Porque não se pode votar em João Ferreira?

Publicado a

Afinal, o PS, o Bloco e o Livre amam o PCP e a CDU!É essa a conclusão que tiro depois de ouvir tantas lamentações da candidatura liderada por Alexandra Leitão, tanto choro de “amor traído” por João Ferreira ter recusado uma proposta de matrimónio eleitoral para as autárquicas em Lisboa.

A argumentação política de base é esta: caso a CDU se tivesse aliado a esses partidos de esquerda, Carlos Moedas, o atual presidente da Câmara, que lidera uma coligação da direita (sem o Chega, note-se), seria derrotado... “Traição! Traição!”, gritam a toda a hora.

Não percebo...

Como é que esta aliança PS+Livre+Bloco, que, se tivesse existido nas autárquicas anteriores, teria ganho a Câmara de Lisboa, está agora com medo de perder para Carlos Moedas, que mostrou, em quatro anos, de forma consistente e espetacular, ser um mau presidente de Câmara? Como se justifica tanta insegurança?

Este medo de Alexandra Leitão em perder as eleições nada tem a ver com a CDU. O problema de Alexandra Leitão está na sua incapacidade de mostrar que pode vir a ser uma boa presidente de Câmara e, assim, ganhar o voto de quem, em 2021, foi ao engano votar em Carlos Moedas.

João Ferreira mostrou precisamente o contrário: qualquer mente não sectária tem de reconhecer que, nos debates televisivos e nas rádios (aos quais Leitão e Moedas, significativamente, sempre que puderam, faltaram), a preparação, o conhecimento dos problemas e a sensatez das soluções propostas por João Ferreira estão a anos-luz daquilo que Leitão e Moedas demonstraram. Ele seria, claramente, um melhor presidente de Câmara.

Mais: Alexandra Leitão não quis romper com as “malfeitorias” à cidade que, neste mandato, os vereadores do PS fizeram ou permitiram fazer a Moedas. Também não quis romper com os erros graves das anteriores gestões do PS, de Fernando Medina e de António Costa. Como é que a CDU e o PCP, o meu partido, poderiam alinhar com este branqueamento?

Querem falar de “traição” autárquica em Lisboa?

Lembro-me de quando, em 2013, António Costa “traiu” a CDU e negociou com o PSD o redesenho das freguesias de Lisboa, que passaram de 53 para 24, de forma a beneficiar eleitoralmente o “centrão” e impedir que a CDU mantivesse a presidência de cinco juntas de freguesia. E lembro-me de como o PCP, o meu partido, não hesitou em “engolir o sapo” e propôs, na noite eleitoral de 4 de outubro de 2015, um acordo político para impedir que a direita voltasse a governar o país – a origem da “geringonça” que, em 2022, o mesmo António Costa voltou a “trair”.

Esta esquerda, que tanto agora ama a CDU, ainda há pouco tempo chamava aos militantes do PCP de “criminosos”, por causa das suas posições sobre a guerra na Ucrânia ou por terem realizado a Festa do Avante! no ano da pandemia. Acha que isso ajudou?...

E esta esquerda, que tanto pede o voto útil da CDU em Lisboa, não se propôs unir aos comunistas e aos Verdes, por exemplo, em Setúbal, para garantir que candidatos apoiados pela direita não venham a ganhar a câmara. Enfim...

Além disso, é diferente governar o país e governar uma autarquia – como, aliás, o eleitorado há décadas demonstra, votando de forma distinta em legislativas e em autárquicas.

Porque carga de água, se os eleitores concluírem (como parece ser inevitável) que é a CDU que tem as melhores propostas para a cidade, o melhor voto em Lisboa não há de ser o voto em João Ferreira? Alguém consegue explicar?

Jornalista

Diário de Notícias
www.dn.pt