Cavaco Silva garante que elogiou António Costa no seu livro
"Trato-o de forma simpática no meu livro. Reuni com António Costa várias vezes. Enquanto ele era presidente da Câmara Municipal de Lisboa, como líder da oposição, como candidato a primeiro-ministro e depois já primeiro-ministro. E o que registei? Fiquei com a ideia de um homem simpático, de sorriso fácil, que não gostava de dizer não a pedidos que lhe formulavam, e encarava de forma descontraída as dificuldades com que era confrontado. Eu faço-lhe elogios."
Cavaco Silva rejeitou esta sexta-feira à noite, em entrevista à SIC, que a forma como se refere a António Costa no seu livro "Quinta-feira e Outros dias - Da Coligação à 'Geringonça'", publicado esta semana, seja uma forma depreciativa. "Dizer que é um profissional da política? Ele está na política há muitos anos e eu elogio-o por ser hábil. Inglaterra tem deputados como profissionais da política... Dizer que o critico quando o elogiei", rebateu o antigo PR, que já esta manhã, em entrevista à TSF, tinha rejeitado as críticas de setores socialistas à forma como retrata o atual primeiro-ministro.
"Compare com os insultos que me fizeram mesmo quando eu desempenhava as funções de Presidente da República. Eu sou uma pessoa educada. Não faço insultos a esta ou aquela pessoa", rematou Cavaco.
Nesta entrevista à estação de televisão de Carnaxide, o antigo inquilino do Palácio de Belém voltou a considerar o momento do pedido de demissão "irrevogável" de Paulo Portas, em julho de 2013, como a crise mais difícil que teve de enfrentar e reiterou que, para ele, a atitude do antigo líder do CDS foi "um absurdo total".
Cavaco diz que só "a falta de autoridade interna" de António José Seguro no PS, naquela época, "inviabilizou um acordo alargado de salvação nacional", frisando ter ficado "surpreendido e desiludido" com a intervenção do antigo líder socialista a anunciar a rotura nas negociações, que envolviam também PSD e CDS, após seis reuniões que tinham corrido bem.
O antigo Presidente da República disse ainda que o governo de Passos Coelho pecou por uma "má política de comunicação", de que o ex-ministro das Finanças Vítor Gaspar era um exemplo. "O governo do dr. Passos Coelho era muito verdadeiro na comunicação ao país em relação à austeridade e deixava poucos sinais de esperança, de tal forma que ele [Vítor Gaspar] anunciou um enorme aumento de impostos, expressão que não caiu bem na coligação. A política de comunicação não foi a mais certa", justificou.
Questionado sobre o facto de não fazer referência neste livro às duas reuniões que manteve com Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, em 2014, e a um dos episódios mais marcantes para o País como foi a falência do BES, Cavaco Silva justificou: "Recebi com alguma frequência presidentes de bancos, a pedido deles. Não falo de Ricardo Salgado como de nenhum outro. Sobre esse caso eu era informado pelo primeiro-ministro e pelo governador do Banco de Portugal. O governador do Banco de Portugal é que é o supervisor do setor e o PR tem que confiar nele."
Questionado sobre se recomendaria, para o futuro, que os Presidentes da República não se comprometam publicamente com a confiança nas instituições bancárias, como Cavaco o fez em plena crise do BES, o antigo Chefe de Estado reiterou que os
PR "não podem deixar de responder tendo em conta os superiores interesses do País". "E aí devem repetir o que diz o supervisor. Todos nós temos de confiar no supervisor", sublinhou.
De resto, Cavaco Silva voltou a deixar alguns elogios ao ministro das Finanças Mário Centeno - "bom economista, sempre o considerei" -, mas também críticas à política económica do governo atual: "aumento de impostos indiretos que são injustos, corte investimento público..." Política económica perante a qual, surpreendentemente para Cavaco, "PCP E BE se curvaram".
Em relação ao contraste de estilos com o seu sucessor, Marcelo Rebelo de Sousa, conhecido como o "presidente dos afetos", Cavaco Silva não quis comentar: "Nunca comentei este presidente nem anteriores. Cada presidente faz a presidência que acha mais conveniente."
Quanto a ele e ao seu tempo em Belém, Cavaco revê-se numa frase de Emmanuel Macron, atual presidente francês: " O que interessa é servir o país, não ser mais ou menos popular, mais ou menos amado por todos." "Foi isso que me moveu", acrescentou. E foi também por isso que resolveu escrever este livro, "para prestar contas aos portugueses". Um livro no qual, garante, "o que está aí corresponde ao total rigor dos factos".