Partidos unidos

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Vergonha alheia toda esta semana. Perante o escândalo nacional do financiamento parlamentar, é expectável que os vários partidos cubram as costas uns dos outros, já que todos foram ao pote (bloco de esquerda incluído). O que já é insustentável é assistir à esmagadora maioria dos analistas e comentadores políticos a branquearem toda esta fajardice. Que miséria. Porca miséria. Para lavarem todo este cortejo corrupto, esses comentadeiros que não passam de comissários do poder (incluindo vários jornaleiros e jornalixos pé de microfone), arranjam bodes expiatórios como o ministério público, relativizam tudo, desviam atenções, baralham propositadamente conceitos para confundir audiências. Enfim, as tácticas habituais. Em vez de procurarem a aplicação rigorosa da lei e combaterem um dos cancros do regime, o do financiamento partidário, os vendidos-com-direito-a-horário-nobre falam de braços armados de interesses ocultos ou de justicialismo, pervertendo os factos sem dó nem piedade e minando ainda mais o regime.

Vejamos. Estes mesmos partidos que legislam em causa própria, alteraram a lei (oito mudanças desde 2003) e esvaziaram os reguladores externos. Foi retirado ao Tribunal Constitucional a competência de fiscalização, tirado à manca Entidade das Contas o poder de emitir regulamentos, amnistiou-se por prescrição todos os processos que estavam em curso (por isso nem têm havido coimas para os partidos incumpridores).
De resto, o tribunal constitucional invariavelmente aligeira as "sentenças" da entidade de contas e nunca analisou contas dos grupos parlamentares. Pois é. Todas estas alterações procuraram "legalizar" os desvios e entorses que eram (e são) permanentes.

Depois disto, os partidos prosseguiram sem pinga de ética, falhando também a monitorização interna. E agora ainda barafustam. É preciso ter lata. Mas que lata.
Realmente, as tais sucessivas alterações da lei criaram, propositadamente, as ditas zonas cinzentas de que falou o Presidente da República ou que denunciou Margarida Salema, presidente da entidade de contas durante 9 anos. Portanto, realmente agora tudo é mais difícil mas tal não pode ser motivo para confundir as verbas para o pessoal da actividade parlamentar e para o das actividades partidárias. As atribuições são distintas, está na lei e não o cumprir é uma violação flagrante. Aliás, é inaceitável que deputados que, diariamente, escrevem leis, são legisladores, aleguem desconhecimento da própria lei que criaram. Ou não?

Claro que os parlamentares podiam ter investido em clarificar regras e procedimentos, seguindo as melhoras práticas e garantindo uma fiscalização independente dos fundos dos dinheiros parlamentares. Só que não. Poder podiam, mas não quiseram. É assim Portugal segue sendo um dos países mais corruptos da Europa. Aliás, por exemplo e como exemplo apenas, só adoptámos três das 15 recomendações do Conselho da Europa para o combate à corrupção em 2022, segundo o relatório do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO) divulgado há um mês. Mas o problema é o populismo, certo? Um soninho descansado para vocês também.


Psicóloga clínica. Escreve de acordo com a antiga ortografia

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