Desde o início do ano já nasceram 154 bebés fora dos hospitais. 57 desses partos terão ocorrido em ambulância, um número que ultrapassa já o de 2024.Se precisássemos de um “postal” que ilustrasse as dificuldades que hoje existem no acesso à saúde, aí o temos.Não é um acaso o facto de a maioria dos nascimentos em ambulância ter ocorrido na Península de Setúbal, coincidindo com o encerramento em simultâneo de três urgências de Ginecologia-Obstetrícia da região.Esta situação mostra bem as consequências do desinvestimento no SNS e os seus impactos dramáticos na vidas dos utentes.Não investir no SNS, sobretudo nos seus recursos humanos, e dizer que é possível manter o mesmo nível de qualidade e cobertura nos cuidados de saúde prestados é enganar deliberadamente as pessoas.A concentração de serviços de saúde - sobretudo de serviços de urgência - pode disfarçar a falta de investimento durante algum tempo mas, mais cedo que tarde, o engano ficará à vista. O drama é que o custo desse engano paga-se com a saúde e a vida das pessoas que precisam de cuidados de saúde e ficam sem eles.É essencial que haja instalações boas e próximas dos utentes, bem apetrechadas de equipamentos, com serviços de saúde a funcionar em rede e de forma articulada, quer ao nível hospitalar quer entre os cuidados de saúde primários, os cuidados hospitalares e os cuidados continuados.Tudo isso depende das opções que se fazem em termos de organização e de investimento físico ou material no SNS. Mas depende ainda mais do investimento que se faz (ou não) nos seus recursos humanos.Salários condignos, boas condições de trabalho, horários de trabalho adequados e perspectivas de evolução na carreira são hoje questões transversais às diferentes profissões da saúde. Sendo tidas em conta, elas determinam a capacidade de fixação e atracção de profissionais para o SNS. Sendo ignoradas, elas agravarão a carestia de profissionais e a incapacidade dos serviços corresponderem às necessidades dos utentes.A concorrência e competição entre hospitais públicos e privados na disputa de profissionais prejudica o SNS e, por arrasto, a grande maioria da população que, sendo pobre ou remediada, depende do SNS para ter acesso aos cuidados de saúde mais relevantes. E de forma ainda mais penalizadora no interior do país e nas áreas carenciadas.O investimento que está a ser feito em Évora, na construção do novo Hospital Central Público do Alentejo, tem de ser uma oportunidade para, atempadamente, inverter esse rumo.À qualificação assegurada pelas novas instalações é preciso corresponder com outras medidas nas questões decisivas dos salários, da evolução nas carreiras e do número de profissionais necessário para garantir horários de trabalho adequados.Tudo isso deve estar articulado com a criação de capacidade formativa (nomeadamente na medicina) em condições que permitam, desde cedo, a criação de vínculos desses profissionais com os serviços e a Região. Acrescentando-se a articulação do novo hospital com as instituições de ensino superior e investigação científica visando objectivos de desenvolvimento científico e tecnológico.Tudo isso é necessário porque a nossa saúde depende de haver hospitais e de muito mais. EurodeputadoEscreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico