O Barómetro DN/Aximage de setembro, publicado na passada sexta-feira, gerou controvérsia. A reação não nos surpreendeu. Antecipámos o descontentamento, uma vez que o estudo apontava o Chega como vencedor – algo inédito em 50 anos de democracia. O partido de André Ventura surgiu em primeiro lugar, embora em empate técnico com a AD e o PS, dada a margem de erro.A realidade é que o Barómetro DN/Aximage é um estudo de opinião que conduzimos regularmente desde o ano passado. Foi interrompido apenas durante o verão e terá continuidade em outubro. Não há memória de a sua realização ter sido questionada quando, invariavelmente, apontava a AD ou o PS como líderes. É válido questionar aspetos técnicos da sondagem – como em qualquer estudo deste género –, mas o timing da sua publicação é uma falsa questão. Pelo contrário, a sondagem é oportuna, pois traz para o debate um assunto que não pode ser ignorado.Dito isto, a ascensão do Chega só surpreende os mais distraídos. Com 70 mil membros, o partido de André Ventura é hoje a maior força da oposição, atraindo uma vasta legião de descontentes com o statu quo.As sondagens captam apenas uma fotografia do momento, mas a sua importância está em revelar tendências. O futuro dirá se o Chega continua a liderar, mas é inegável que o partido tem uma dinâmica de crescimento. Este impulso é, em parte, alimentado pelos seus próprios opositores, que, ao demonizarem o partido, reforçam a sua imagem de alternativa para os insatisfeitos.A grande questão não é se o Chega está a crescer, mas se pode de facto alcançar o poder, como parceiro do PSD ou sozinho; e, se o conseguir, se sobrevive ao teste da realidade.A primeira questão é relativamente fácil de responder: em política não existem impossíveis. O PSD de Montenegro ocupa hoje um lugar charneira no sistema político, desempenhando um papel que durante décadas foi assumido pelo PS. Esta estratégia permite-lhe negociar tanto com o PS como com o Chega, consoante as conveniências, tornando- -se imprescindível em qualquer solução de governo. Contudo, esta estratégia pode mudar, e não se pode excluir a hipótese de o “não é não” ser posto na gaveta.Já o cenário de um governo liderado pelo Chega no curto e médio prazo é muito menos provável, a menos que consiga duplicar a sua base de apoio. Em 2015, Passos Coelho não conseguiu formar um governo estável, mesmo tendo vencido as eleições com quase 40% dos votos, porque foi de imediato derrubado por uma coligação negativa liderada pelo PS. Imaginemos, pois, como seria com Ventura, a menos que o PSD estivesse disposto a viabilizar um governo do Chega ou a ser o seu parceiro júnior. Uma possibilidade que, por exótica que pareça, também não pode ser excluída.A segunda questão é mais complexa. Devido ao seu crescimento rápido, muito assente no carisma e na capacidade de comunicação de André Ventura, o Chega continua a ser um partido unipessoal, com falta de quadros qualificados. A “novela” da eventual candidatura presidencial de Ventura veio mais uma vez confirmar a dependência do partido em relação ao seu líder. E o facto de Ventura ainda não ter conseguido formar um “governo sombra” é outra indicação nesse sentido. O grande risco é, no momento decisivo, o partido não ter pessoas à altura para assumir as suas responsabilidades perante o país, o que poderia causar problemas infindáveis.Para resolver este problema, o Chega tem dois caminhos que podem ser seguidos em simultâneo: o primeiro é continuar a crescer de forma orgânica, sobretudo entre os jovens, aproveitando a proximidade do poder; o segundo é crescer através de “fusões e aquisições”, retomando o projeto da “federação das direitas” para ir buscar quadros qualificados a outras forças.Por fim, convém não esquecer que ninguém sabe como reagirá o eleitorado do Chega quando o partido provar o poder e deixar de ser a voz anti-sistema. Quanto vale o voto de protesto nos seus números? A experiência do Bloco de Esquerda, que perdeu dois terços do seu grupo parlamentar após o fim da geringonça, serve de exemplo para os riscos de se passar de um partido de protesto a um parceiro do poder.Diretor do Diário de Notícias