A expectativa que sempre existe em vésperas de apresentação do Orçamento do Estado era este ano ainda maior. Como iria o governo responder à enorme incerteza do cenário macroeconómico, que não aconselha aventureirismos? O que faria para atenuar o efeito da inflação junto das famílias? Como evitaria que as empresas mais afetadas pelos custos da energia fechassem portas, aumentando o desemprego, contraindo a procura e, consequentemente, gerando recessão económica? Para responder a estas questões, o governo apostou numa tripla..A primeira foi a mais inesperada e é a de maior impacto político: a assinatura de um acordo de médio prazo entre governo, sindicatos e confederações patronais..Num momento tão sensível em termos económicos e sociais, com inflação impulsionada pela guerra, altos preços de energia a ameaçar importantes setores económicos e a perspetiva de recessão profunda em vários países, este acordo reveste-se de uma importância especial. Ao estabelecer um caminho claro em termos de políticas de rendimentos e competitividade para os próximos anos, proporciona um quadro de estabilidade que os empresários tanto valorizam, ao mesmo tempo que assegura aumentos salariais significativos para os trabalhadores ao longo de vários anos..Tendo em conta as circunstâncias atuais, demonstra um importante espírito de compromisso de todas as partes envolvidas. Quanto à iniciativa do governo em tentar tal acordo, que alguns consideravam de risco, é de se lhe tirar o chapéu..A segunda aposta são as medidas de caráter orçamental que atenuam os efeitos da crise para as famílias e para as empresas..Sendo certo que, como resultado da guerra, os portugueses perderam poder de compra ao longo de 2022, o Orçamento de 2023, com aumentos de salários e prestações sociais acima da inflação esperada para o próximo ano, permitirá iniciar a recuperação desses rendimentos..A isto junta-se a redução de IRS (maiores descontos no IRS dos jovens, abatimentos para quem tem crédito à habituação e diminuição da taxa do segundo escalão que beneficiará toda a classe média), a limitação do aumento de rendas a 2% (com compensação fiscal aos senhorios) ou o congelamento do preço dos passes..Acrescem ainda as medidas destinadas às empresas, nomeadamente as que constituíram contrapartidas do acordo para aumentar os salários no setor privado, como a redução do IRC para quem subir salários, o fim do pagamento de 1% das remunerações para a Fundo de Compensação do Trabalho ou os 3000 milhões para atenuar os custos energéticos..O governo agiu com prudência, mas foi sensível aos mais afetados pela crise..A terceira aposta é a perspetiva de crescimento económico para o próximo ano, e é ganha porque o governo jogou bem nas duas primeiras. Permite não apenas afastar o cenário de uma recessão, que muitos consideravam inevitável, como evoluir para um crescimento económico modesto (1,3%), que ainda assim nos permitirá aproximar dos países mais ricos da UE. Além de manter o desemprego historicamente baixo, o que se reveste da maior importância social..Alguns argumentam que as expectativas não se realizarão, que as previsões não são realistas. É natural, é o papel da oposição. Recordemos apenas que os governos de António Costa têm demonstrado serem de boas contas, conseguindo invariavelmente cumprir ou superar as projeções..Perante o receio de uma crise profunda, que afetará alguns dos nossos principais parceiros europeus, o país poderá fazer uma aterragem suave. Não é uma tripla no Totobola, é uma tripla no Orçamento. Com tanta incerteza vinda da guerra na Ucrânia, vale mesmo a pena apostar com prudência, e por isso a tripla é a melhor escolha..Ainda é cedo para compreender o seu alcance, mas o formato alargado, com 44 países envolvidos (de fora, sem surpresa, ficam a Rússia e a Bielorrússia.) poderá permitir uma coordenação política abrangente no espaço europeu, muito importante para fazer face aos desafios que extravasam as fronteiras da UE..Eurodeputado