É difícil encontrar um caso isolado em que incompetência do governo Bolsonaro se manifeste completamente em todos os seus ângulos. Mas o do óleo derramado no Nordeste, dos últimos dias, talvez consiga..Aos factos: há dois meses, manchas de óleo invadiram as praias da região, um dos principais destinos turísticos do Brasil. A extensão da tragédia ultrapassa 2100 km do litoral brasileiro - a costa continental portuguesa é de 943 km - e atingiu 233 localidades de 77 municípios de nove estados. Falamos de mais de 900 toneladas de óleo..Nos tais dois meses desde o início da tragédia ambiental, turística e económica, o governo não fez nada de útil para a combater. Perdeu apenas tempo a enquadrá-la, como enquadra tudo, dentro da sua limitada e bizarra maneira de ver o mundo..Primeiro, Jair Bolsonaro fez-se fotografar, tal e qual um presidente norte-americano a meio de uma guerra, rodeado de militares medalhados numa reunião. Mas do encontro pomposo não resultou nada além de uma suspeição: o derramamento parece - talvez seja, supõe-se que seja, pode ser que seja - resultado da ação de um navio venezuelano..Ora, como Bolsonaro, qual Pavlov, sabe que basta mencionar o país de Maduro para as redes sociais comandadas pelos seus filhos e difundidas pelos seus robôs começarem a salivar, tentou tornar o que, ao que tudo indica, é o acidente de um barco isolado num ataque planeado ao país..Mais tarde, não contente em lançar a primeira suspeição, lançou uma segunda, porque é da saliva dos pit bulls de internet que se alimenta o seu governo: o objetivo do derramamento, verbalizou Bolsonaro sem se rir, poderia - eventualmente, supostamente, alegadamente, provavelmente, hipoteticamente - ser uma tentativa de sabotar um megaleilão de petróleo marcado para novembro no país..Mais bolsonarista do que Bolsonaro, o ministro do Ambiente, Ricardo Salles, aquele que foi condenado por crime ambiental antes de ser convidado a integrar essa pasta no governo e que ficou tristemente célebre mundo afora no caso das queimadas da Amazónia, também é um campeão das "meias-verdades" - para usar um eufemismo..Depois de andar de helicóptero a sobrevoar as praias para a fotografia, publicou um vídeo de um porta-voz da Greenpeace a explicar porque a ONG não estava a ajudar na remoção do óleo. E comentou: "Ah, tá", como quem diz, "pois, pois"..Sucede que o vídeo era editado, um método juvenil muito comum entre bolsonaristas para moldar a realidade à tal visão limitada e bizarra..Salles, como de costume, acabou a levar uns valentes puxões de orelhas da Greenpeace, de parlamentares e de governadores dos estados afetados..Por fim, a imprensa descobriu que o governo, na sua saga desvairada para reduzir o tamanho do Estado, extinguiu por decreto presidencial em abril dois comités do Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água criados pelo governo de Dilma Rousseff..A um comité, executivo, competia a elaboração de simulações e treinos de pessoal, além de manter recursos para a resposta à emergência. A outro, de suporte, indicar recursos humanos e materiais para ações de resposta a incidentes com óleo..O óleo nas praias nordestinas é, portanto, um caso paradigmático da incompetência do governo Bolsonaro porque inclui o passo número um - as fotografias pomposas para disfarçar o vazio -, o passo número dois - apontar o dedo a inimigos imaginários -, o passo número três - propagar boatos para sustentar o passo número dois - e o passo número quatro - dizimar qualquer órgão de Estado com a mais leve relação com conhecimento, ciência ou dados porque conhecimento, ciência e dados são um perigo para a narrativa deste governo..Como para o mais limitado e bizarro governo de que há memória, tudo é culpa de Marx, nada como lhe dedicar, novamente, uma frase... do Groucho. "A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todos os lados, diagnosticá-los incorretamente e aplicar as piores soluções."