Comandante exonerado dos Comandos quer ser ouvido pelo Parlamento
Primeiro foram PSD e CDS a requerer, sem sucesso, uma acareação entre duas altas patentes do Exército e o seu anterior chefe do Estado-Maior (CEME). Agora é o coronel Pipa Amorim, antigo comandante do Regimento de Comandos (RC), a pedir ao Parlamento para corrigir e desmentir afirmações feitas aos deputados pelo general Rovisco Duarte.
Em causa as declarações feitas em março pelo antigo CEME na comissão parlamentar de inquérito ao furto nos paióis de Tancos, onde se referiu a Pipa Amorim em termos que o coronel diz atentarem contra a sua "honra e reputação", lê-se na carta dirigida há uma semana aos presidentes das comissões de Defesa e de inquérito ao caso de Tancos.
Ao DN, Pipa Amorim - exonerado do comando do Regimento de Comandos pelo antigo CEME - diz ter elencado apenas os casos "matematicamente prováveis" das "distorções e perfeitas mentiras" com que Rovisco Duarte se referiu a si perante os deputados. De fora ficaram situações em que "não é possível haver contraditório direto" e onde se estaria perante a palavra de um contra a do outro.
Um deles diz respeito à sua exoneração, em julho de 2018 e da qual soube através do telefonema de um subordinado, sobre a qual o então ministro da Defesa Azeredo Lopes já tinha dado a sua versão meses antes na Comissão de Defesa: "Ou [o general] mentiu ao ministro, quando disse que fui exonerado porque era um desestabilizador, ou o ministro mentiu" aos deputados, afirma Pipa Amorim ao DN.
Nessa audição, quando questionado por um deputado da oposição sobre a polémica exoneração do comandante do RC decidida por Rovisco Duarte, Azeredo Lopes respondeu: "A substituição do coronel Pipa Amorim, tal como o Exército anunciou, declarou e clarificou, ocorreu nos termos normais [e] sem que daí decorresse desvalor para o substituído". Por isso, "em nada se deve interpretar" a decisão "como um menor valor ou um menor reconhecimento relativamente" àquele oficial superior.
Rovisco Duarte, ao falar na Comissão parlamentar de Inquérito a Tancos, traçou um quadro negativo da atuação de Pipa Amorim e de vários outros militares do ramo. "Fiquei incrédulo" ao ouvir a audição de cinco horas e meia ao general, semanas depois de realizada porque na altura estava no estrangeiro, conta o coronel. O ter estado fora do país explica só agora escrever ao Parlamento, adianta o militar na reserva.
Outros exemplos que Pipa Amorim dá para justificar que o antigo CEME "descontextualizou, faltou à verdade e omitiu" nas declarações prestadas ao Parlamento - e em que "de forma deliberada, premeditada e consciente prestou falas declarações perante [um] órgão de soberania" - estão relacionados com o caso da morte de dois recrutas dos Comandos em setembro de 2016.
Rovisco Duarte "induziu a perceção que a minha postura, perante os processos de averiguações e disciplinares instaurados" aos militares instrutores do 127.º curso de Comandos "foi deliberadamente pautada pela morosidade, opacidade e falta de rigor, visando o encobrimento de eventuais ilícitos e culpabilidades", escreve Pipa Amorim na carta dirigida ao Parlamento.
Contudo, assinala Pipa Amorim, a sua tomada de posse como comandante do RC ocorreu em julho de 2017 e quando os referidos processos "já se encontravam encerrados e exarados os respetivos despachos punitivos" - o que basta "para, de forma explícita e cabal, se comprovar a inveracidade de tal insinuação", conclui aquele oficial superior.
Outro exemplo constante da carte de Pipa Amorim sobre o que qualifica como "esta despropositada e inquietante adulteração de datas, a falta de lealdade, de seriedade e o 'problema de caráter' invocados" por Rovisco Duarte esteve a nomeação (que o general anulou) de instrutores do curso em que morreram os dois recrutas para o curso seguinte - que "em absoluto rigor" começou "cerca de dois meses antes de eu assumir as funções de comandante do RC".
"Face ao exposto, considerando que de forma dolosa, com a consciência da sua falsidade", o general Rovisco Duarte "prestou falsas declarações e emitiu juízos de valor vexatórios da minha pessoa", Pipa Amorim solicita ao Parlamento que promova a sua "audição/acareação no âmbito" das referidas comissões - "não só pelo exercício do direito de resposta [...] como direito inalienável ao exercício do contraditório constitucionalmente consagrado".