Trump e Putin. Uma cimeira com muito pouco para contar

Publicado a

É manifesto pela informação que foi chegando durante o fim de semana que Donald Trump não atingiu os objectivos iniciais que se propunha obter no encontro que teve com Putin, no Alasca. Trump queria um cessar fogo imediato. As suas declarações iniciais apontavam nesse sentido e era esse o objectivo que o faria feliz conforme foi sublinhando à comunicação social. 

Mas não foi esse o resultado que saiu da Cimeira que teve lugar em Anchorage. Ou seja Putin vai continuar a bombardear alvos civis na sua trajectória criminosa de invasão de um país soberano que escolheu o seu destino por via democrática em eleições livres. 

Pouco se sabe ainda de sólido do encontro entre Trump e Putin, se bem que Marco Rubio e Steve Witkoff, os homens que acompanharam Trump, em diferentes momentos mediáticos, tenham soltado alguma informação cuja veracidade só viremos a confirmar no futuro. 

Ao que tudo indica o objectivo principal de Putin, futuramente, será obter o controlo total do Donbass, a mais industrial de todas as regiões da Ucrânia, que Putin abocanhou e que nos dias de hoje controla a 87 por cento.  

Tal é a importância que Putin dá a esta região que ela poderia tornar-se na moeda de troca apresentada por Vladimir Putin em troca de um acordo de paz. Contudo, esse é um objectivo de difícil concretização dado que Zelensky não parece disposto a facilitar a vida a Putin na obtenção da totalidade do Donbass. 

Actualmente a Rússia ocupa 20 por cento do território ucraniano. Das duas regiões que constituem o Donbass, Donetsk e Luhansk , a Rússia ocupa três quartos da primeira e a quase totalidade da segunda. 

Os ucranianos controlam 2.600 milhas quadradas do Donbass e ali, ainda, vivem mais de 200 mil civis ucranianos. 

Um controlo completo do Donbass poderia ser um bom argumento para Putin poder levar ao Kremlin, apresentando esse objectivo como uma vitória que impedisse a sua fragilização política. 

Entretanto se alguma coisa de material pode ter resultado da cimeira de Anchorage é a promessa de Trump feita a Zelensky de que, no futuro, os Estados Unidos dariam alguma garantia de segurança à Ucrânia no sentido de suster a possiblidade de futuras agressões de Putin. Estas seriam garantias dadas com base no Artigo 5 da NATO, mas sem que se verificasse qualquer adesão formal da Ucrânia à NATO. 

Este talvez seja o mais significativo resultado pós cimeira, mas conhecendo-se Trump como o mundo o conhece há que dar o devido desconto à dimensão de verdade que esta afirmação possa conter. 

Entretanto, consumada a derrota de Trump na obtenção de um cessar fogo imediato, a narrativa virou-se para um longo corredor de possiblidades do começo de percurso que conduza, sabe-se lá quando, à obtenção de uma paz negociada. 

Há uma vaga promessa de uma segunda cimeira que pudesse juntar Trump, Putin e Zelensky, mas esse desiderato está ainda no domínio das possiblidades muito vagas. 

Entretanto para compor o ramalhete no final da cimeira Trump deixou cair as tão badaladas e prometidas sanções à Rússia caso não fosse obtido um cessar fogo imediato.  

Putin pode assim respirar de alívio. Um confortável compasso de espera para a fragilidade económica em que se encontra a economia russa. Com uma inflacção a 10%, uma acentuada quebra no seu sistema produtivo, um crescimento débil de apenas 0,4 % e juros sufocantes no valor de 18 %. É uma economia estrangulada pela exigência de um esforço de guerra e um povo a empobrecer e a ver os mais jovens morrerem num conflito bélico ainda sem fim à vista. 

Durante o fim- de- semana o xadrez diplomático internacional mexeu-se. 

A União Europeia, sempre tão mal tratada por Trump, esteve reunida com Zelensky. Macron e Merz encontram-se com o presidente ucraniano e na comunicação social surgiu a simbologia  dos habituais abraços de apoio a Zelensky e à causa ucraniana. 

Vamos ver se à União Europeia não vai sair a fava com a possiblidade de, futuramente, os países que a integram terem de enviar tropas para uma eventual linha de contacto congelada que venha a resultar de um hipotético acordo de paz. Coisa que Putin não quer nem ouvir falar. 

Esta foi pois uma cimeira que se formos optimistas talvez possa ter lançado na terra uma ligeira semente de esperança em que, sabe-se lá quando, possa ser alcançado um acordo de paz. Mas esse parece ser um objectivo muito longínquo.  

Portanto a guerra, por agora, vai continuar na Ucrânia. Putin permanecerá o mandante dos crimes que, diariamente, são praticados sobre civis em violação aos mais elementares princípios  que regulam os grandes conflitos internacionais. 

Trump, esse, regressou a Washington para insistir no ataque  aos fundamentos mais elementares da democracia nos Estados Unidos.  

Nós cá ficaremos à espera que esta cimeira tenha servido para alguma coisa mais que não o branqueamento dos crimes que Putin tem vindo a cometer e pelos quais está condenado pelo Tribunal Penal Internacional.  

Jornalista

Diário de Notícias
www.dn.pt