Quando o Natal é uma guerra nuclear
Para muitas crianças, o Natal é sinónimo de conflitos parentais que se assemelham a uma verdadeira guerra nuclear. Discutem-se as horas de transição entre o pai e a mãe (ao minuto), compete-se pelos melhores presentes e o Natal transforma-se numa guerra sem sentido. Quando os adultos não conseguem comunicar e negociar de forma ajustada, são as crianças que pagam a fatura. Bem cara.
Neste contexto, e ao invés de uma época de magia e felicidade, muitas crianças vivem momentos de elevada tensão e ansiedade, presas em conflitos de lealdade que as impedem de amar livremente ambos os pais e outros familiares.
O que muitos pais esquecem é que as crianças crescem. E, ao crescer, com maior maturidade e capacidade de análise crítica das situações, conseguem olhar de outra forma para as situações que vivenciaram. E, não raras vezes, voltam-se contra os pais que os manipularam e sugestionaram.
"As crianças têm o direito a conviver com ambos os pais e com todos os familiares e a sentirem que podem amar sem que esse amor lhe seja, depois cobrado."
É isto mesmo. A exposição aos conflitos familiares tem um impacto negativo a curto, médio e longo prazo. O que significa que amanhã, quando as crianças de hoje forem adolescentes ou adultos, terão na sua memória os comentários depreciativos e os insultos que ouviram em relação ao outro progenitor, as manobras com fim à obstaculização de contactos, as pressões e interrogatórios a que foram sujeitas. E, muito frequentemente, sentem-se revoltadas, enganadas e maltratadas.
Porque é de um maltrato que falamos. Importa chamar as coisas pelos nomes e afirmar bem alto que estamos perante situações de maltrato psicológico. Aquela forma de maltrato que não deixa marcas visíveis na pele ou nos ossos, mas que deixa marcas bem profundas no coração e na memória.
Neste Natal que se aproxima, aos pais envolvidos nestas guerras deixo o apelo à sensibilidade e à empatia. As crianças têm o direito a conviver com ambos os pais e com todos os familiares e a sentirem que podem amar sem que esse amor lhes seja, depois, cobrado.
A todos os profissionais que, de uma forma ou de outra, têm conhecimento deste tipo de situações, tenham a coragem de a encarar como uma situação de maltrato. Que precisa de ser devidamente sinalizada e acompanhada.
As crianças precisam de um Natal em paz e não de uma verdadeira guerra nuclear.
Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal