Trump: dar tempo a Putin, condicionado pela nomenclatura político-militar

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Em 28 de Fevereiro de 2025, Trump recebeu Zelensky na Sala Oval da Casa Branca.

Trump e Vance criticaram de forma humilhante Zelensky. Terá sido o único caso, no decurso de várias décadas, em que um Presidente em exercício atacou, publicamente e de forma aberta, um Chefe de Estado visitante na própria Casa Branca.

Putin já havia enunciado as suas condições para a celebração de um Acordo de Paz: o reconhecimento dos territórios ocupados na Ucrânia (com mais alguns acrescentos em Donetsk, Kherson e Zaporijia), bem como a renúncia da Ucrânia à entrada na NATO, à existência de Forças Armadas fortes e de garantias de futuro respeito pela sua própria soberania, nomeadamente através da indicação de Forças de Segurança e de Observação como as europeias.

Na prática, tratar-se-ia de uma rendição “pura e dura” da Ucrânia.

Trump, nesta fase do processo, nunca levantou qualquer objecção às condições impostas por Putin.

Entretanto, o mesmo Putin afirma que precisa de, pelo menos, até finais de 2025 para negociar uma paz consolidada, dando a entender que precisaria de algum tempo para ocupar o que, ainda, não tinha conseguido ocupar na Ucrânia.

Trump inicia, então, um processo negocial com Zelensky e com os líderes europeus em que vai dando a entender, entre Março e Maio, que está descontente com as posições de Putin e que terá, num “belo dia de Sol e de Esperança”, de aplicar sanções à Rússia.

Estabelece prazos, a dois meses, a doze dias e, finalmente, a dez dias.

Mas vai adiando a aplicação de sanções.

Depois, tudo passou a depender de uma Cimeira com Putin no Alaska.

A Cimeira no Alaska ocorreu em 15 de Agosto último, dela nada resultando, a não ser uma promessa de Cimeira a três (envolvendo Putin, Trump e Zelensky), Cimeira essa que, volvido pouco tempo, passou a ser a dois (já sem a presença incómoda de Zelensky).

Entretanto, Trump foi fazendo ajustamentos ao seu discurso político, condicionado que estava (e está) pela opinião pública americana e pela nomenclatura político-militar do seu país.

Trump não pode ignorar que existem sectores críticos ao seu posicionamento face à Ucrânia, não apenas no Partido Democrático (aonde quase 100% da base social de apoio discorda dele) como, inclusive, no Partido Republicano (em que mais de 25%-30% está com os ucranianos), sendo, ainda, certo que, apesar das mudanças que Trump tem vindo a operar no aparelho de Estado, uma parte relevante da nomenclatura político-militar está mais do lado de Zelensky do que do lado de Putin.

Assim, Trump alterou o seu discurso, procurando dar a ideia de que, ao fim e ao cabo, também ele apoiava a Ucrânia.

Primeiro, dando a entender que os “Serviços de Inteligência” cooperavam com os invadidos, sendo, todavia, certo que ele próprio teria sempre dificuldades em controlar, por inteiro, essa situação.

Segundo, dizendo que poderia vender equipamentos à NATO – pagos pela Europa –, equipamentos esses que se destinariam a apoiar a Ucrânia.

Até que surgiu a possibilidade de um eventual envio de mísseis tomahawk e de um encontro com Zelensky em Outubro.

Da reunião nada de concreto resultou, a não ser um possível encontro Trump-Putin que ocorreria, provocatoriamente, para a Ucrânia e para os europeus, na Hungria.

Na sequência da reunião com Zelensky e, seguramente, por pressão da nomenclatura político-militar, Trump afirmou “ser necessário um cessar-fogo em que cada parte ficaria na fronteira da respectiva zona de território controlada”.

A Rússia não aceitou, explicando logo que pretendia mais do que isso.

E logo apareceram alguns comentadores a dar razão a Putin, uma vez que os russos, coitados, apresentam a seu favor uma “dinâmica de vitória”, precisando, naturalmente, de mais algum tempo para alargarem as suas conquistas.

Para esses comentadores, o cessar-fogo talvez faça sentido depois da conquista de Kiev pelos russos.

Enfim, Trump lá anulou o encontro húngaro e, finalmente, os EUA aplicaram sanções sobre duas petrolíferas russas.

E a Ucrânia lá vai usufruindo de menos apoio efectivo dos EUA e Putin vai tentando pôr em prática a sua estratégia de alargamento dos avanços no terreno até ao fim do ano.

Até agora, Trump tem procurado dar tempo a Putin, simulando preocupação com a Ucrânia. Mas, o futuro da Ucrânia depende mais da Europa e de Zelensky do que dos EUA de Trump.

Nem mais, nem menos…

Economista e professor universitário

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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