Portugal em chamas: quando o problema é mais profundo do que o calor

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Nos últimos dias, Portugal voltou a ser consumido pelas chamas. As causas repetem-se: calor extremo, vento forte, trovoadas secas, fogo posto...

É verdade: Uma onda de calor com temperaturas acima dos 40 °C cria as condições ideais para o fogo se propagar. Mas limitar o debate à meteorologia é tapar o sol com a peneira ou, pior ainda, usar o clima como desculpa.

As nossas características mediterrânicas são um fator potenciador do risco de incêndios. Mas se potencia, não determina. Por isso importa compreender que o clima português é apenas um dos fatores na origem dos incêndios em Portugal.

Significa por isso que há mais fatores que contribuem para esta flagelo que tende a repetir-se anualmente.

Em Trancoso, um único incêndio destruiu oito mil hectares e obrigou à mobilização de quase 700 bombeiros, num combate desigual que se prolonga há mais de uma semana. Ao todo, cerca de 1.700 operacionais estão no terreno.

Também não é menos verdade que Portugal continua refém de um mosaico florestal mal gerido, onde o eucalipto domina e o mato se acumula. O despovoamento rural retira braços e olhos que poderiam prevenir, detetar e travar ignições. Em muitas aldeias, o que resta é um território vulnerável, entregue ao acaso das chamas e à esperança de que a Proteção Civil consiga chegar a tempo.

O Socialismo fez planos e relatórios, mas nunca ensaiou uma ação coerente e persistente. Prevenir incêndios não é limpar matos em junho e respirar de alívio em setembro. É uma política continuada de décadas, que exige incentivos claros para a diversificação florestal, apoio efetivo às comunidades rurais e fiscalização séria.

Mas também temos bons indicadores que demonstram que sabemos fazer algumas coisas bem. Desde logo Portugal reduz um terço das ignições e consegue extinguir 95% dos focos iniciais. O problema é que os incêndios que escapam ao controlo tornam-se críticos.

Ano após ano, o país mobiliza-se na emergência, gasta milhões no combate e celebra as vitórias momentâneas, quando a linha de fogo é cortada, quando a aldeia é salva, quando a meteorologia ajuda. Depois, instala-se o esquecimento. Voltamos a falar de incêndios apenas no verão seguinte.

Esta ausência de continuidade é talvez o maior dos nossos fracassos. Precisamos de encarar a prevenção como um investimento permanente, e não como um custo que se arruma no orçamento de verão.

A cada verão, perguntamos: “Quando vai parar?”. A resposta é simples e dura; só quando deixarmos de olhar para o fogo como uma catástrofe episódica e passarmos a tratá-lo como o sintoma crónico.

Presidente da Concelhia do PSD em Lisboa

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