Os “inocentes úteis”

Publicado a

O Bloco de Esquerda e o PCP, os parceiros do PS de António Costa na chamada Geringonça, têm muito mais em comum do que as clássicas divisões entre leninistas, trotskistas e maoistas indicam. Pertencem, na classificação de vários institutos políticos europeus, à “extrema-esquerda” ou à “esquerda radical”, partilhando visões coletivistas da sociedade e da economia, se necessário à custa dos interesses individuais. A sua visão sobre as empresas, o lucro as relações laborais é conhecida. E também se arrogam uma certa arrogância ou superioridade moral das suas ideias, sobretudo face a outros partidos e quadrantes ideológicos. Por norma, aceitam pouco escrutínio (incluindo da imprensa), são ferozes na forma como qualificam qualquer crítica ou reparo e taxativos na penalização que pedem para quem, no seu entender, errou politicamente.

No caso do Bloco de Esquerda foi assim quando um dos seus vereadores em Lisboa, Ricardo Robles, se envolveu, com a irmã, num negócio de especulação imobiliária quando o partido condenava a prática. O partido negou, atacou o Jornal Económico (que avançou a notícia) e depois tentou desvalorizar o caso.

Aconteceu o mesmo no caso do despedimento de funcionárias do Bloco que haviam sido mães recentemente. O partido acabou por admitir “erros” no processo. Na verdade é mais do que isso: o Ministério Público está a investigar o caso, porque o Bloco decidiu que o vínculo das duas funcionárias foi excecionalmente estendido sob a forma de contratos-fantasma. Ou seja, em causa pode estar uma situação de fraude à Segurança Social.

O DN revela na sua edição desta quarta-feira uma situação no PCP que pode levantar as mesmas dúvidas. Trata-se do caso de uma trabalhadora que integrou a direção da JCP, a Juventude Comunista, e que agora revela ao DN que, durante meses, em 2019, terá recebido o equivalente a um salário mínimo por atividade regular e contínua, mas em dinheiro vivo, sem recibo, fatura ou comprovativo. Em bom português: “por debaixo da mesa”, evitando, assim, descontos à Segurança Social ou a prestação de informação à Autoridade Tributária sobre rendimentos.

Acusa ainda a CGTP de a ter despedido ilegalmente e de, quando falou em queixar-se às autoridades, ter sido “indemnizada” com o equivalente a um ano de salários para ficar calada.

Ou seja, quando são as empresas a fazê-lo são “facínoras sociais”, merecedores dos piores castigos e encómios. Veremos o que dirão agora, sendo certa uma outra e triste constatação: o que quer que tenha acontecido no PCP e no Bloco contou com a cumplicidade e conivência de quem lá trabalhava, sabia, viu ou ouviu estas práticas e nada fez, supostamente para “não dar armas à direita”.

Ao contrário da expressão “idiotas úteis” - que é erradamente atribuída a Lenine, o pai do comunismo soviético - o qualificativo “inocentes úteis” tem autor perfeitamente identificado. Trata-se do economista austríaco Ludwig Edler von Mises, que a usou no seu livro Planned Chaos, para descrever a forma como os comunistas designavam os “simpatizantes mais confusos ou equivocados” da Revolução. Uma expressão visionária, que bem poderia descrever o que se passa em alguns partidos no Portugal de 2025.

Diretor-Adjunto do Diário de Notícias

Diário de Notícias
www.dn.pt