Que caminho para a indústria automóvel portuguesa?
Em face dos objetivos e das metas do Pacto Ecológico Europeu, da Estratégia Industrial Europeia e do Pacto das Competências, a indústria automóvel (produção de veículos, componentes, serviços e derivados), uma das mais importantes da economia europeia, enfrenta um desafio de grande envergadura estratégica. Tanto mais que esse ajustamento tecnológico interno, em termos energéticos, digitais e de competências, ocorre no quadro de uma feroz competição geoeconómica, geopolítica e geoestratégica global. Quadro este em que a China detém os principais dados do jogo da transição dos veículos a combustão para os veículos elétricos. Por ser matéria tão decisiva, a Comissão Europeia vai lançar um amplo debate estratégico com todos os stakeholders que, direta ou indiretamente, contribuem para o setor.
Na União Europeia estaremos a falar entre 13 a 14 milhões de empregos. De um dos setores que mais investe em Investigação & Desenvolvimento e com uma das mais elevadas taxas de produtividade por pessoa empregada. De acordo com dados da Associação Automóvel de Portugal relativos a 2024, a indústria automóvel nacional, com uma produção de 332.546 veículos, atingiu 42,6 mM€ de faturação e gerou 10,9 mM€ em receita fiscal.
Estamos a falar de 35 mil empresas e 167 mil empregos que estão na produção de veículos, mas que dinamizam vastos setores de atividades económica essenciais à coesão e ao desenvolvimento territorial. Grande parte (87,6%) da produção nacional é vendida na Europa, estando a Alemanha, a Itália, a França, a Espanha e o Reino Unido entre os principais clientes.
Por considerar este setor estratégico, o Governo anterior deu-lhe destaque num novo Regime Contratual de Investimento (RCI), ao qual atribuiu inicialmente um montante de 2 mil e 50 milhões de euros, por via de Resoluções de Conselho de Ministros (RCM 34/2023 e RCM 49/2024). Nelas e para as indústrias da mobilidade foram estabelecidas duas prioridades: a produção quer de combustíveis verdes, quer de matérias-base circulares, ou seja, hidrogénio e amoníaco verdes, polímeros e metais descarbonizados; e, por outro lado, o desenvolvimento da fileira do lítio, crítica para a mobilidade elétrica.
Há dois projetos, entre outros, que têm sido apontados como emblemáticos das possibilidades pelas quais Portugal tem que concorrer no contexto da nova realidade internacional. Um projeto para a produção de motores elétricos, o West Horse Powertrain, já contratado ao abrigo da RCM 34/2023, e que associa a Renault (fábrica em Cacia/Aveiro), com um fabricante automóvel chinês, Geely, e, ainda, a empresa estatal de petróleo da Arábia Saudita, ARAMCO.
O segundo exemplo, está na produção de baterias para veículos elétricos, em Sines. Um projeto de investimento de 2000 milhões de euros da chinesa CALB e que já maturado depois de anos de trabalho pelas instâncias nacionais, está para ser anunciado pelo governo ao abrigo da RCM 49/2024.
Estes são apenas dois dos resultados do anterior governo e dos instrumentos então lançados, a que se somam, por exemplo, o início da produção de veículos elétricos pela Stellantis em Mangualde, ou os novos investimentos da americana Borgwarner em Viana do Castelo e da alemã Bosch em Braga, mas a questão é: perante este quadro e na iminência da discussão ao nível europeu, porquê esta passividade e inação do atual Governo no apoio que a indústria nacional do automóvel e dos seus componentes necessita face à crise que a ameaça?
Deputado do PS