Tal como atrás mencionei, o paludismo constituía um grave problema de saúde pública até à sua completa erradicação no terceiro quartel do século XX. Afetava, principalmente, as populações das zonas dos arrozais das bacias dos rios Mondego, Tejo e Sado, uma vez que estavam mais expostas às picadas dos mosquitos. Nessas regiões, o paludismo (também conhecido, entre nós, por sezões) persistia, desde há muito, como doença endémica. Por outras palavras, a presença da doença era aí constante ao longo do ano.Em 1939, foi inaugurado o Instituto de Malariologia, em Águas de Moura, com o apoio da Fundação Rockefeller (Estados Unidos da América). Nesse contexto, foram construídos os postos anti-sezonáticos nas zonas de orizicultura (nomeadamente no Vale do Sado). Na altura (anos 40), registavam-se cerca de 70 mil novos casos de paludismo, por ano. Todas as crianças (índice de 100%) residentes nessas áreas tinham o baço aumentado (em consequência da doença). Panorama muito preocupante. Era urgente organizar o combate.Para esse fim, Francisco Cambournac aplicou todos os meios de luta possíveis na época, tanto para combater o mosquito, como para tratar a totalidade dos doentes.A globalidade das medidas de prevenção e controlo foram, por ele, concebidas, desenvolvidas, geridas e, mais tarde, avaliadas. A sua ideia estratégica visava acabar com a transmissão dos parasitas (plasmódios), na dupla perspetiva de reduzir o risco da picada e de tratar todos os doentes. Cambournac conhecia a situação epidemiológica que antes investigara, quer na dimensão dos vetores quer dos parasitas que provocavam a doença. Introduziu, nos canais dos arrozais, peixes que se alimentavam de larvas dos mosquitos (peixes do género Gambusia) e promovia a utilização de redes mosquiteiras. Todas as pessoas com sinais de terem adquirido o agente da doença eram tratados com quinina.Foi assim que, em 1958, o paludismo endémico foi eliminado em Portugal. Um sucesso. Os mosquitos permaneceram, mas a transmissão do paludismo terminou porque os plasmódios “portugueses” deixaram de existir.Havendo tantas pessoas que chegam ao nosso país com parasitas no sangue adquiridos, por exemplo, em África, qual o risco de o paludismo voltar?Resposta: quase zero porque as espécies de mosquitos em Portugal, antes, responsáveis pela transmissão do paludismo, apesar de continuarem a existir, não estão adaptadas aos plasmódios tropicais. Isto é, os mosquitos “portugueses” transmitiam os plasmódios que aqui circulavam, mas, agora, não têm a mesma capacidade para transmitirem os parasitas importados das zonas tropicais(Continua) Ex-diretor-geral da Saúdefranciscogeorge@icloud.com