SNS: a urgência não é fechar urgências, é mudar de política

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Luís Montenegro tinha prometido um plano de emergência para a saúde em 60 dias. Na primeira versão do atual governo PSD/CDS já tinha ficado à vista que esse plano era promessa eleitoral que não era para cumprir. Pelo menos na interpretação de que tal Plano poderia ser um pacote de soluções para resolver os problemas do SNS, depressa ficou claro que ele não seria nunca concretizado.

O anúncio agora feito pelo Governo PSD/CDS da concentração de urgências a nível regional, começando já com as urgências de ginecologia e obstetrícia na Península Setúbal no início de 2026, deixa mais três coisas à vista.

A primeira, é que o Plano do Governo PSD/CDS para a saúde não é resolver os problemas do SNS, é disfarçá-los. A segunda, é que o Governo anuncia como novidade medidas recauchutadas, que foram já experimentadas e rejeitadas no passado por não funcionarem. A terceira, é que o Governo utiliza os problemas do SNS para amputar o próprio SNS, retirando-lhe ainda mais capacidade de resposta e criando condições para o florescimento do negócio de quem faz lucro com a doença.

Um dos critérios de eficácia dos serviços de urgência é a sua proximidade às populações e aos utentes. O acesso rápido a esses serviços, prevenindo prejuízos que resultam da demora no atendimento e na prestação de cuidados, é um fator decisivo para a eficácia da intervenção em situação de urgência. Deixar serviços de urgência mais distantes dos utentes é uma medida em sentido contrário a essa eficácia.

O adequado dimensionamento do serviço de urgência face ao volume de solicitações dos utentes é outro dos critérios a ter em conta. Quando se concentram vários serviços de urgência num só sem redimensionar a sua capacidade de resposta ao volume total de solicitações que tinham anteriormente todos os serviços que são encerrados, o que isso significa é que se está a desenhar um sistema ineficaz e estrangulado à partida.

As experiências feitas no passado confirmam que tudo isto é assim e mostram as consequências dessas opções.

Ficam a perder os utentes e os profissionais de saúde. Uns e outros ficarão sujeitos a piores condições de funcionamento do SNS. Aqueles encontrarão condições ainda mais difíceis de acesso a cuidados de saúde. Estes verão degradar-se as condições de trabalho e acentuar-se a exaustão, a desmotivação e o desânimo que, com frequência, desembocam no abandono do SNS.

Ficam a ganhar os grupos económicos que exploram hospitais privados e verão aumentar a carteira de clientes construída a partir dos utentes que não têm no SNS resposta às suas necessidades. Ao contrário do SNS – que tem obrigação de tratar todas as doenças e todos os doentes –, os hospitais privados estarão ainda mais à vontade para escolher os doentes e as doenças que tratam, optando pelo que não der muito trabalho nem grandes encargos e deixando de fora quem não tenha dinheiro para pagar.

As opções do governo PSD/CDS prejudicam gravemente a saúde. A urgência não é acabar com serviços de urgência, é mudar de política.

Eurodeputado

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