A criminalidade violenta em Lisboa está a descer e esse é um dado central no debate sobre segurança na capital. Os números apresentados pelo comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, superintendente-chefe Luís Elias, no 158.º aniversário do Cometlis, mostram uma redução de 1,9% na criminalidade violenta e grave nos primeiros dez meses de 2025, depois de uma descida de 1,6% em 2024 e de 2,4% face a 2023. As detenções aumentaram 46,6% e os crimes detetados por iniciativa policial cresceram 64,5%. Estes números confirmam a tendência que o próprio Governo já tinha reconhecido no Relatório Anual de Segurança Interna de 2024: no distrito de Lisboa, a criminalidade geral desceu 7,6% e a violenta e grave 1,8%; no concelho de Lisboa, a criminalidade geral caiu 8,2%. Ou seja, Lisboa continua a ser uma cidade segura, num país que está entre os mais seguros da Europa.Em contraciclo está ainda o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas. Na semana passada, na tomada de posse, exigiu ao Governo mais agentes da PSP e mais polícias municipais para a capital, repetindo uma linha argumentativa coerente desde, pelo menos, 2023. A segurança é um terreno confortável para qualquer autarca que queira mostrar firmeza. O problema é quando a narrativa deixa de ter ligação sólida aos factos. Não é que não façam falta mais polícias. Sabemos que sim, porque foram desviados centenas de agentes para a segurança aeroportuária e porque se arrasta uma essencial reorganização das esquadras que permitiriam libertar recursos.A questão que se coloca é como compatibilizar estes apelos com os dados oficiais, que mostram reduções sucessivas nos crimes mais graves? Como exigir mais meios, se não se organizam os que existem? E como evitar que a perceção pública seja condicionada por leituras fragmentadas, desligadas das estatísticas oficiais?Não se trata de negar problemas. O próprio comandante do Cometlis lembra que a criminalidade geral subiu 6,1% este ano, que há fenómenos de criminalidade organizada, tráfico de droga e violência doméstica que exigem respostas estruturadas, e que a perceção de insegurança pode ser manipulada por leituras casuísticas e sensacionalistas. Mas um discurso político que parte da exceção para a regra ajuda pouco. Pior: alimenta o medo, distorce a perceção pública e pressiona as forças de segurança para respostas simbólicas em vez de estratégias consistentes.O balanço apresentado pela PSP sugere que o trabalho operacional - patrulhamento, prevenção, proximidade e investigações dirigidas a fenómenos concretos - tem produzido resultados consistentes. O Cometlis intervém diariamente nos transportes, nas escolas, nos bairros residenciais e turísticos, em eventos e manifestações, articulando recursos em áreas muito distintas. É esta malha fina, feita de visibilidade, programas de proximidade e operações cirúrgicas contra tráfico e violência, que reduz a criminalidade violenta e melhora a vida quotidiana de quem mora e trabalha na área metropolitana.Perante isto, vale a pena perguntar se faz sentido sobrecarregar ainda mais a PSP com novas competências de investigação - por exemplo, em matéria de tráfico de droga ou crimes com armas de fogo, como tem sido defendido por alguns setores - quando já é responsável pela maior área populacional do país, a segurança de infraestruturas críticas e, desde 2023, também responsabilidades acrescidas nas fronteiras.Mais competências sem mais meios significam, quase sempre, menos capacidade para fazer bem o essencial. Que impacto teria essa mudança no equilíbrio entre prevenção, patrulhamento e proximidade, que constituem grande parte do trabalho diário na área metropolitana? Como garantir que novos poderes vêm acompanhados dos meios, formação e estruturas necessárias? São algumas perguntas em que deve pensar quem defende este aumento de competências, em vez de se focar na forma como podem a PSP, GNR e PJ cooperar para evitar sobreposição de funções e assegurar que a investigação segue critérios claros de prioridade e coordenação. A resposta não pode ser simplista. Não se trata de reclamar privilégios ou exclusividades, mas sim de definir claramente quais as competências, que meios lhe são atribuídos e como a PSP se articula com os demais órgãos (PJ, GNR, Ministério Público). A cooperação e a clareza institucional contam tanto quanto os meios.Quanto ainda à narrativa de Carlos Moedas - o autarca de Lisboa podia e devia exigir melhores condições para quem garante a segurança na cidade: instalações dignas, equipamentos modernos, habitação acessível para polícias colocados numa das zonas mais caras do país.Curiosamente, é também isso que o comandante do Cometlis pede ao Governo e às autarquias: reabilitação de esquadras degradadas, mais alojamento para agentes jovens, viaturas, proteção individual, câmaras corporais, drones. Essa é a agenda exigente que verdadeiramente reforça a segurança.Lisboa não precisa de uma retórica de cidade sitiada. Precisa de políticas públicas que partam de um diagnóstico rigoroso, que valorizem o trabalho das forças de segurança e que recusem a instrumentalização do medo como ferramenta de governação. A criminalidade violenta está a descer; o desafio agora é fazer descer também o ruído político que insiste em dizer o contrário. O que importa é saber como consolidar a evolução apresentada pela PSP de Lisboa, como fortalecer as condições de trabalho dos polícias e como clarificar o quadro institucional para que cada polícia possa desempenhar as suas funções com eficácia e previsibilidade.