Voltar a ser um país para jovens

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Um dos problemas com que Portugal se debate é a frágil dinâmica demográfica da população - uma tendência não muito diferente da da União Europeia, e que é fruto de uma série de fatores estruturais, como o aumento da esperança média de vida, e também pela queda acentuada das taxas de natalidade.

Esta tendência tem tido repercussões na dimensão da população ativa, e tem vindo a suportar a abertura à entrada de imigrantes, que têm sido cada vez mais relevantes nos equilíbrios necessários no mercado de trabalho, assim como na viabilização do modelo do Estado Social que suporta a nossa sociedade - em Portugal, os nascimentos de crianças com mães residentes, mas de nacionalidade estrangeira representam atualmente cerca de 22% do total de novas vidas anuais.

No entanto, se as alterações dos padrões de taxas de natalidade dos portugueses, ou do aumento da esperança de vida são evidências que porventura são mais complexas de contrariar por medidas de política pública - por uma série de condicionantes relativas à vida moderna, como a qualidade dos cuidados de saúde, que permitem que se viva mais tempo, ou melhor planeamento familiar, que leva a que também as famílias possam gerir a sua vida com equilíbrio entre filhos e objetivos profissionais -, já a fuga de jovens portugueses para o estrangeiro é uma conversa diferente.

E a fuga de talento jovem é, neste momento, um problema que é incontornável para Portugal. Neste momento, cerca de 30% dos jovens nascidos em Portugal com idades compreendidas entre 15-39 anos vivem fora do país, de acordo com uma estimativa do Observatório para a Emigração - sendo a mais alta taxa de imigração da Europa e uma das mais elevadas do mundo.

Ainda de acordo com esta análise, cerca de um terço das mulheres em idade fértil está fora de Portugal, e isto é evidentemente uma situação que tem impacto nas dinâmicas demográficas do país, assim como na produção de talento qualificado para a economia nacional.

Na raiz deste êxodo massivo está obviamente uma distorcida realidade de oásis, em que o nosso país esteve mergulhado durante quase uma década em termos de políticas públicas. Portugal, na verdade, não chegou a ultrapassar a austeridade, apesar dessa ilusão ter sido criada em termos de narrativa política.

As reformas estruturantes não existiram, pelo menos numa dimensão que permitisse que as empresas criassem valor para pagar melhores salários. E os jovens, é hoje evidente para todos, foram dos mais prejudicados pela estagnação da última década, coadjuvada obviamente pela estrutural fragilidade da economia portuguesa face as restantes economias europeias.

E assim hoje, e de acordo com um estudo recente - publicado em abril - do grupo de investigação do SINLab , cerca de 65,6% dos jovens portugueses recebe menos de 1000 euros líquidos por mês, e que mais de metade destes (52%) recebem cerca de 725 euros mensais.

Noutra nota, o Observatório do Emprego Jovem do ISCTE estima que, aos 25 anos, os jovens portugueses ganham 70% do ordenado médio da União Europeia.

Por fim, Portugal é terceiro país da União Europeia que detém mais contratos a prazo, dificultando ainda mais o acesso a estabilidade no emprego que permita, por exemplo, constituir família e adquirir casa própria.

Ou seja, todas estas convergências tornaram Portugal um país com mercado de trabalho muito envelhecido - metade dos trabalhadores têm entre 44 e 64 anos - e que poderá ser estruturalmente dependente de mão-de-obra estrangeira.

Nesta frente existem desafios políticos de monta. Se é certo que a imigração, onde também há muito trabalho a fazer em termos de organização de quem vem para o país, será relevante para inverter o inverno demográfico nacional, também é ainda mais relevante reter e recuperar Portugal para que parte destes jovens voltem ao país. E isso tem de começar pelas bases, ou seja, dinamizar e reformar a economia empresarial, criando condições às empresas para que possam pagar melhor, e para que os jovens possam ter incentivos a criarem o seu próprio posto de trabalho assim que terminam os estudos.

Os incentivos de capital aos projetos de potencial empresarial dentro da universidade podem ser uma forma de o fazer. Portugal precisa muito de empresários e de alimentar aos nossos jovens a ambição de construírem o seu próprio caminho. E se tiverem condições de apoio na altura certa, pode bem ser uma - obviamente não a única - razão relevante para acreditarem no seu país, e quem sabe, serem, a prazo, os futuros gigantes da economia nacional.

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