Enfermeiros dão trégua no Natal: "Não podemos deixar agravar situações urgentes"
Tendo em conta o fim de semana prolongado que se avizinha, com a consoada e o dia de Natal a serem este ano numa segunda e terça-feira, a Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE) e o Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor), estruturas sindicais que convocaram a denominada "greve cirúrgica", recomendaram aos grevistas que se apresentem ao serviço na sexta-feira, dia 21.
"Enviámos um documento endereçado aos presidentes dos conselhos de administração informando que tínhamos recomendados aos grevistas que se apresentassem todos no dia 21 de dezembro para possibilitar abrir todas as salas cirúrgicas que cada instituição tem em serviços mínimos e dessa forma poder recuperar a lista de doentes urgentes que eventualmente estejam à espera de tempo operatório", revela ao DN Lúcia Leite, presidente da ASPE.
O objetivo é minimizar o agravamento dos efeitos desta paralisação, que começou a 22 de novembro e que adiou mais de cinco mil cirurgias. "Chegámos à conclusão que até ao final do ano e sobretudo agora no período do Natal, com o fim de semana prolongado e com a tolerância de ponto que o governo decidiu, iam existir quatro dias sem blocos cirúrgicos a funcionarem sem serviços mínimos para além dos da urgência, isso iria por em causa os doentes internados que estão à espera de cirurgias urgentes diferidas e que têm de ser intervencionados", esclareceu Lúcia Leite. "Não queremos que isso aconteça por causa dos enfermeiros, e a solução que encontramos foi recomendar aos grevistas que se apresentassem todos nesse dia para permitir o agendamento dos doentes urgentes."
De acordo com a sindicalista, os enfermeiros estão já a trabalhar além dos serviços mínimos decretados pelo Tribunal Arbitral e o que as estruturas sindicais pediram foi que todas as salas cirúrgicas fossem abertas no dia 21. Ou seja, os enfermeiros que estão escalados para esse dia irão trabalhar, apesar de estarem em greve. "Todas as instituições têm salas paradas e o que nós estamos a tentar é que os grevistas aceitem ir trabalhar em serviços mínimos nesse dia, todos, permitindo a abertura de todas as salas para agendar todos os doentes urgentes para que ninguém fique com o seu problema por resolver e veja a sua situação agravar por causa de um fim de semana prolongado de quatro dias", reforça.
Lúcia Leite esclarece, no entanto, que "não há um cancelamento da greve ou uma suspensão".
A presidente do ASPE refere que a greve às cirurgias programadas mantém-se. "Os serviços mínimos salvaguardam os interesses dos doentes oncológicos e dos doentes com urgências diferidas. O que nós temos a noção é de que com o fim de semana de Natal, a tolerância de ponto e o feriado, são quatro dias em que as salas de cirurgias ficam reduzidas ao número de salas de fim de semana que são as de urgência. Há uma redução muito grande do número de salas nesses quatro dias. Isso significa que os doentes urgentes que estão internados nos hospitais e que precisam de ser intervencionados ficam sem espaço operatório". Com esta recomendação dos sindicatos aos grevistas, todas as salas das instituições afetadas pela greve poderão estar em funcionamento nesta sexta-feira.
A sindicalista dá como exemplo o Centro Hospitalar do Porto que tem 31 salas operatórias, que poderão funcionar todas na véspera do fim de semana prolongado de Natal, se todos os enfermeiros escalados se apresentarem ao serviço, mesmo estando em greve. Num dia de semana de greve estariam a funcionar 10, explica Lúcia Leite.
O pedido de desculpa desta segunda-feira da ministra da Saúde, Marta Temido, "não muda nada" na luta dos enfermeiros, dizem as duas estruturas sindicais, ASPE e Sindepor, que convocaram a greve nos blocos operatórios que está a decorrer em cinco centros hospitalares. Desculpas aceites, mas a ação de protesto mantém-se e no horizonte está um novo aviso de pré-greve para janeiro.
A governante ligou esta segunda-feira para a bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, a pedir que aceitasse as suas desculpas e as transmitisse a todos os enfermeiros por ter usado a expressão "criminoso" na entrevista DN/TSF deste domingo.
A bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, disse à TSF que se trata de um "ponto de viragem". Os sindicatos não acham o mesmo.
Lúcia Leite, presidente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE) também recebeu uma chamada de Marta Temido a pedir desculpas, que aceitou, mas garante: "Neste momento não muda absolutamente nada, a não ser que a ministra se retratou de um lapso perfeitamente desnecessário, mas temos que entender que, às vezes, é incontrolável que quando se fala para a comunicação social a palavra que nos vem à cabeça não é a mais correta. O que a ministra me garantiu é que não tinha nenhuma intenção de chamar criminosos aos enfermeiros", conta ao DN.
Pedido de desculpa aceite, mas a situação mantém-se. "A greve só termina com um compromisso assinado da ministra da Saúde e do ministro das Finanças Mário Centeno. Nós já estamos cansados de promessas. Prometem-nos as coisas e depois não as cumprem e portanto neste momento só com um compromisso formal e com a condição da publicação da carreira com três categorias até ao final do ano, que está quase", explica Lúcia Leite.
A sindicalista refere que para pararem com a greve têm de ver um conjunto de condições asseguradas, como "a carreira com três categorias", uma base da tabela salarial que integre a "categoria de especialista", "o descongelamento de carreiras correto de todos os enfermeiros" e o pagamento do subsídio remuneratório de especialista àqueles que têm efetivamente direito ao abrigo da lei".
Além de não mudar nada, os sindicatos preparam um pré-aviso de greve para janeiro como forma de "manter a luta dos enfermeiros".
Uma luta que até poderá agravar-se, diz Carlos Ramalho, presidente do Sindicato Democrático dos enfermeiros de Portugal (Sindepor). Para o sindicalista, o pedido de desculpas de Marta Temido "é só uma clarificação de uma situação", de um "momento infeliz" da governante. "Enquanto nós não estivermos de facto a negociar com a senhora ministra em relação àquilo que pretendemos não vejo que haja um ponto de viragem", refere. "As formas de luta vão manter-se e até agravar-se se não houver da parte do ministério abertura para negociar. Se é isso que nós pretendemos e se é isso que não está a acontecer neste momento vamos ter de agravar as formas de luta".
Está já prevista a publicação de um pré-aviso de greve para janeiro que "até pode passar por uma greve geral, por todas as instituições, não só nos blocos operatórios, mas em todos os serviços, com todos os enfermeiros do país". "Pelo Sindepor está muito próximo de acontecer um anúncio de greve geral para todo o país", afirma sobre a nova ação de protesto que começa no início do ano. Não revelou, no entanto, que duração teria esta nova paralisação.