ADSE. Estado deve pagar as quotas dos beneficiários isentos? Deputados dividem-se
Deve o Estado pagar as contribuições dos beneficiários da ADSE que agora não descontam por ganharem abaixo do salário mínimo nacional? As opiniões dividem-se conforme o partido político que responde à questão - o PSD está a favor, o CDS contra e o PS é cauteloso, argumentando que é preciso ter em conta o impacto da medida na saúde das contas públicas.
A proposta para que o Orçamento de Estado passe a contemplar as contribuições de beneficiário isentos, sobretudo reformados, por terem rendimentos inferiores ao salário mínimo faz parte do conjunto de propostas do estudo do Conselho Geral e de Supervisão de ADSE publicado pelo DN neste sábado.
"Parece-nos que a proposta teoricamente faz sentido, porque é uma responsabilidade social que já tinha vindo a ser assumida pelo Estado e que se assumiria como uma medida social para que esses cerca de 50 mil beneficiários não viessem a ficar desprovidos dos cuidados a que têm vindo a ter acesso", afirma o deputado social-democrata Ricardo Batista Leite.
Mas a proposta não colhe total concordância à direita. Ana Rita Bessa, deputada do CDS igualmente na Comissão de Saúde, considera que não faz sentido ser o Orçamento de Estado a pagar, na medida em que "a ADSE se assume e é definido como um sistema público de solidariedade, que pressupõe a existência de algum subsídio cruzado entre gerações e beneficiários". Deve ser o sistema a garantir o apoio aos seus beneficiários, defende.
Já António Sales, do PS, sublinha a importância de conhecer o impacto financeiro da aplicação desta proposta nas contas públicas. No entanto, considera-a bastante válida - embora faça questão de afirmar que foram apanhados de surpresa com este estudo do Conselho Geral e de Supervisão da ADSE.
Segundo o relatório, em 2017, beneficiavam desta situação cerca de 53 mil pessoas, sendo o número de familiares 7700, o que determinava um custo para a ADSE, nessa data, de 32 milhões. Assim, admitindo que os titulares descontariam para a ADSE 3,5% sobre o salário mínimo, tal representaria um crescimento de receita de 14,5 milhões para os cofres da ADSE.
O PCP ainda não tem uma posição definida sobre a matéria, embora esteja disponível para a analisar. O Bloco de Esquerda não respondeu.
O deputado socialista considera que as sugestões do Conselho Geral e de Supervisão deverão ser avaliadas no devido tempo em função de um conjunto de critérios - as condições sociais e de sustentabilidade da ADSE e não sob perspetivas eleitoralistas.
No entanto, pessoalmente, defende que este sistema de saúde é um fundo solidário que deve garantir a sua autossustentabilidade pela via dos beneficiários, mesmo que isso passe pelo alargamento, (como, aliás, é proposto pelo estudo que defende a abertura do sistema a 100 mil trabalhadores com contratos individuais na função pública, de forma a garantir a sobrevivência do sistema).
"É importante que se diga que a ADSE é dos beneficiários e assim deve continuar, não deve fugir das suas mãos. Ser financiada pelo orçamento, daria ao Estado, de alguma forma, a capacitação também para gerir o fundo solidário. E a ADSE deve manter a autonomia integral através dos seus beneficiários e a sua sustentabilidade deve manter-se pela via dos beneficiários", sustenta o deputado socialista na Comissão de Saúde.
O CDS é frontalmente contra o financiamento dos contribuinte isentos através do Orçamento de Estado: "Não nos parece aceitável - é um sistema público pago e sustentado pelos seus beneficiários com um princípio de solidariedade e assim deve continuar. A natureza do próprio sistema pressupõe a solidariedade que deve garantir esse pagamento, senão estamos a abrir a porta para que a ADSE se abra para um seguro público. Não podemos ter o melhor de dois mundos", defende a deputada democrata-cristã.
E garante que até percebe que os beneficiários comecem a ficar incomodados com esta ideia, mas alerta, é o próprio Conselho Geral e de Supervisão que faz questão de assumir que a ADSE é um sistema solidário. "Ou é uma coisa ou é outra."
O Estado financiar as contribuições dos beneficiários isentos - entende Ana Rita Bessa - descaracteriza e muda a natureza do sistema: "Quando são os próprios a pagar, o princípio da solidariedade torna-se um encargo mais pesado. Não é aceitável ser solidário com o dinheiro dos outros."
Ricardo Batista Leite (PSD) gostaria de ter todos os dados, nomeadamente os custos desta medida, para contribuir de uma forma mais substantiva para a discussão. "A grande questão aqui é saber se o Estado continua a manter a mesma filosofia que tem mantido ao longo dos anos, ou seja, de que as pessoas devem ser alvo do apoio social por parte do Governo."
A sustentabilidade da ADSE deve passar pelo alargamento a outros beneficiários e sobre isso não há discordâncias. E aqui a entrada dos trabalhadores com contratos individuais com o Estado é vista como uma solução óbvia. "Estando inseridos no contexto da Administração Pública é quase incompreensível que o pessoal dos hospitais EPE não estejam inseridos na ADSE", sustenta Ana Rita Bessa.
Ricardo Batista Leite vai mais longe e considera de total justiça e honestidade para com os portugueses que se debata a possibilidade da ADSE ser alargada ao setor privado. "E essa é a discussão que também temos que fazer. Na Assembleia somos confrontados constantemente com esta pergunta e como a ADSE vai tendo uma gestão mais autónoma não se compreende como é que esta reflexão ainda não se iniciou.
A deputada comunista, Carla Cruz, considera igualmente que a sustentabilidade da ADSE passa pelo alargamento aos contratos individuais, mas acrescenta que é necessário "reforçar o Serviço Nacional de Saúde, permitindo que mais beneficiários daquele subsistema o utilizem".