Vão todos de férias a pensar numa mão-cheia de nada

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No futebol, como em qualquer campeonato em que se quer sair vencedor, a estratégia com que se vai a jogo é a última a revelar-se, e de preferência ao mesmo tempo que os oponentes. É assim que parece que o Governo e a oposição se estão a comportar em relação ao tema que aqueceu fortemente o debate da nação nesta semana: o Orçamento do Estado para 2025 (OE2025). Ainda com o quadro plurianual de despesa pública para o próximo ano por revelar - que o Governo só irá avançar depois de negociar com a Comissão Europeia o limite da despesa, onde a margem é curta para manter o equilíbrio orçamental -, nem o Executivo avança com medidas concretas, nem o PS e os restantes partidos se chegam à frente, a não ser para criticarem uma vez mais o IRC e o IRS Jovem. Depois dos ziguezagues vão todos de férias a pensar numa mão-cheia de nada.

Quem inventou a rentrée política - que significa literalmente reentrada, voltar, regressar a casa - deveria estar a pensar que, no calor do verão, todos os portugueses param para fazer férias, suspendem os seus problemas e retomam pensamentos mais críticos, estratégias e discussões a partir de setembro (para arrumarem uma casa que deixaram desarrumada), quando já estivermos todos fartos de praia.

Acontece que há um mundo real para uma esmagadora parte da população, a quem as preocupações do trabalho, da casa, da família, da gestão do orçamento pessoal, da saúde mental, nunca param de desfilar à sua frente e no seu pensamento. Não desaparecem por nada. Este país real é um país nunca adormecido e que conta com as decisões políticas que tardam em surgir, mas que esperam sempre mais um pouco por uma rentrée dos políticos, o tal regresso à casa da política depois da silly season.

Parece que há um campeonato para se jogar antes da rentrée  e outro para depois, e que convém deixar em suspenso este depois - neste caso com um fantasma de eleições antecipadas (que é uma espécie de botão vermelho que todos sabem que não querem premir, mas que vale a pena mostrar quem tem dedos para o fazer). O secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, que adiou para setembro a sua participação na primeira reunião para discutir o OE2025 - e que é justificada por ausência do primeiro-ministro, Luís Montenegro, que estava doente -, disse no mesmo dia (em Braga) que o Partido Socialista está disposto a fazer cedências na medida em que o Governo também as faça, mas frisou também que “não se pode ter medo de eleições”. Acresce ainda que pesa às costas de Pedro Nuno Santos a expectativa da esquerda de que não venha a ceder.

Sem propostas concretas para o OE2025, sendo certo que não haverá espaço para grandes medidas, continua-se a chover no molhado - é o que temos visto até agora. E este primeiro encontro apenas serviu para demonstrar publicamente intenções, com o Governo a manifestar abertura para negociar o que quer que venha a propor no documento, e com os dois principais partidos da oposição a dizer que, para já, vão a jogo, mas que prognósticos só no final (á la João Pinto). 


Diretor interino do Diário de Notícias

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