégia" e falou num "pequeno excedente" que é uma boa notícia, mas que não se deve a boas políticas do Executivo, mas antes ao "permanente aumento da carga fiscal e à política monetária do Banco Central Europeu".

Pelo CDS, o debate desta sexta-feira marcou a despedida de Assunção Cristas, líder demissionária do partido, da Assembleia da República. Na sua última intervenção, a deputada centrista corroborou as palavras do Governo de que este é um orçamento de continuidade, mas não por boas razões - pela "maior carga fiscal de sempre, a perda de poder de compra dos contribuintes, o crescimento aquém do nosso potencial, a continuidade de uma economia pouco competitiva e na oportunidade perdida de a transformar". A "continuidade de um Estado que não conhece qualquer reforma estrutural" e de "um orçamento pouco transparente na sua execução".

Para João Cotrim Figueiredo, da IL, este Orçamento resume-se numa frase - é o OE de "um país parado de mão estendida, à espera do Estado, sem energia e profundamente triste".

André Ventura, do Chega, usou muitos qualificativos para definir o OE, mas nenhum foi "vergonha". Mas é um "escândalo", defendeu, afirmando que é um documento "irrealista".

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