Um país que “joga” na bolsa
O desconhecimento que existe em Portugal a respeito do mercado de capitais é próprio de um país onde a literacia financeira é fraca e que continua atrasado em vários domínios. Por vezes, mesmo os líderes partidários e pessoas que desempenham altos cargos públicos revelam um grande desconhecimento sobre o assunto.
É o caso de Pedro Nuno Santos, que no final de janeiro comparou o mercado de capitais a um “casino”. Referindo-se a uma eventual intenção de privatizar a Segurança Social, que atribui ao Governo, o líder do PS defendeu que “os descontos de quem trabalha devem financiar um sistema público de pensões e não devem ser canalizados para o casino, para o jogo, para a aposta, para fundos de pensão, fundos de investimento e seguradoras”.
A posição de Pedro Nuno Santos a respeito da eventual privatização da Segurança Social é, evidentemente, válida. Que o PS pretenda manter o atual sistema público de pensões é algo legítimo e coerente com aquela que tem sido a sua posição ao longo de meio século. Será também uma posição partilhada por largos milhões de portugueses. O que não se compreende é a confusão entre mercado de capitais e “casino”, contribuindo para perpetuar a ideia, ainda prevalecente em Portugal, de que na bolsa joga-se, não se investe.
O que Pedro Nuno Santos parece ignorar é que o próprio Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social investe em ações e obrigações de empresas cotadas no mercado de capitais, para além de dívida pública nacional e estrangeira, imobiliário e outros ativos. As ações representam cerca de um quarto da carteira do fundo de estabilização e têm registado uma forte valorização nos últimos anos, pelo que, sem o dito “casino”, a almofada de 40 mil milhões de euros que ajuda a garantir as nossas pensões seria bastante mais leve.
No fim de contas, o problema que temos em Portugal não é mercado de capitais a mais, mas sim o contrário, nomeadamente a dependência excessiva das empresas em relação ao financiamento junto da banca. E é o facto de não termos, à escala europeia, um mercado de capitais eficiente e robusto, como aqueles que existem nos EUA e no Reino Unido. O atraso que a Europa tem em áreas cruciais como a Inteligência Artificial, o fabrico de semicondutores e a indústria de defesa devem-se, em grande parte, ao facto de não termos um mercado de capitais unificado a nível europeu, que sirva para canalizar, de forma eficiente, as poupanças dos cidadãos e das empresas para financiar os setores produtivos da economia. Um mercado de capitais dinâmico sustenta a inovação e a tomada de risco, desempenhando um papel fundamental para o desenvolvimento e o progresso.
Diretor do Diário de Notícias