Sistema de Segurança Interna, um desvalor inexplicável

Governo tem mostrado capacidade de decisão, pelo menos já apresentou 12 pacotes de medidas para vários setores. É difícil de entender este desvalor em relação a um setor tão sensível como é a segurança que tem um papel insubstituível na afirmação da soberania nacional. 
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Nesta quinta-feira, dia 22 de agosto, termina a comissão de serviço do embaixador Paulo Vizeu Pinheiro no cargo de secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI). No momento em que escrevo este texto, não é conhecido ainda o nome do seu substituto. Agravado pelo facto de esta data ser já um prolongamento do seu mandato, que devia ter terminado a 15 de julho passado, para assumir no dia seguinte as suas novas funções de Representante Permanente de Portugal junto da Organização do Tratado do Atlântico Norte - DELNATO, em Bruxelas, como determina o despacho assinado desde 4 de março último pelo então primeiro-ministro, António Costa. Ou seja, há seis meses que os atuais governantes sabem que é preciso substituir o diplomata e nem prolongando ainda mais um mês o seu mandato, se decidiram.                   

Podemos encolher os ombros e dizer: “Ora, qual é a pressa? Estamos em Portugal!” Mas podemos também questionar-nos e até indignar-nos ao pensar se esta ausência de decisão não significa um preocupante desinteresse do Governo em relação à maior estrutura de coordenação estratégica, controlo e direção da segurança nacional.

Um primeiro sinal já tinha sido dado pelo facto de no Programa do Governo não haver uma única referência ao SSI. Luís Montenegro não deu continuidade à política de  Rui Rio que defendia, no programa eleitoral do PSD para as Legislativas de 2022, um novo modelo de organização do SSI, com reforço do poder.

Nos últimos três anos, o SSI acabou, de facto, por ser reforçado, centralizando todo o processo de reorganização do sistema de fronteiras que resultou da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) em outubro de 2023. Foi criada a Unidade de Coordenação de Estrangeiros e Fronteiras, um “mini-SEF”, agora dirigido por um oficial da PSP, que articula o trabalho das forças de segurança e centraliza toda a informação relativa às entradas e saídas em território nacional.

Foi Vizeu Pinheiro quem estabilizou o Ponto Único de Contacto para a Cooperação Policial Internacional (PUC-CPI) , o maior conjunto de sistemas de informações alguma vez reunido sob a mesma entidade, conseguindo, com o apoio do diretor nacional da PJ, Luís Neves, chegar a um consenso para integrar neste PUC os gabinetes Europol e Interpol, que estavam na Judiciária. É ainda sob a égide do secretário-geral do SSI que funciona a Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT), o mais importante fórum de partilha de informações entre polícias e “secretas”.

Paulo Vizeu Pinheiro, justiça seja feita ao anterior Governo que o nomeou em julho de 2021, foi um trunfo para António Costa e para o PS. Vindo da área política do PSD - foi assessor diplomático do PM Passos Coelho e Conselheiro diplomático de Barroso na Comissão Europeia -, constituiu um dos raros momentos de consenso, nesta área, entre os dois maiores partidos nacionais durante a governação socialista.

Assumiu a missão com empenho, valendo-se em muito da sua veia diplomática para a difícil tarefa de tirar as polícias das suas “quintinhas” e garantir que comunicam, cooperam e se apoiam, organizando até almoços informais regulares entre todos os chefes das polícias que muito serviram para criar laços e afastar mal-entendidos.

Nestes três anos, enfrentou uma pandemia e duas Eleições Legislativas, enquanto teve de gerir, umas vezes bem outras menos bem, todas as tempestades que foram surgindo da extinção do SEF.

Por tudo isto, tem uma experiência e conhecimentos que devem ser partilhados com o sucessor. Não ouso pensar que isso não vai acontecer, mas é duvidoso que seja com o tempo adequado a tudo o que está em causa no SSI, mesmo que a nomeação surja hoje.

O Governo tem mostrado capacidade de decisão, pelo menos já apresentou 12 pacotes de medidas para vários setores. É difícil de entender este desvalor em relação a um setor tão sensível como é a segurança, que tem um papel insubstituível na afirmação da soberania nacional.

Como sublinhou o ex-ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, numa sua intervenção ainda como governante, “a segurança é fundamento do Estado e condição de liberdade. (…) Dela depende o sentimento de pertença, de coesão e de bem-estar, crucial à paz, à democracia e à valorização externa do nosso País”.

Na entrevista DN-TSF, que publicaremos na sexta-feira, manifesta a sua estranheza com o procedimento do Governo em relação ao SSI e defende que, para esta escolha, deve ser consultado o maior partido da oposição.

Diretora adjunta do Diário de Notícias

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