Hoje há duas notícias no DN ligadas através de uma questão que há de marcar o debate de políticas públicas nos próximos anos. Falo da entrada em vigor das novas regras para reformas antecipadas para trabalhadores com carreiras contributivas muito longas e do perfil do professor, que revela uma classe muito envelhecida. Os números, assim a frio, são impressionantes. Num universo de pouco mais de 104 mil docentes, apenas 383 têm menos de 30 anos..Ontem escrevi aqui ao lado sobre o rendimento básico incondicional (RBI), a propósito de uma entrevista com o filósofo e economista belga Phillipe Parijs. A crónica terminava a recomendar mais reflexão sobre uma escolha que pode acabar por matar o Estado social, a atual rede de segurança sobre a qual quase todos caminhamos ao longo da vida. Se a opção passar por substituir os atuais benefícios e apoios sociais por uma prestação única, o RBI, esse será o desfecho inevitável. É isso que justifica a recente paixão da direita mais neoliberal por esta ideia que nasceu na esquerda mais radical. A economia de espaço levou-me, ontem, a passar ao lado de um dos argumentos a favor do RBI - seria uma das formas de reagir às alterações que a economia ou indústria 4.0, com o reforço da automação e a adoção da inteligência artificial em empresas e sistemas que são agora de mão-de-obra intensiva, vai impor na nossa relação com o trabalho e, mais importante, na forma como teremos de redefinir, a médio prazo, as regras com que nos organizamos em sociedade..Há um novo choque tecnológico à espera de acontecer, mais cedo que tarde, e teremos de nos preparar para mudanças profundas e para uma fase de transição com fortes dores de crescimento. O desemprego estrutural, ou seja, o excedente do lado da oferta no mercado de trabalho, tenderá a aumentar por duas vias: inadaptação de trabalhadores mais velhos às novas tecnologias numa primeira fase e, mais adiante, redução das necessidades de mão-de-obra na indústria e em serviços como centros de atendimento (call centers). O que fazer com essas pessoas? Como financiar a sobrecarga do sistema de segurança social, com menos a contribuir e mais a exigir? Os nossos dias e semanas de trabalho vão continuar a ser definidos como até aqui? Haverá ganhos de produtividade que permitam, à maioria dos trabalhadores, reduzir os tempos de trabalho mantendo o salário? Ou, e esta é a questão mais séria, estaremos dispostos, enquanto comunidade de ativos, a abdicar de parte do nosso salário a troco de mais tempo de lazer, para criar artificialmente espaço para alguns dos trabalhadores inativos? Numa outra frente, começa a ser urgente debater fontes alternativas de financiamento da Segurança Social. O atual governo tem esse objetivo inscrito no seu programa, mas o esforço tem sido tímido. Fará algum sentido manter o sistema atual, baseado na aplicação da taxa social única a cada trabalhador, quando há cada vez mais empresas de base tecnológica com lucros brutais e um quadro de pessoal reduzidíssimo?.As duas notícias de que falava podem ser vistas como indicadores avançados dessas mudanças, apesar de tratarem de problemas antigos. Dificilmente teremos, por muito mais anos, candidatos a reformas antecipadas com as regras que hoje começam a ser aplicadas. A entrada no mercado de trabalho foi sendo adiada na direta proporção do avanço da escolaridade obrigatória e o problema vai desaparecer a prazo. Agora, terão de existir menores penalizações para quem optar pela reforma antecipada. Será uma das formas de encontrar postos de trabalho para um exército de inativos que tenderá a aumentar. Pela mesma lógica, creio que fará todo o sentido e será mesmo inevitável que algumas profissões, classificadas como de desgaste rápido há uns anos, voltem a reconquistar esse estatuto. Os professores são um exemplo. O problema está identificado. O envelhecimento do corpo docente tem feito parte das críticas em relatórios da OCDE, por exemplo. A estatística dá-nos a real medida do problema: apenas 0,4% dos professores do ensino público, do 1.º ciclo ao secundário, tem menos de 30 anos. O refrescamento programado e cíclico desta carreira abriria campo a professores recém-formados. O segredo está no financiamento do sistema que terá de evoluir ao lado da revolução tecnológica..Vá votar.Agrada-lhe a Teresa, o Fernando, a Assunção, o Rui ou o Manuel? Vote. Não lhe agrada nenhum desses? Vote noutros, mas vote. Não tem confiança em nenhum? Vote em branco. Está mesmo, mas mesmo muito zangado e desiludido com tudo isto, acha que não tem sido bem representado? Está no seu direito, mas vá votar e descarregue a raiva no boletim. Faça uns desenhos, invente um partido, por exemplo, desenhe um quadrado e vote. Vai à bola? Vote antes. Tem planos com os miúdos, leve-os a votar de caminho. É um exercício de pedagogia e cidadania. A sério, vá votar.