Negócio Segurança Social/CML. Relatório do Tribunal de Contas divide socialistas
"Tecnicamente incompetente" e "lamentável a todos os títulos". Sem meias palavras, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Fernando Medina, qualificou assim, em conferência de imprensa, esta quinta-feira, um relatório do Tribunal de Contas (TdC) criticando um negócio de venda de imóveis da Segurança Social à autarquia por 57,2 milhões de euros. Este valor foi, segundo o TdC, inferior em 3,5 milhões ao valor de mercado.
O negócio foi feito em 2018, era ministro da tutela José António Vieira da Silva. "As condições acordadas para o arrendamento, com opção de compra, de um conjunto de onze imóveis da Segurança Social pelo Município de Lisboa, no Memorando de Entendimento celebrado com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, não asseguraram, com elevado grau de verosimilhança, a receita expectável para a Segurança Social. Por um lado, o valor fixado para a venda dos imóveis (57,2 milhões de euros) ao Município é inferior em cerca de 3,5 milhões de euros ao valor de mercado das avaliações contratadas pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. (60,7 milhões de euros). Por outro lado, foi concedido um período de carência no pagamento de rendas de 24 meses", lê-se numa síntese do relatório divulgada no site do TdC.
Segundo o presidente da CML, é "absolutamente falso" que o negócio tenha sido feito abaixo dos preços de mercado. Foram realizadas "quatro avaliações" os imóveis - disponibilizados para programas de renda acessível - foram "adquiridos em condições de mercado".
Há, além do mais, contradições internas dentro do TdC: "O Tribunal de Contas avaliou uma operação, avaliou todo o seu conteúdo, os contratos, as avaliações e deu visto favorável à compra pela Câmara Municipal de Lisboa de onze imóveis da Segurança Social. E o mesmo Tribunal de Contas vem uns meses depois, num outro relatório, de outra secção do Tribunal de Contas, tecer fortíssimas críticas à operação."
Fernando Medina critica duramente as conclusões do TdC mas há nas hostes socialistas quem se coloque do lado do tribunal, criticando o negócio. Por sinal, um ex-ministro socialista da Segurança Social que antes de ser ministro (no tempo de Guterres) até foi adjunto e secretário de Estado de Vieira da Silva - de quem aliás é amigo pessoal.
Escrevendo na sua página no Facebook, Paulo Pedroso também dificilmente poderia ter sido mais claro: "A missão do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social não é subsidiar a política de habitação, mas valorizar os ativos à sua guarda para efeitos de reforço da sustentabilidade da segurança social."
Ou seja: "A gestão financeira das reservas da Segurança Social cumpre um fim específico e não os fins gerais do Estado, pelo que tem o dever absoluto de rentabilizar os seus ativos. A política - municipal e nacional - de habitação a custos controlados é muito importante. Só não pode ser feita com os ativos da Segurança Social contributiva que os empregadores e os trabalhadores entregaram à guarda do Estado para um fim diferente."
Assumindo, implicitamente que está a criticar uma decisão de alguém de quem, no fundo, foi discípulo ("correndo o risco de irritar muitas pessoas que estão habituadas a concordar comigo e de me afastar de pessoas amigas nesta minha posição"), Pedroso afirma discordar "profundamente de que o património da segurança social seja usado como instrumento para tornar mais barata a política pública de habitação".
Implicitamente, Pedroso até recorda que Medina também tinha obrigação de saber disto (porque foi secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, no ministério da Segurança Social, em 2005, sendo Vieira da Silva ministro da pasta): "Dos dois lados do negócio estavam políticos que tinham a obrigação absoluta de saber o mandato do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social."