Porque é que o conflito entre sunitas e xiitas é central na Síria?
A rivalidade entre sunitas e xiitas é um elemento fundamental no conflito na Síria. E tem-se manifestado também numa luta pela hegemonia na região entre dois Estados-chave: Arábia Saudita e Irão.
A disputa por influência no Médio Oriente entre sunitas e xiitas está no centro do conflito na Síria, bem como em países como o Iraque, Bahrein e Iémen. Não se trata apenas de divergências religiosas, mas a fratura religiosa entre sunismo e xiismo politizou a religião e exacerbou o sectarismo. As duas facetas são incompatíveis à luz do islão. As potências regionais que representam cada uma destas correntes confessionais são o Irão e a Arábia Saudita.
O Irão tem sido considerado um país desestabilizador da região desde a revolução islâmica em 1979, que transformou o Irão numa teocracia xiita. Diferentemente, a Arábia Saudita, com o seu regime sunita wahhabista, ortodoxo e ultraconservador, tem beneficiado de apoios do Ocidente. A relação entre ambos tem sido sempre tensa e a possibilidade de conflito direto, ou através de "guerras por procuração", tem estado sempre presente. Após o 11 de Setembro, as intervenções por parte dos EUA e seus aliados, particularmente no Iraque, foram desestabilizadoras para a região. Desde então, tanto um como outro têm procurado aumentar a sua influência na região. O Iraque, maioritariamente xiita mas anteriormente dirigido por um sunita, Saddam Hussein, mantém boas relações com o Irão desde 2005. O Irão tem acusado a Arábia Saudita de apoiar a criação da Al-Qaeda e do Daesh, que, sendo ambos sunitas e ferozmente antixiita, são uma ameaça para o Irão. As Primaveras Árabes foram também fonte de tensão. O Irão considerou que se tratava de uma oportunidade para aumentar a influência xiita e a Arábia Saudita considerou-as uma ameaça ao seu regime.
A revolta contra Bashar al-Assad na Síria e o crescimento do Daesh ajudaram a que esta região se tornasse um dos principais palcos das rivalidades entre os dois países. O Irão é um aliado de longa data do regime sírio, tal como a Rússia. Para a Arábia Saudita, sendo a Síria um país de população maioritariamente sunita, deveria ter um governo sunita. Assim, sendo Assad um xiita da seita alauita, deve partir. Existe também uma forte concorrência entre dois oleodutos para a Europa, que se cruzariam precisamente na Síria, partindo do Qatar e do Irão, e que passariam por países sunitas e xiitas, respetivamente. Por isso, ignorar o conflito entre sunitas e xiitas nunca contribuirá para a paz na região.
Professor universitário