Mal-estar nas secretas com estatuto inferior do novo diretor-geral

António Costa escolheu Carlos Lopes Pires, um conselheiro de embaixada, reduzindo a fasquia do estatuto dos diretores-gerais do SIED, sempre embaixadores ou quadros superiores dos serviços de informações.

O novo diretor-geral do Serviço de Informações Estratégicas e de Defesa (SIED) - estrutura que acompanha e avalia as ameaças externas à segurança nacional - é ouvido esta quarta-feira no Parlamento, dois dias depois de o seu nome ter sido anunciado para chefiar a "secreta", mas o descontentamento com a escolha já se faz ouvir.

Em causa está o facto de Carlos Lopes Pires ser conselheiro de embaixada, quando o cargo de diretor-geral é ocupado, em regra, por embaixadores. Um conselheiro está a meio da carreira diplomática (no 4º lugar em sete categorias). Nunca um diretor-geral teve um estatuto tão baixo na carreira. À exceção dos dois últimos diretores, Jorge Silva Carvalho e Casimiro Morgado, que eram quadros da 'casa', todos os anteriores dirigentes foram embaixadores, o topo da carreira diplomática: o primeiro, em 1997, Monteiro Portugal, seguindo de Vasco Bramão Ramos, Caimoto Duarte e João da Câmara.

Conselheiros a integrar a direção do SIED houve apenas dois, Paulo Viseu Pinheiro e Helena Paiva (atual embaixadora em Cabo Verde), mas como diretores-gerais-adjuntos de Caimoto Duarte e de Silva Carvalho, respetivamente.

Internamente, esta despromoção no estatuto no chefe máximo das secretas externas está a ser interpretado como uma potencial desvalorização destes serviços. "É um regresso ao passado e um desprestígio para o SIED", reconhece uma fonte que esteve ligada aos serviços de informações.

Militares desconfiados

Mas há outra questão que está a causar mal-estar, nomeadamente no meio militar. Isto porque, sendo o atual diretor-adjunto, Melo Gomes, um major-general, os militares entendem que se trata de um sinal de falta de confiança no setor castrense para assumir a liderança do SIED. Melo Gomes é diretor-adjunto há cinco anos. Além disso, já tinha passado pelo SIED após a criação do serviço.

Por outro lado, coloca-se também uma questão de precedência que pode complicar a relação entre Melo Gomes e Lopes Pires. Um conselheiro de embaixada é equivalente na carreira a um major ou coronel, obrigando Melo Gomes, major general, a ficar em posição subalterna a alguém de estatuto inferior.

O general Melo Gomes ocupava interinamente o cargo de diretor-geral depois depois da saída do diretor Casimiro Morgado que, em setembro, foi nomeado para diretor dos serviços de informação da União Europeia (UE).

Uma possível justificação - embora cause desconforto na secreta - para a escolha de Carlos Lopes Pires é o facto da secretária-geral dos Serviços de Informações, Graça Mira Gomes, ser embaixadora e, por essa razão, descartar uma pessoa com a mesma categoria à frente do SIED. Não havendo vontade de promover um militar, a escolha acabou por recair no conselheiro Carlos Lopes Pires.

Um servidor do 'Bloco Central'

Carlos Lopes Pires é ouvido esta quarta-feira no Parlamento, pelas comissões de Assuntos Constitucionais e da Defesa Nacional, conforme estabelece a Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa

O gabinete do primeiro-ministro, António Costa, anunciou na segunda-feira a escolha do embaixador de carreira para diretor do SIED e informou que foi adjunto do gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros Luís Amado, entre 2010 e 2011 (quando Sócrates era primeiro-ministro) e adjunto do gabinete do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, entre 2011 e 2013.

Ainda durante o Governo de Passos Coelho, Carlos Lopes Pires foi chefe de gabinete do secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus, entre fevereiro e julho de 2013, e chefe de gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, entre julho de 2013 e agosto de 2014.

Apesar de ter integrado mais gabinetes no governo PSD/CDS, o conselheiro é conhecido no meio diplomático como um "fiel" a António Costa - uma confiança determinante numa escolha para um cargo desta sensibilidade.

Entre 2014 e 2019, Carlos Lopes Pires esteve colocado na embaixada de Portugal em Paris.

O Serviço de Informações Estratégicas de Defesa é, segundo a lei-quadro do SIRP, "o organismo incumbido da produção de informações que contribuam para a salvaguarda da independência nacional, dos interesses nacionais e da segurança externa do Estado Português".

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