Se a Polónia cair, ninguém na Europa está a salvo

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Quem saía do Palácio da Ciência e da Cultura após subir ao 30.º andar para apreciar a vista de Varsóvia deparava-se, na quarta-feira ao fim da manhã com um aglomerado de pessoas na praça frente ao edifício oferecido por Estaline ao povo da cidade, tornando-se símbolo do comunismo, mas que nos últimos anos ganhou estatuto de ex-líbris da capital polaca. No meio de jornalistas, transeuntes e alunos acabados de visitar o Palácio estava Rafal Trzaskowski. O presidente da Câmara de Varsóvia, recém-derrotado na segunda volta das presidenciais polacas, falava pela primeira vez em público desde as eleições. E o discurso pode ter sido sobre quantas árvores vai plantar na praça, mas as perguntas, essas, foram todas sobre o resultado eleitoral e o futuro - de Trzaskowski e da Polónia.

Afinal a vantagem de Karol Nawrocki, o candidato do nacionalista Lei e Justiça (PiS) - e favorito de Donald Trump -, sobre o rival da Plataforma Cívica foi mínima. E a primeira sondagem à boca das urnas até dava mesmo Trzaskowski na frente. Questionado sobre o que o espera, o autarca, de 53 anos, garantiu que o partido vai seguir em frente, o governo de Donald Tusk vai seguir em frente e ele próprio vai continuar a trabalhar pela capital.

Chegada a Varsóvia na segunda, poucas horas depois da reviravolta que confirmou Nawrocki como sucesso de Andrzej Duda na presidência, depressa percebi que, pelo menos na capital, muitos ainda tentavam digerir a vitória do historiador, de 42 anos, frente ao seu presidente da Câmara. Com uma diferença de menos de 400 mil votos, Nawrocki e Trzaskowski são os rostos de uma Polónia dividida. Uma perceção que o mapa dos resultados confirma, com o amarelo do candidato da Plataforma Cívica a dominar o Ocidente do país e o azul do seu rival do PiS a pintar o Leste. Uma divisão também entre uma Polónia rural, mais conservadora, e uma Polónia urbana, mais progressista.

Pode parecer longe de Portugal, mas as consequências das eleições polacas vão sentir-se em toda a Europa. Para já, Tusk convocou um voto de confiança no dia 11, crente de que a coligação de governo o vai manter no poder e continuar a aproximação a Bruxelas. Mas a tarefa do primeiro-ministro, que já foi presidente do Conselho Europeu, será cada vez mais difícil, muito devido ao poder de veto de Nawrocki.

Sexta economia europeia, com um crescimento acima de 3%, a Polónia tem procurado afirmar-se como a potência que é, liderando, na sua presidência da UE que agora termina, o esforço do continente para garantir a sua segurança. Com a guerra na Ucrânia do outro lado da fronteira, por aqui reina a ideia de que a Polónia pode ser a próxima na mira das ambições imperialistas da Rússia de Vladimir Putin, se não tiver um poderio militar capaz de dissuadir o senhor do Kremlin. Nesta desconfiança em relação a Moscovo quase todos os polacos parecem unidos - memória histórica oblige! E deixam o alerta: se a Polónia cair, ninguém na Europa está a salvo.

Editora-executiva do Diário de Notícias

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