Signal dos tempos

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Não espanta que Jeffrey Goldberg tenha pensado que o grupo de Signal em que foi incluído, com dezena e meia de altos responsáveis da Administração Trump, fosse falso. É que o diretor da revista The Atlantic era provavelmente o último jornalista que os colaboradores do presidente quereriam numa conversa em que se debatiam estratégias de guerra. Aos 59 anos, Goldberg há muito se destacou como crítico de Trump, tendo em 2020 escrito que este se referira a militares mortos em combate como “falhados” e em 2024 voltado a denunciar o desprezo do milionário pelas Forças Armadas, citando-o a dizer que precisava “do género de generais que Hitler tinha”.

Nascido em Brooklyn numa família judaica, depois de desistir dos estudos na Universidade da Pensilvânia, Goldberg foi para Israel, onde serviu nas Forças Armadas. No seu livro Prisoners: A Muslim and a Jew Across the Middle East Divide contou a experiência como guarda prisional nos anos 1990, em plena Primeira Intifada. Foi em Israel que começou a carreira como jornalista, como colunista do Jerusalem Post. De volta aos EUA, foi repórter policial do Washington Post e trabalhou para a New York Times Magazine, antes de ser contratado pela New Yorker como correspondente no Médio Oriente. De volta aos EUA, onde se especializou em Segurança Nacional, em 2007 o dono da Atlantic não olhou a meios para o contratar e enviou-lhe mesmo uns póneis, de presente para os três filhos, para o convencer.

Agora, o homem que nos últimos oito anos liderou a revista fundada em 1857 como Atlantic Monthly, protagoniza um escândalo que os democratas já comparam ao Watergate. Mesmo se poucos acreditam que tenha para Trump as consequências que o assalto à sede do Partido Democrata teve para Nixon em 1974.

Quanto aos que questionam por que é que Goldberg não divulgou logo as informações sobre os bombardeamentos americanos aos houthis no Iémen, o próprio explicou à MSNBC que demorou a ultrapassar a incredulidade. “Nunca tinha passado por isto - no período anterior ao 11 de Setembro, no 11 de Setembro, no Iraque, no Afeganistão, etc. -, mas trata-se de questões de vida ou de morte. E não se pode simplesmente divulgar informações sobre alvos, horários específicos de ataques que ainda não tiveram lugar numa aplicação comercial de mensagens.”

“O jornalista deve recusar as práticas jornalísticas que violentem a sua consciência”, diz o ponto 6 do Código Deontológico do Jornalista. Goldberg não teve dúvidas de que o risco em que colocaria o seu país se divulgasse aquelas informações era maior do que o interesse público que estas podiam ter. Mas não deixou, mais tarde, de relatar um caso que revela uma gravíssima falha de segurança por parte da Administração Trump.

Editora-executiva do Diário de Notícias

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