A propósito da situação de Elaine, a jovem portuguesa de 15 anos de idade que se suicidou na Alemanha após ter sido entregue aos cuidados do pai, e sem abordar este caso em concreto, penso que se exige uma reflexão séria sobre diversos aspetos..Muitos jovens apresentam quadros depressivos que podem manifestar-se de formas muito diversas. Uma delas envolve os comportamentos auto lesivos, cuja função é aliviar a dor e o sofrimento. Ao provocarem um dano físico (por exemplo coçar, arrancar ou queimar a pele, puxar os cabelos, inserir objetos no corpo, morder-se ou cortar-se) estão, no fundo, a tentar atenuar a dor psicológica. É fundamental estarmos atentos e nunca desvalorizar os sinais de alerta, mesmo os mais subtis, escutar e mostrar disponibilidade para ajudar e pedir ajuda especializada. Os comportamentos de automutilação não são uma fase, uma mania ou uma mera tentativa de chamar a atenção. São um sinal de alerta vermelho..Muitos outros adolescentes apresentam uma ideação suicida mais persistente e intensa, podendo começar a delinear um plano, tentar o suicídio ou, mesmo, concretizá-lo. Este comportamento está habitualmente relacionado com uma forte desesperança face ao futuro, acreditando-se que não existe outra alternativa senão a morte. A morte como alívio e como fuga. Diversos fatores podem agravar o risco de suicídio, como sejam determinados traços de personalidade, baixa auto estima, perturbação mental ou disfuncionalidade familiar, entre muitos outros..Pensando em concreto nas situações de conflito parental, às quais as crianças e os jovens são expostos de forma recorrente, é fundamental que se reconheça a natureza maltratante das mesmas. Uma criança ou jovem exposto ao conflito, instrumentalizado e triangulado nas dinâmicas tóxicas destas famílias é uma criança ou jovem vítima de maus tratos. E isto tem de ser assumido com clareza, pois só dessa forma poderão ser acionadas medidas de proteção adequadas que salvaguardem, de facto, os seus interesses. Os maus tratos são também um fator de risco acrescido para a ideação e tentativa de suicídio..Isto implica também ouvir o que têm estas crianças ou jovens a dizer. Escutar o que dizem e o que calam. O que transmitem através das palavras mas, também, através dos seus comportamentos. Deixarmos de olhar para as crianças e jovens como seres em miniatura que nem sempre sabem o que dizem e, por isso, tantas vezes, são impelidos para situações limite que os colocam também a eles, no limite. Falamos de situações muito complexas que exigem um processo de avaliação rigoroso e que envolva todo o sistema familiar, num olhar que se quer sistémico e multidisciplinar.