Os grandes ofendidos à portuguesa e europeia
Na mesma altura em que o vice-presidente dos EUA vinha a Munique demonstrar como quem paga a conta acaba sempre por ter o direito de decidir o que é que cada um come à mesa, Portugal entrou numa espiral de maior importância - para os nossos representantes eleitos e a maioria dos comentadores: a má educação dos deputados no Parlamento e, está claro, a necessidade “premente” de regular, legislar, o comportamento dessas pessoas.
A coincidência de os dois casos se terem sucedido em 24 horas (com as respetivas ondas de choque a sucederem-se nos dias seguintes) até facilita a ligação entre eles. J.D. Vance veio à conferência europeia de Segurança dizer, entre outras coisas, que a (sua) América já não se revê numa Europa que cada vez mais cerceia a liberdade de expressão. Afirmação que irritou de tal forma o demissionário chanceler alemão, Olaf Scholz, que afirmou de seguida, muito enxofrado, que “os EUA não dão lições de democracia à Alemanha”.
Isto vindo do líder de um país que tem leis de comportamento público tão duras que fizeram, recentemente, com que uma mulher vítima de violação tivesse pena mais pesada por difamar, nas redes sociais, o seu agressor, do que este. Por ser menor, o rapaz levou pena suspensa, enquanto ela teve de passar um dia em privação de liberdade, após tê-lo chamado “porco” num post no X...
O ex-primeiro-ministro português António Costa - o atual presidente do Conselho Europeu - disse uma vez em entrevista que “não há nenhuma [sic] atividade humana que não possa ser regulada”. O resultado desta mentalidade está bem à vista na UE. Um monstro burocrático incapaz de inovar e crescer, como toda a gente hoje admite, mas ninguém encontra solução para resolver - pela óbvia razão de que a solução seria destruir esse mesmo gigante de ineficiências. E assim ficamos.
Ao fim de três anos em guerra, a Europa vê-se arredada de qualquer solução para a mesma - porque neste período limitou-se a “empurrar com a barriga” e deixou-se ficar de mão estendida ao “amigo rico” do outro lado do Atlântico. O que é mais triste ao ouvir agora Scholz, ou Macron, ou até Sánchez (que, como bom socialista, já veio dizer que a solução é uma aproximação à fantástica democracia chinesa...) é a noção de que estamos perante crianças a fazer birra à frente do pai quando este lhe diz que já não lhes paga a mesada, porque não fez os trabalhos de casa. Mas e alguém na Europa fez alguma coisa para não estar nesta situação?
Claro que nada disto interessou nos últimos dias à agenda política portuguesa. Afinal, as ofensas na AR são mais uma oportunidade para tentar legislar mais um bocadinho sobre a vida - e assim cumprir o aparente sonho do Grande Regulador.
Editor do Diário de Notícias