Um governo do PS, pelo PS, para o PS

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Parafraseando o que um homem notável disse em Gettysburg, há 159 anos, o executivo apresentado ontem por António Costa é um governo do PS, pelo PS, para o PS. Esse é o facto do conjunto de nomes que o governo soltou e que o Presidente confirmou na sua página oficial. Três das pastas mais centrais da legislatura que agora começará ficaram a cargo de três quadros políticos do Partido Socialista: Fernando Medina, que gerirá umas Finanças em tempo de guerra, Duarte Cordeiro, que assumirá o Ambiente na era da autonomia energética, e José Luís Carneiro, que será MAI com um país em seca e uma saída de duodécimos à beira da época de incêndios. Mais do que isso, e com a ironia de estarmos no início de uma maioria absoluta, é também um governo de despedida: com Mariana Vieira da Silva a número 2, Ana Catarina Mendes nos Assuntos Parlamentares, Carneiro na Administração Interna e Medina no Terreiro do Paço, António Costa está a elevar sucessores como alternativa a quem não lhe quer lhe suceda. Pedro Nuno Santos, o menos efusivo dos socialistas entre um costismo maioritário, enfrentará dois desafios neste ciclo: o primeiro, a TAP, bota que não descalçará enquanto ministro das Infraestruturas; o segundo, reinventar-se, na medida em que a esquerda que antes uniria sobre si está eleitoralmente desfeita depois de janeiro e politicamente tóxica depois da Ucrânia.

Pedro Adão e Silva, que abandona a comissão de celebração do cinquentenário do 25 de Abril, não foi primeira escolha para ministro da Cultura e Eurico Brilhante Dias também não para líder parlamentar do PS. Gomes Cravinho, que não teve um mandato feliz como ministro da Defesa, será o MNE menos influente na política externa portuguesa desde a adesão à CEE, tendo os Assuntos Europeus passado para a alçada do primeiro-ministro ‒ assim mais próximo da sua adorada, merecida e destinada Bruxelas. Sobram dois coelhos da cartola: Elvira Fortunato, que muito prestigiaria qualquer governo, e Maria Helena Carreiras, que enfrentará uma tarefa hercúlea chamada Defesa Nacional. Maria do Céu Antunes, na Agricultura e Alimentação, é o elo mais fraco de uma equipa que não ilude nem desilude: a sua incompatibilização com a CAP e a sua tendência para a gafe não auguram nada de bom para uma pasta que, em contexto de crise internacional, merecia mãos mais capazes.

Quando Costa lhe chama governo de combate é preciso entender que não se tratará de uma luta de frente única: do futuro do seu partido à revolução política que a invasão da Rússia provocou na União Europeia, folgas não serão costume em São Bento. Na oposição, por mais alienados que o PSD e o seu líder demissionário prossigam, o PS estará diante de dois novos grupos parlamentares altamente ideológicos, que lhe darão trabalho: o CH e a IL. Em Belém, como se viu pelo dia de ontem, a ambientação à maioria absoluta será um processo doloroso, quando não cómico, que sempre reúne o condão de nos fazer rir perante um mundo que lida com a inflação, a pandemia e um tirano com o dedo no botão de 6 mil ogivas nucleares. Boa sorte aos mencionados. Bem precisam.

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