Khat. A droga que se masca e era usada pelo Daesh teve a maior apreensão em Portugal
Já tinham acontecido apreensões em Portugal de khat, a droga cuja substância ativa é a catinona e é tradicionalmente consumida em África e na Península Arábica, Mas têm sido quantidades pequenas, como oito quilos. Agora a Polícia Judiciária do Porto fez a maior apreensão no nosso país desta droga que os radicais do Estado Islâmico usavam muito. Foram 255 quilos que estavam dissimulados numa encomenda como chã verde não fermentado. Dois homens foram detidos, um deles, estrangeiro, ficou em prisão preventiva.
Em Portugal não há registos de grande consumo desta droga que é cultivada em regiões montanhosas e tem a aparência de folhas verdes. O seu poder alucinogénico é considerável pois transmite uma sensação de euforia. Daí o recurso frequente dos militantes do Daesh a esta droga, a que se associava o consumo de captagon, outra droga mais potente, uma anfetamina que provoca euforia e insensibilidade à dor e que pode ser injetada. No Iémen, país a passar por uma grande crise humanitária, o consumo de khat é tradicional e assume hoje contornos preocupantes. Serve de escape à miséria quotidiana. Na Europa são os países do Norte onde mais se consome esta droga. Por um lado têm muitos migrantes oriundos das regiões de produção que mantêm o hábito de mascar as folhas de khat. Por outro, há grupos de consumidores que estão sempre dispostos às novidades e, com o poder de compra dos nórdicos, o consumo alargou-se. Os Estados Unidos são o outro grande mercado a ocidente.
Esta apreensão portuguesa começou em março passado quando os serviços da Autoridade Tributária detetaram na alfândega do Aeroporto Francisco Sá Carneiro uma encomenda originária da Tanzânia que levantou suspeitas. A PJ foi alertada e iniciou a investigação, tendo verificado que o chá verde era na verdade khat.
As diligências levaram os inspetores da Secção Regional de Investigação de Tráfico de Estupefacientes aos suspeitos do crime. Recentemente, foi detido um homem de 62 anos, um marinheiro reformado com nacionalidade de um país báltico, que era o operacional da célula internacional. Teria por função levantar a droga e seguir, provavelmente por via terrestre, para o Norte da Europa. Para não levantar suspeitas e criar a perceção de uma receção legal do produto, tinha conseguido que um testa-de-ferro fosse o destinatário da encomenda em Portugal. Este homem, da Grande Lisboa, ficou em liberdade sujeito mediante pagamento de uma caução e a obrigação de apresentações semanais às autoridades.
A escolha de Portugal como país de trânsito é habitual. Existem muitos voos diretos dos países de língua portuguesa, o que atrai as redes traficantes a usarem este circuito. A droga será certamente valiosa, mas a PJ não adianta valores. Tendo em conta o percurso, o número de intermediários envolvidos e o destino, países onde há grande poder de compra, é seguro que gera margens de lucro confortáveis.
O khat é definido como uma droga que pode produzir dependência psicológica pela Organização Mundial de Saúde desde 1980. É uma planta cultivada na África Oriental, em especial no chamado Corno de África (Djibouti, Etiópia, Eritreia e Somália), e na península arábica que pode ser mascada, fumada, ou bebida como chá. Nos países africanos o mais comum é ser mascada. A planta contém catinona, o seu princípio ativo, que é um estimulante alucinogénio que leva a excitação e euforia, quimicamente similar à efedrina e outras anfetaminas.
Há séculos que, em países africanos e árabes, o khat é mascado e é uma atitude socialmente aceite. Na Somália é mesmo uma parte considerável da economia com a existência de vários mercados de khat. Alguns deles já foram alvo de ataques à bomba por grupos como Al-Shabab. A própria Al-Qaeda chegou a proibir o consumo por considerar ser degradante, atitude que o Daesh não seguiu. Os homens eram os principais consumidores, existindo mesmo rituais para o efeito. Mais recentemente, a migração em massa de pessoas do Corno de África tem estado associada à propagação do consumo de khat nos países vizinhos, a Europa e o resto do mundo. Os padrões ocidentais levam a consumos mais excessivos.
Os efeitos são sobretudo a nível da saúde mental. Embora o consumo moderado não seja visto com um grande perigo, há efeitos adversos graves, como psicoses e comportamentos agressivos, mas falta mais estudo sobre as suas consequências para a saúde. Embora provoque uma dependência física menos acentuada que outras drogas, muitas vezes os consumidores chegam a consumo compulsivo, idênticos aos que acontecem com outras substâncias psicoativas.
Em Portugal, como refere a PJ, não há grande consumo. Apesar de todas as drogas serem relevantes, as maiores preocupações das autoridades centram-se nas que são modificas quimicamente como as anfetanimas. Muitas vezes são apreendidas substâncias que ainda é necessário identificar. Basta uma alteração molecular para a tornar diferente e nem ser proibida, isto é não estar abrangida pelas tabelas internacionais. Quando isso acontece não há crime. Portanto a luta é constante na atualização de substâncias proibidas. Para mais, tudo o que é novo gera adesão e hoje, explicou ao DN fonte ligada à investigação criminal, "as redes sociais são plataformas de oferta que provocam um maior interesse em novas substâncias".