Diretor da PJM: "O que aconteceu em Tancos é inadmissível"
O diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM) considerou "inadmissível" o comportamento de militares desta polícia que, de acordo com testemunho, esta terça-feira, do diretor da PJ civil, "destruíram e esventraram" a investigação.
Ouvido esta quarta-feira na Comissão de Inquérito, Paulo Isabel, que substituiu no cargo o coronel Luís Vieira pela PJ detido no âmbito da investigação à "encenação" da recuperação do material, frisou que "o que se passou é muito estranho". "O que posso garantir é que hoje não aconteceria", assegurou.
Este oficial considera que a "pedra de toque" para a atitude deste "grupo restrito" de militares, que foram designados para a investigação, foi mesmo o facto de o Ministério Público (MP) ter dado à PJ a liderança do inquérito. "Houve melindre da parte dessas pessoas, que ficaram muito aborrecidas, pois entendiam que era uma ilegalidade no âmbito do código de justiça militar".
Paulo Isabel revelou que a equipa que tinha iniciado a investigação, com um bom relacionamento com a PJ, acabou por ser toda afastada pela direção da PJM, "sem motivo" aparente. Segundo o diretor da PJM - que não poupou elogios à PJ e ao seu diretor Luís Neves -, o chefe dessa equipa, João Bengalinha, apercebeu-se que o seu adjunto, Major Vasco Brazão, lhe estava a "sonegar informação" e pediu para sair. Brazão foi também detido e, como arguido do processo, confirmou a "encenação".
Confrontado com as críticas da ex-Procuradora-Geral da Republica (PGR) à qualidade das investigações da PJM, designadamente em relação a furtos em instalações militares, cujas estatísticas indicavam uma elevada taxa de arquivamentos, este oficial superior afirmou que não ter conhecimento desses dados. "Todos os órgãos de polícia criminal (OPC) têm insucessos, mas lembro que a atual PGR afirmou nesta mesma Comissão de Inquérito que o trabalho da PJM é tão bom como o de qualquer OPC", asseverou.
Paulo Isabel lamentou que, independentemente do inquérito ao furto iniciado pela PJM ter sido incorporado e no da PJ, "deixassem de ser investigados os crimes estritamente militares que ocorreram em Tancos". Ou seja, explicou depois ao deputado do CDS, António Carlos Monteiro, "todos os crimes que, de acordo com o Código de Justiça Militar, foram cometidos pelos militares que violaram as normas" de segurança dos paióis, como, por exemplo, não terem feito as rondas previstas.
Sobre a famosa "denuncia anónima" a alertar para um possível assalto, que chegou a um oficial da PJM, sem que este tenha informado a hierarquia ou o exército, Paulo Isabel entende que tal comportamento "não é normal dada a gravidade dos factos". Como exemplo de que essa não é a prática, contou um caso recente em que ele próprio entendeu que devia partilhar uma informação com a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, porque podia "por em risco a segurança". "Até já podia saber por outras forças de segurança, mas preferi assim, não vá o diabo tece-las outra vez".
O furto do material militar, entre granadas, explosivos e munições, dos paióis de Tancos, foi noticiado em 29 de junho de 2017 e parte do equipamento foi recuperado quatro meses depois. Em setembro de 2018 foram detidos, numa operação do Ministério Público e da PJ Judiciária, sete militares da Polícia Judiciária Militar e da GNR, suspeitos de terem forjado a recuperação do material em conivência com um dos presumíveis autores do crime, também capturado no mesmo dia.
No final do ano, em dezembro, uma nova operação da PJ levou à detenção de oito suspeitos relacionados diretamente com o assalto. O inquérito ao furto, iniciado pela PJM, foi incorporado no inquérito aberto com a denúncia anónima (7/4/2017), e a estes juntou-se também o inquérito à recuperação do material. Há duas dezenas de arguidos, entre suspeitos do furto, militares da PJM e da GNR, alegadamente envolvidos na "encenação".