"Estamos em momentos epidemiológicos diferentes e a mortalidade só pode ser avaliada quando isto acabar"
287.012 casos, 27.128 mortos, 150.376 recuperados, mais 219 novas infeções nas últimas 24 horas. Os números acumulados são o saldo de uma tragédia, mas desde o início de maio que Espanha tem vindo a estabilizar o número de novos casos e a achatar a curva, exponencial entre março e abril.
Junho começou com boas notícias: zero mortos. Esta quarta-feira houve uma a lamentar, mas na última semana, apenas dez pessoas deram entrada nos cuidados intensivos. A situação de um dos países mais massacrados pela pandemia de covid-19 parece estar a evoluir positivamente.
Filipe Froes, pneumologista e e coordenador do gabinete de crise da Ordem dos Médicos para a covid-19, considera que ainda é cedo para respirar de alívio, mas vê nestes números um sinal importante que atribui em primeiro lugar ao facto de o país vizinho manter em vigor o estado de emergência e o confinamento, apesar de, a várias velocidades, Espanha já ter iniciado a reabertura de alguns setores.
"Enquanto nós iniciámos o desconfinamento há um mês, eles mantêm-no e essa será uma das razões para conseguirem ter neste momento o número de mortos que têm. Se nós tivéssemos mantido o confinamento provavelmente teríamos também menos mortos", diz o especialista, que chama a atenção para o facto de os dois países terem curvas de mortalidade completamente diferentes.
"A taxa de letalidade em Espanha ronda os 11 por cento enquanto em Portugal está nos 4,4. Além disso, Espanha é o terceiro país do mundo com mais mortos por milhão de habitantes (580). Portugal terá quase um quarto deste valor (142). Lá já morreu muito mais gente", diz.
Apesar de ambos os países terem dado início ao estado de emergência e ao confinamento praticamente na mesma altura, a evolução da pandemia estaria em fases muito distintas num país e noutro e se Portugal agiu cedo, Espanha terá agido tarde. "Estamos em momentos epidemiológicos diferentes e a mortalidade só pode ser avaliada quando isto acabar", esclarece Filipe Froes.
A taxa de imunização da população, principalmente em Madrid, a região mais afetada de Espanha, com cerca de 70 mil casos e mais de 8 mil mortos, será outro dos fatores, de acordo com o especialista que avança que os testes serológicos, nesta região, apontam para uma proteção a rondar os 10 por cento.
"Mas a explicação é multifatorial. Também pode ter que ver com metodologias de registo, por exemplo. Seja como for, a tendência é claramente decrescente e se me diz que nos últimos sete dias só 10 pessoas entraram nos cuidados intensivos, pode ser que assim se mantenha, uma vez que há um intervalo temporal de mais ou menos duas semanas entre os novos casos e a mortalidade", diz, apesar de tudo cético quanto à manutenção dos óbitos a zero.