Os militares portugueses vão combater na Ucrânia?
A estupidez belicista que comanda esta parte do mundo, que corta pela raiz qualquer florzinha de paz que se atreva a tentar nascer, transforma em quase certeza uma temerária previsão: Portugal vai ter em breve militares seus a lutar na guerra que, por agora, decorre na Ucrânia.
Os países da NATO, mesmo se não esgotarem a sua capacidade de ajudarem o Exército de Zelensky com dinheiro, munições, armas ligeiras, canhões, blindados, mísseis, drones, aviões e toda a parafernália de armamento disponível, serão rapidamente confrontados com a decisão de passarem para além da linha vermelha que eles próprios definiram: a falta de efetivos na Ucrânia, dado o número elevado de baixas que está a acontecer nesta guerra e a aparente maior capacidade da Rússia em ir substituindo as do seu lado, obrigará a NATO a discutir, para assegurar a comprometida e constantemente renovada "eterna solidariedade" com o governo ucraniano, o envio de soldados dos seus países, apesar de terem prometido que eles nunca pisariam aquele terreno de batalha.
Há 20 anos, a 20 de março de 2003, quatro dias depois da Cimeira das Lajes, os Estados Unidos da América e alguns dos seus aliados (Grã-Bretanha, Dinamarca, Polónia e Austrália) iniciaram uma nova invasão do Iraque, sem acordo da ONU. Como sabemos, esses países mobilizaram a opinião pública ocidental para aceitarem o envio dessas tropas através de uma deliberada mentira: a existência de um perigo universal de construção de armas de destruição maciça pelo regime de Saddam Hussein.
Dois meses depois Portugal, cujo primeiro-ministro Durão Barroso fizera de hospedeiro da cimeira que lançara essa guerra, era cúmplice dessa mentira e mandava as primeiras tropas para o Iraque.
A guerra do Iraque provocou, diretamente, cerca de 100 mil mortos (há, porém, avaliações credíveis que apontam para mais de 300 mil), mas a crise humanitária que gerou e a prolongada intervenção ocidental no Médio Oriente, até 2021, estendeu esse desastre humanitário para mais de um milhão de vítimas mortais e para três ou quatro vezes acima desse número em contagens de feridos e de civis refugiados. O Iraque ficou devastado.
Estão documentados inúmeros crimes de guerra cometidos pelas forças norte-americanas e britânicas, mas nenhum tribunal internacional de Direitos Humanos sentenciou os seus autores. Em contrapartida, alguns dos denunciantes desses crimes ou morreram em oportuníssimos suicídios (o inglês David Kelly é o caso mais conhecido) ou estão presos sem julgamento justo (quem ainda se lembra de Julian Assange?).
Para quebrarem a promessa de não envolver tropas da NATO numa guerra com a Rússia, os dirigentes dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e Polónia, os mais aguerridos na atual guerra, vão precisar de um pretexto ou de um conjunto de pretextos para apresentarem aos seus aliados e à opinião pública ocidental.
Certamente terão imaginação e profissionalismo suficientes para os arranjarem, mesmo se forem falácias, e certamente, como aconteceu no Iraque, contarão com um magnífico megafone comunicacional que reproduz as suas vozes sem as questionarem.
É por isso que antevejo, dado o seguidismo histórico e cumplicidade habitual da maioria dos nossos políticos com as loucuras bélicas dos Estados Unidos e da NATO, a inevitabilidade de soldados portugueses irem combater na Ucrânia.
Acontece que a possibilidade de morrerem na Ucrânia compatriotas nossos será muito maior do que aconteceu no Iraque: a força militar oponente é muito mais forte.
Acontece também que essa etapa significará o envolvimento de Portugal numa Terceira Guerra Mundial, com enormes possibilidades de, a seguir, se estender ao Pacífico e à China ou, simultaneamente, de desembocar numa guerra nuclear.
É isto que queremos?
Jornalista