Ruy Ferraz Fontes é o que de mais parecido com um herói a polícia do Brasil tem: um agente corajoso que não só combateu como ainda mapeou o Primeiro Comando da Capital (PCC). Primeiro, identificou José Márcio Felício, o Geleião, e César Augusto Roriz, o Cesinha, como líderes fundadores da organização. E depois o sucessor, Marcos Camacho, o Marcola, que condenou Geleião e Cesinha à morte, profissionalizou e internacionalizou os negócios.Reformado da polícia, Fontes preferiu continuar a vida pública como um anónimo secretário da prefeitura de Praia Grande, cidade de 260 mil habitantes no litoral do estado de São Paulo, a entrar com pompa na política, como tantos pares seus.Sim, na tentativa de emular o fenómeno de votos Capitão Bolsonaro, que chegou até a presidente, há, depois das últimas eleições, 57 deputados estaduais, 44 deputados federais e dois senadores membros ou ex-membros das polícias, a civil, a militar e a federal, a desfilarem nos parlamentos como “heróis veteranos”, servindo-se dos postos - Coronel isto, Delegado aquilo, Subtenente aqueloutro - como nome de guerra eleitoral. Pois foi graças a quase todos os Coronel isto, Delegado aquilo, Subtenente aqueloutro e muitos mais deputados que a Câmara aprovou, com “caráter de urgência”, o agendamento da votação de uma amnistia “ampla, geral e irrestrita” aos envolvidos no plano de golpe, incluindo Bolsonaro. Além disso, com o impulso de outros deputados que se denominam Bispo isto, Pastor aquilo, Reverendo aqueloutro, buscaram uma brecha no regimento da Câmara para impedir que o terceiro filho do ex-presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro, mesmo ausente desde março por estar a morar nos EUA, onde faz lóbi junto ao governo de Donald Trump pelo aumento das taxas sobre exportações brasileiras e sanções a autoridades do país, perdesse o mandato por faltas.Pior: com larga maioria, aprovaram ainda uma proposta de emenda à Constituição que prevê que a abertura de ações penais contra parlamentares necessite do aval dos próprios parlamentares. Em suma, blindaram-se da justiça. Como alertou, entretanto, um sensato senador contrário à emenda, essa blindagem da justiça em causa própria vai permitir que o PCC, que já se infiltrou na Faria Lima, a Wall Street brasileira, conforme demonstrou operação policial do fim de agosto, invada de vez a política na forma de deputados imunes.Mudando de assunto, no passado dia 16, ao sair da prefeitura de Praia Grande após mais um dia de trabalho, Ruy Fontes foi perseguido por um carro de onde saíram três pistoleiros ligados ao PCC para executar, com mais de 20 tiros, uma ordem dada pela Sintonia Restrita, o setor da maior organização criminosa da América do Sul que determina o assassinato de autoridades. E, conforme informações divulgadas depois do crime, Fontes sabia desde 2019 que estava jurado de morte. Mas nunca requereu, como era seu direito, um carro blindado pago pelo estado. O ex-delegado é o que de mais parecido com um herói a polícia do Brasil tem. Jornalista, correspondente em São Paulo