Uma nova esperança na luta contra o cancro 

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Se não tem cancro, valorize a vida. Se o tem, valorize-a ainda mais. 

Jim Stynes, jogador de futebol gaélico, falecido de melanoma (1966-2012) 

Em 2023, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde, o cancro foi responsável pela morte de 10 milhões de pessoas, um número que continua a aumentar. Felizmente, estudos recentes apresentados este ano apontam para uma nova luz de esperança nesta difícil e, por vezes, inglória batalha contra o cancro. Estas investigações reforçam o enorme potencial das vacinas de RNA mensageiro (RNAm), inicialmente desenvolvidas para combater a COVID19 e determinantes no controlo da pandemia. Importa recordar a atribuição do Prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina de 2023 a Katalin Karikó e Drew Weissman, pelas descobertas que possibilitaram o desenvolvimento destas vacinas — a segunda vez que uma equipa ligada a uma vacina foi distinguida com o maior galardão da ciência. A primeira tinha sido em 1951, quando Max Theiler foi galardoado pelo desenvolvimento da vacina contra a febre amarela. 

Ensaios iniciais em ratinhos revelaram um efeito benéfico das vacinas de RNAm em alguns tipos de cancro, um benefício não relacionado com a prevenção da COVID19 nem com ação direta sobre o tumor. Estudos posteriores, apresentados este ano por médicos e cientistas da Universidade da Flórida e do prestigiado MD Anderson Cancer Center, no Texas, envolvendo mais de mil doentes com cancro do pulmão ou melanoma, confirmaram esses resultados, com ganhos significativos na sobrevida. Nos casos de cancro do pulmão avançado, os doentes que receberam a vacina de RNAm até 100 dias após o início da imunoterapia anticancerígena viram a sobrevida quase duplicar, de 21 para 37 meses. No melanoma metastizado, a sobrevida aumentou de 27 para, pelo menos, 40 meses. Resultados impressionantes, atribuídos à estimulação do sistema imunitário, que reforçou a eficácia das terapias imunológicas. 

É importante salientar que estes benefícios ocorreram apenas com vacinas de RNAm, em doentes submetidos a imunoterapia, e quando administradas dentro da janela temporal dos 100 dias entre o início do tratamento e a vacinação. Os investigadores recolheram dados preliminares, ainda não publicados, que sugerem que a aplicação num intervalo de 30 dias antes ou depois da imunoterapia poderá ter um impacto ainda maior. 

Sem dúvida, trata-se de notícias muito animadoras na luta contra um dos maiores flagelos da Humanidade, numa altura em que a administração do Presidente Donald Trump anunciou um corte de 500 milhões de dólares no financiamento destinado à investigação em tecnologia de RNAm. Esperemos que esses cortes não tenham impacto nesta investigação crucial. 

Em conclusão, se a vida deve ser sempre valorizada, só há vida se soubermos valorizar a ciência. 

Doutorado em Saúde Pública

Membro do Conselho Nacional de Saúde Pública

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