TAP: as responsabilidades também voam
A privatização da TAP deverá arrancar em março, tal como previsto, mas o processo não deverá ser de fácil concretização, como o DN tem noticiado. Por um lado, o PS tem colocado exigências que prometem dificultar a vida ao Governo, ao opôr-se à venda da maior parte do capital e ao exigir que o Estado mantenha um papel ativo na gestão da companhia. Por outro, surgiu uma contingência judicial que vai reduzir o encaixe financeiro para o Estado (ver notícia aqui). Em causa está um valor que poderá situar-se entre 100 a 150 milhões de euros e que está relacionada com a recente decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que concluiu que a política de contratação da companhia entre 2006 e 2021 estava a ser malfeita.
De forma muito sintética, o que aconteceu foi que os contratos de trabalho de cerca de 2000 tripulantes de cabine foram mal fundamentados, pelo que, ao menos em teoria, as pessoas abrangidas por esta situação poderão exigir à TAP o pagamento de retroativos, dado que deveriam ter sido incluídas no quadro de efetivos desde o seu primeiro dia de trabalho, em vez de ficarem meses ou anos com vínculos precários.
Ao que tudo indica, alguém terá cometido um grave erro durante 15 anos e a conta chegou agora, com o sindicato dos tripulantes a colocar em cima da mesa um valor na ordem dos 300 milhões de euros. Porém, mesmo que, no final do dia, sejam “apenas” 100 milhões, será muito dinheiro e terá de ser refletido no valor da TAP na privatização.
O que mais surpreende nestes assuntos em torno da TAP é que a responsabilidade parece sempre morrer solteira. Responsabilidade essa que, importa referir, não cabe apenas aos administradores da companhia, dada a frequente interferência dos sucessivos Governos. Vejamos o caso da aquisição da VEM, a empresa brasileira de manutenção e engenharia que a TAP comprou à Varig há cerca de 20 anos.
A companhia portuguesa perdeu mais de 900 milhões de euros nesta aventura brasileira, que terá sido decidida após um acordo político entre os dois países. Em contrapartida, a TAP terá conseguido entrar no mercado brasileiro, uma conquista que lhe permitiu assegurar um papel fundamental nas ligações aéreas entre a Europa e a América do Sul.
Terá valido a pena? O antigo presidente da empresa, Fernando Pinto, respondeu a esta questão de forma curiosa no Parlamento, esta semana, afirmando que o negócio da VEM foi “bom, no geral”, mas que provavelmente não o voltaria a fazer. Uma resposta que dá que pensar.
Tal como dá que pensar que os contribuintes portugueses tenham colocado mais de 3000 milhões na TAP, para cobrir estes e outros erros, e que agora a companhia seja vendida a estrangeiros com uma avaliação que deverá rondar os 1000 milhões. A menos que se demonstre que os benefícios indiretos para o país com o facto de se ter salvo a TAP superam o encaixe obtido, é difícil de entender.
Diretor do Diário de Notícias